Este é o caso da Tosse Convulsa (Bordetella pertussis, nome científico), que em Portugal tem uma vacina disponível desde que existe Programa Nacional de Vacinação, apesar da sua fórmula já ter sido alterada.

O esquema de administração desta vacina é diferente em vários países do mundo. Porém, por cá, o Programa Nacional de Vacinação (PNV) contempla a administração de 5 doses da vacina aos dois, quatro, seis e 18 meses e um reforço aos 5 anos de uma criança. Além disso, o Programa considera fundamental, desde 2017, vacinar as grávidas entre as 20 e 36 semanas de gestação, para que os bebés tenham imunidade antes de serem vacinados pela primeira vez.

Os restantes grupos etários não levam normalmente a vacina porque a mortalidade desta doença é mais comum em crianças e bebés pequenos.

Depois do aumento de casos desta doença registados desde o início do ano, o SAPO24 questionou a direção Sociedade de Infeciologia Pediátrica (SIP) sobre a necessidade de considerar mais grupos no Programa Nacional de Vacinação.

"Uma coisa é certa, nós na Europa e no mundo sabemos que estes surtos de Tosse Convulsa não se conseguem apenas controlar com um Programa Nacional de Vacinação, ou seja, cada país tem estratégias diferentes. Muitas vezes não está apenas contemplada no Programa Nacional de Vacinação e há estratégias, como vacinar famílias inteiras que esperam um bebé. Existem países como Portugal que vacinam a grávida, porque assim fica com a proteção antes dos dois meses de vida. Existem também países onde se faz a vacinação dos idosos ou de adolescentes", explica a Maria João Brito, médica que faz parte da SIP.

"Há estratégias únicas e combinadas, mas não existe uma completamente eficaz, e mesmo as pessoas vacinadas podem ter a doença", sublinha.

Mais ainda, acrescenta que a grande vantagem desta inoculação "é ser uma vacina que protege contra as formas graves" da doença. "Ou seja, enquanto que no passado tínhamos grupos onde a mortalidade era muito elevada, nomeadamente em crianças mais pequenas, isso hoje está bastante reduzido com a vacinação da grávida. Hoje protegemos o bebé até aos dois meses com anticorpos da mãe e depois começa a vacinação do bebé", diz a especialista.

Lembra ainda que "o objetivo da vacinação não é acabar com a Tosse Convulsa, pois não temos vacinas que nos permitam isso, mas temos estratégias que podem diminuir a mortalidade, nomeadamente em crianças mais pequenas". Isto explica porque é que continua a existir Tosse Convulsa, apesar da alta taxa de vacinação, que abrange 95,9% dos bebés portugueses, segundo o INE.

Mas afinal porque aumentam os casos? Sobre esta questão a especialista sublinha os avanços que se têm vindo a fazer em termos de diagnóstico, o que faz com que este aumento não seja sempre bem contabilizado. "Há uns anos o diagnóstico não era feito com tanta facilidade. Hoje usamos métodos de biologia molecular e estamos a diagnosticar mais. Além disso, notificamos mais. A Tosse Convulsa é uma doença de notificação obrigatória e os médicos normalmente notificam, através do SINAVE (Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica), e cai imediatamente nos colegas de Saúde Pública, que sabem que existem casos num determinado lugar", garante Maria João Brito.

"Os profissionais podem depois ir a escolas e tomar as devidas medidas de saúde pública para não propagar a doença. Para se ter ideia, muitas vezes entre a notificação do caso e o início dos trabalhos do profissional de Saúde Pública chega a passar apenas uma hora", acrescenta. Desta forma, esta é uma doença que implica não só uma estratégia de vacinação, mas uma estratégia de saúde pública.

A responsável não exclui novas abordagens, e reconhece que o surgimento de novos casos de Tosse Convulsa não são um problema português, que no futuro pode vir a exigir outra vacina com mais eficácia.

Uma vacina para a Gastroenterite?

E se existisse um medicamento mágico que impedisse as crianças de ter Gastroenterite? Não existe, e em Portugal as taxas de mortalidade da doença não justificam a vacina ser gratuita para toda a população.

Uma inflamação que se estende pelo tubo digestivo, afetando em simultâneo o estômago, o intestino delgado e o cólon. Pode ser provocada por vírus, bactérias ou parasitas e causa dores abdominais, náuseas, vómitos e diarreia. Chama-se intoxicação alimentar quando se sabe que a contaminação aconteceu através da alimentação, mas o que está em causa é sempre uma gastroenterite.

Em Portugal está disponível uma vacina para um tipo de Gastroenterite, aquela que é provocada especificamente pelo rotavírus. Esta é uma vacina paga e apenas disponibilizada de forma gratuita para grupos de risco, nomeadamente: crianças com doença cardiovascular grave, doença hereditária do metabolismo, doença hepática, doença renal e doença neurológica, assim como com baixo peso à nascença, hiperplasia suprarrenal congénita, fibrose quística e insuficiência respiratória crónica do lactente.

Para todos os outros casos, os pais terão de optar por pagar pela vacina caso queiram vacinar os seus filhos contra o rotavírus.

Neste caso, a especialista sublinha que "a vacina do rotavírus serve apenas para prevenir as Gastroenterites provocadas por este vírus". "As Gastroenterites são doenças do foro gastrointestinal que podem ter várias origens. Uma delas pode ser infeciosa e, dentro destas infeciosas, nem todas são por vírus, e dentro das que são virais nem todas são por rotavírus", diz ainda.

Acrescenta também que todas as crianças contraem a primeira infeção por rotavírus até aos dois anos de idade, dado que é um vírus muito prevalente, mas ao contrário do que acontece em países de África ou da América do Sul, este vírus em Portugal não tem taxas de mortalidade elevadas.

A vacina serve então para diminuir os sintomas provocados por este vírus, "mas não protege as crianças das Gastroenterites", garante a responsável da SIP. Ou seja, neste caso não faz sentido esta vacina estar no Programa Nacional de Vacinação, tendo em conta que dele fazem parte as vacinas que diminuem a mortalidade, o que não acontece aqui.

"Os país podem optar por dar a vacina porque ajuda nos sintomas que a criança possa ter caso apanhe a doença com este vírus. Mas deve dar-se prioridade a doenças que causam mortalidade", garante Maria João Brito.

E no caso do Sarampo. Qual a razão para o aumento de casos?

Outra doença com um grande aumento de casos nos últimos meses é o Sarampo, que em Portugal tem uma vacina recomendada em duas doses para menores de 18 anos (a serem administradas quando a criança completa 1 e 5 anos) e para profissionais de saúde (independentemente do ano de nascimento).

Para os adultos nascidos em ou depois de 1970 é aconselhada uma dose. Os nascidos antes de 1970 têm proteção natural contra o Sarampo.

Uma das situações relatadas no último relatório da DGS foi o facto de alguns doentes terem apanhado a doença mesmo já tendo sido inoculados duas vezes. Aqui, Maria João explica que a única vacina com 100% de eficácia disponível no Programa Nacional de Vacinação é a vacina do Tétano e Difteria: "Todas as outras não têm essa eficácia e vão perdendo ao longo do tempo". No caso do Sarampo, a eficácia ultrapassa os 90%.

"Esta vacina é uma vacina viva, e o que nós fazemos é uma inoculação através de um vírus que está vivo e atenuado, e assim aumenta a nossa resposta imunológica", explica. "O que esta vacina faz é proteger a forma grave da doença, tal como acontecia com as vacinas para a Covid-19", estas bem conhecidas na atualidade.

O Sarampo é uma doença altamente contagiosa e transmite-se pelo ar. Quando apanhado é algo muito grave, com elevadas taxas de mortalidade, e a falta de informação acaba por afastar as pessoas da vacinação e aumentar o número de casos graves, diz a especialista.

"Notícias como pessoas que tinham duas doses da vacina e apanharam Sarampo desacreditam a vacina. As pessoas com vacina apanharam uma doença não grave", aponta.

Garante também que "em Portugal temos uma situação grave em relação ao Sarampo, mas não se compara com a Europa, onde é muito mais grave. Temos felizmente uma taxa de vacinação muito alta, superior a 95% (97,5 %, segundo o INE), e por isso é necessária a vacina para não existir mortalidade", destaca a responsável da Sociedade de Infeciologia Pediátrica.

Na sua forma mais grave, o Sarampo pode causar pneumonia e pode mesmo levar à morte. "A nossa taxa de vacinação elevada está a servir-nos de tampão para o contágio grave da doença que está a acontecer em outros países", garante a especialista.