No âmbito de um debate sobre a criação da Lei de Bases da Habitação, que decorreu em Lisboa, a presidente da associação Habita, Rita Silva, questionou “até que ponto a Lei de Bases vai tornar efetivo o direito à habitação”, indicando que há 40 anos que este direito está consagrado no artigo 65.º da Constituição da República Portuguesa, mas “o Estado nunca se sente vinculado”.

Na perspetiva de Rita Silva, o Estado tem a obrigação de assegurar o acesso à habitação a todos os cidadãos, pelo que deve ser implementado um mecanismo, à semelhança do que já existe em França, que “quando uma família não consegue ter acesso a uma habitação, ao fim de cerca de seis meses, pode reclamar uma indemnização ao Estado”.

Reagindo à proposta de indemnização dos cidadãos, a deputada independente eleita pelo PS Helena Roseta, responsável pelo projeto socialista para a criação da Lei de Bases da Habitação, defendeu que deve ser explorado o papel da Segurança Social no apoio ao acesso à habitação, através de “uma prestação para as pessoas que ficam sem casa”.

Neste sentido, Helena Roseta disse que é preciso “mexer” nas bases gerais do sistema de Segurança Social, no sentido de cooperar com a política da habitação.

Para a deputada do PCP Paula Santos, o Estado deve ter “um papel mais interventivo” na oferta de casas, já que, nos últimos anos, houve “uma ausência enorme de intervenção direta do Estado” nas políticas de habitação, deixando essa responsabilidade para a intervenção dos privados.

“É fundamental que a Lei de Bases, em toda a sua dimensão, trate a habitação como algo que cumpre uma função social, que dá resposta a uma necessidade que é básica, deixando de ser vista como uma mercadoria que gere mais-valias”, declarou a deputada comunista, apresentando os princípios orientadores do projeto do PCP nesta temática.

A política de solos para o combate à especulação imobiliária, a mobilização do património público e de imóveis privados devolutos para dar resposta às necessidades habitacionais e a proteção especial dos inquilinos em situação de despejo foram algumas das propostas destacadas pela deputada Paula Santos, reforçando que o objetivo da iniciativa legislativa do PCP é “dar corpo e desenvolver o artigo 65.º da Constituição, que determina o direito à habitação”.

Considerando que a Assembleia da República “andou a correr atrás do prejuízo” em matéria de habitação, o deputado do BE Pedro Soares disse que, apesar das alterações legislativas aprovadas, nomeadamente na renda apoiada, nas lojas históricas, no alojamento local, na proteção aos despejos, no direito de preferência dos inquilinos na transmissão das habitações, no assédio imobiliário e no Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU), “o essencial da crise da habitação se mantém”.

De acordo com o bloquista, a chave para resolver a crise habitacional está na oferta de habitação pública, lembrando que, atualmente, “apenas 2% do parque habitacional em Portugal é público”.

“É muito importante alterar o paradigma da predominância do privado para uma oferta pública de habitação”, frisou Pedro Soares, referindo que deve ser criado um Serviço Nacional de Habitação, “em que as pessoas se podem dirigir para se queixarem, tal como acontece na Saúde”.

O debate sobre a Lei de Bases da Habitação foi organizado pela GlocalDecide, associação de âmbito ibérico, com sede em São Pedro do Sul, distrito de Viseu, e delegações em Lisboa e na cidade espanhola de Barcelona, que tem como missão promover processos inovadores de democracia, reforçar a cidadania ativa e contribuir para o desenvolvimento comunitário integrado e sustentável.