Fonte judicial confirmou hoje à agência Lusa que a primeira sessão do julgamento, que resulta da queixa do general João Maria de Sousa, à data dos factos procurador-geral da República de Angola, terá lugar na secção de Crimes Comuns do Tribunal Provincial de Luanda, a 5 de março, pelas 09:00.
Na origem deste processo está uma notícia de novembro de 2016, colocada no portal de investigação jornalística Maka Angola, do jornalista Rafael Marques, com o título "Procurador-Geral da República envolvido em corrupção", que denunciava o negócio alegadamente ilícito, realizado por João Maria de Sousa — que cessou funções de procurador-geral da República no final de 2017 —, envolvendo um terreno de três hectares em Porto Amboim, província do Cuanza Sul, para construção de condomínio residencial.
"Ao longo do exercício da função de Procurador-Geral da República, o general João Maria Moreira de Sousa tem demonstrado desrespeito pela constituição, envolvendo-se numa série de negócios", referia a notícia de Rafael Marques, acrescentando que esse "comportamento" tem contado "com o apadrinhamento do Presidente da República, José Eduardo dos Santos, que lhe apara o jogo".
"Aqui aplica o princípio informal e cardeal da corrupção institucional em Angola, segundo a qual uma mão lava outra", escreve a acusação do Ministério Público (MP), citando a notícia da autoria de Rafael Marques.
A notícia deu origem a uma participação criminal contra o jornalista angolano e, refere a acusação do MP, no decurso das diligências realizadas foi possível apurar junto do departamento do Instituto Geográfico e Cadastral de Angola (IGCA) no Cuanza Sul que o ofendido, o Procurador-Geral da República, "efetivamente requereu e lhe foi deferido o título de concessão do direito de superfície" do terreno em causa a 25 de maio de 2011.
Contudo, "passado um ano, por falta de pagamento dos emolumentos, o contrato atrás referido deixou de ter validade, tendo deste modo o ofendido João Maria Moreira de Sousa perdido o título de concessão do direito de superfície a favor do Estado", diz a acusação.
A notícia em causa aludia a uma eventual violação do "princípio da dedicação exclusiva" estabelecido pela Constituição angolana e que impediria que os magistrados judiciais e do MP exerçam outras funções públicas ou privadas, exceto as de docência e de investigação científica de natureza jurídica.
"Como se vê na acusação, não conseguem desmentir que ele não comprou o tal terreno. O que dizem depois é que não pagou os emolumentos e, portanto, o terreno já não é dele. A notícia continua a ser válida", reagiu, à Lusa, em 2017, o jornalista Rafael Marques.
A acusação, que visa ainda o diretor do jornal angolano "O Crime", Mariano Lourenço, que republicou a notícia em causa, refere a "violação" de princípios da "ética e da deontologia profissional", que se traduzem em "responsabilidade civil, disciplinar e/ou criminal".
"Levaram estes meses todos para apresentar este argumento, mas isso não altera absolutamente nada. O problema não é se ele continuava com o terreno ou não, o problema é que adquiriu o terreno de forma ilegal", disse, anteriormente o jornalista Rafael Marques.
São ambos os jornalistas visados por um crime de Injúrias contra a autoridade pública, ao abrigo do Código Penal, e outro de Ultraje ao órgão de soberania, pelas observações na mesma notícia ao Presidente da República, este previsto na Lei dos crimes contra a Segurança do Estado.
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