Em declarações à Lusa, Rui Guimarães alertou que “mais importante” do que aumentar o vencimento dos médicos é “reorganizar o SNS” e “criar um novo normal” porque a nova geração de clínicos “não está disposta” a trabalhar 15 ou 16 meses por ano.
Para o responsável pelo Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia e Espinho, no distrito do Porto, “não faz sentido” que os doentes “fiquem reféns” do impasse que o SNS atravessa e a solução passa por uma reorganização de serviços e oferta.
“Esta ideia romântica que aumentando os salários as pessoas deixam o [serviço] privado ou regressam do estrangeiro e voltam para o SNS talvez seja difícil [de concretizar], sozinha não chega”, avisou Rui Guimarães.
Isto porque, explicou, os problemas que o SNS enfrenta não passam apenas por questões salariais: “É muito importante percebermos uma coisa, há médicos que, independentemente do resultado das negociações, já tomaram a decisão de não quererem uma vida em que trabalham 15 ou 16 meses num ano”.
Até porque “quem saiu do país não o fez por 100 ou 200 euros mas por duas, três vezes mais remuneração e é difícil [o SNS] igualar esses valores e o serviço privado não vai fechar e também precisa de médicos e vai haver sempre essa concorrência”.
“Não vale a pena pensar que vamos resolver isto à mesa e que as pessoas vão todas ter aumentos, que provavelmente não são possíveis atribuir aos médicos sem criar guerras com outros profissionais, é provável que no final disto tudo tenhamos que olhar para a organização do SNS de outra forma”, observou.
Para o também médico, “é necessária uma reorganização de serviços e de oferta” porque “não faz sentido que os doentes sejam reféns deste problema e que vão de ambulância para um hospital e depois já não é naquele hospital que há condições para os tratar e têm que ir para outro”.
“A proximidade é uma coisa que as pessoas valorizam muito, mas se formos honestos e percebermos que não há recursos suficientes, para não enganar as pessoas e trabalhar com equipas abaixo dos mínimos, faz mesmo sentido concentrar recursos, reforçar pontos de redes para estarmos preparados para os dias de sol e para os dias em que tudo acontece, o sistema tem que ter esta elasticidade”, considerou.
Por isso, reforçou, “é muito importante que o SNS se consiga reorganizar e que se crie um novo normal, não é uma questão salarial apenas, é uma questão de não querer voltar a sacrificar a vida ao ponto que se sacrifica antes”.
Para Rui Guimarães manter o nível de “segurança e de resultados” que o SNS atingiu deve ser uma prioridade.
“É o desafio, procurar encontrar formas de trabalho e de organização que mantenham a satisfação das pessoas e, muito mais importante, mantenham a segurança. Todos nos orgulhamos muito do SNS que construímos, dos resultados que temos, que têm que se manter, mas, em consciência, temos que perceber que somos um país com recursos limitados e que temos que fazer um novo caminho”, disse.
Há 18 meses que sindicatos médicos e Ministério da Saúde estão em negociações sem conseguirem chegar a acordo sobre questões salariais.
A última ronda negocial decorreu no passado sábado e também sem acordo estando marcado novo encontro para quarta-feira.
Os constrangimentos que se verificam no hospital de Gaia e Espinho também se verificam em outras 30 unidades hospitalares do país desde que mais de 2.500 médicos decidiram não ultrapassar as 150 horas extras a que estão obrigados por lei.
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