Mónica Ferro é diretora do Escritório do Fundo de População das Nações Unidas em Londres e apresentou hoje o relatório sobre a “Situação da População Mundial em 2024” com indicadores que apontam para melhores condições de vida das mulheres e das crianças.
Em declarações à Lusa, sublinhou os avanços na saúde sexual e reprodutiva nos últimos 30 anos, desde a implementação do programa de ação do Cairo, resultado da Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento das Nações Unidas (CIPD), realizada no Egito em 1994.
Nas últimas três décadas, baixou a mortalidade materna e os casamentos infantis, assim como diminuíram os casos de novas infeções por VIH e aumentou o acesso à contraceção.
No entanto, “alguns dos números globais mascaram situações específicas de comunidades que têm sido deixadas para trás”, alertou Mónica Ferro, sublinhando que o progresso não tem sido igual para todos.
A organização acredita que o agravamento das desigualdades acontece “graças a discriminações sistémicas”, como o “racismo, o idadismo, a discriminação contra comunidades étnicas minoritárias e a própria discriminação com base no género”.
Os números nacionais, disse, “não contam a história toda” e este não é um problema exclusivo das regiões mais pobres.
“Há, nos países, grandes bolsas em que o progresso tem estado ausente ou estagnado. Não há nenhum país do mundo que possa dizer que completou toda esta agenda do Cairo”, alertou.
Mónica Ferro defende que é preciso conhecer bem as diferentes comunidades para desenhar políticas eficientes, dando como exemplo o levantamento feito junto das mulheres negras que vivem nos Estados Unidos da América e no Reino Unido.
“Destacamos a mortalidade materna na comunidade negra no Reino Unido e Estados Unidos, não como forma de condenar, mas louvando o facto de estarem a fornecer dados sobre essas comunidades. Com esses dados conseguimos desenhar melhores programas e chegar a essas pessoas”, explicou.
O relatório alerta para a necessidade de os projetos serem segmentados para as comunidades, porque “não há programas que possam tocar todas as pessoas de uma forma empoderadora e inclusiva”.
Neste cenário, Portugal não é exceção: Os estudos mostram que as pessoas que pertencem a comunidades e grupos em situação de vulnerabilidade são as que são deixadas mais para trás.
“Essa é uma narrativa que se aplica, infelizmente, a todos os países, desenvolvidos e em desenvolvimento. Esta não é uma agenda para os países em desenvolvimento, embora saibamos que onde há escassez de recursos e falta de regimes democráticos, esta agenda é cada vez mais premente”.
O relatório salienta ainda que “a felicidade não pode depender do sexo com que se nasce ou do país onde se nasce”.
Também presente no encontro, o secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, Nuno Sampaio, defendeu a necessidade de uma integração dos migrantes “para que não se criem periferias onde as desigualdades e discriminações persistem”.
O secretário de Estado sublinhou que existem “muitos desafios” que vão para além do trabalho pela igualdade de género e direitos das mulheres: “Há uma dimensão dos direitos demográficos que se prende com o que pode ser feito nos países em vias de desenvolvimento”.
Lembrando que o aumento da população africana e a sua “vitalidade demográfica” é acompanhado pelo “envelhecimento nas sociedades mais abundantes, como é o caso da Europa e de Portugal”, o governante defendeu ser preciso uma “diplomacia para a demografia e uma diplomacia para as migrações”.
Nuno Sampaio salientou também “os direitos das mulheres, a não-discriminação e tudo aquilo que há para fazer em matéria de desenvolvimento social integrado e em particular da igualdade de género, que deve ser transversal a todas as politicas”.
Já a presidente da Associação P&D Fator, Graça Campinos Poças, salientou as melhorias registadas nos últimos anos, sem esquecer os retrocessos em várias matérias como a violência doméstica, incluindo sobre crianças, adolescentes e idosos, e sublinhando a necessidade de apoiar projetos.
Segundo o relatório hoje divulgado, investir mais 79 mil milhões de euros em planeamento familiar e saúde materna poderia salvar um milhão de mulheres entre 2022 e 2050.
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