Ativistas das associações que integram o Movimento pela Verdade Eleitoral (Mover) apontaram várias irregularidades no processo de preparação das eleições gerais angolanas e na votação e exortaram os deputados a não tomar posse, para não serem declarados “traidores da vontade coletiva”.
Num manifesto hoje apresentado em Luanda instam a Comissão Nacional Eleitoral (CNE) e o Tribunal Constitucional (TC), nas vestes de Tribunal Eleitoral, “para que aceitem a vontade coletiva de recontagem dos votos e comparação das atas sínteses em posse de todas as entidades públicas e partidárias” e pedem ao plenário do TC que não valide os resultados eleitorais sem antes atender a este pedido.
Se assim procederam, aceitam “assumir todos os riscos possíveis que advierem dessa inconsequente decisão”, refere o documento, que acrescenta que os deputados resultantes dessas eleições não deve aceitem tomar posse “sob pena de terem de ser declarados traidores da vontade coletiva”, arcando com todas as consequências que “hão de advir dessa traição à Pátria”, tal como o TC e os comissários da CNE.
O manifesto pede ainda que se indique o embaixador dos Estados Unidos da América para ”velar pela veracidade dos resultados eleitorais” e diz que será convocada uma onda de manifestações, caso estas pretensões não sejam atendidas em 72 horas, apelando às forças de segurança que se façam presentes apenas para assegurar o trajeto.
Em declarações aos jornalistas, Joaquim Manuel diz que se trata de uma posição enérgica.
“Não podemos admitir que MPLA [partido do poder] continue a governar o país da forma que bem entende”, sustentou.
Quanto aos deputados, sublinhou que se os resultados são fraudulentos, a sua tomada de posse significa legitimar fraude.
“Caso a CNE insista em apresentar esses resultados, há pessoas que nos transmitiram que não vão tomar posse”, disse o ativista.
Branco Ngola, outro dos ativistas presentes, sublinhou que estas pessoas “são favoráveis à resistência”.
“Estamos cansados de vários pleitos eleitorais, temos de tomar posições, mas que não são extremas. As nossas manifestações são pacíficas, não somos um grupo de radicais e vamos lutar dentro dos marcos legais”, disse, salientando que o movimento “não defende partidos”, e acrescentando que o que se espera é que o vencedor “ganhe com mérito”.
Joaquim Manuel reforçou que esta é uma situação que exige da elite política “máxima maturidade” e ética política.
“Não podemos reivindicar resultados eleitorais quando posteriormente depois se disponibilizam a tomar posse no parlamento e defraudar o povo”, considerou.
Questionados sobre se as manifestações não poderão representar um risco face ao estado de prontidão combativa elevada das forças armadas angolanas, Joaquim Manuel defendeu que “a manifestação não representa ameaça”, já que o povo só quer que a expressão do voto depositado nas urnas seja válido”.
“A instabilidade e insegurança públicas estão a ser protagonizadas de forma institucional, são as instituições públicas que estão a ser instrumentalizadas por quem está no poder para perigar a segurança pública. Nós não nos fazemos acompanhar de nenhum objeto bélico que faça perigar a segurança”, realçou.
Branco Ngola complementou que “há várias formas de manifestações” e que os ativistas desenvolvem todos os meios para manifestar o desagrado.
“O movimento de luta deve ser de forma pacífica, nós vamos usar todos os mecanismos para repor a legalidade, mas são meios pacíficos, nós só lutamos pela verdade eleitoral não achamos que vamos causar algum perigo. (Por isso,) não entendemos porque é que as forças de segurança vão ficar nas ruas, do nosso lado não há intenção de fazer perigar a República”, frisou.
Já Pembele Pacavira, também ativista social, questionou o porquê de as forças de segurança estarem nas ruas já que o país não está em estado de emergência: “Penso que é apenas uma forma de o Governo intimidar todos os que queiram manifestar o seu descontentamento”, adiantou.
O manifesto, subscrito por 43 associações cívicas e outros grupos da sociedade civil, aponta irregularidades no processo de preparação das eleições, entre as quais presença de mortos no ficheiro de eleitores, tratamento desigual dos partidos pela imprensa pública e corrupção eleitoral levada a cabo por partidos que ofereceram bens diversos para influenciar os eleitores.
Refere ainda que as eleições “não foram transparentes, nem tão pouco justas”, apontando aspetos como a não afixação das listas e eleitores, não publicação das atas síntese em muitas assembleias de voto (por exemplo, no consulado de Lisboa) e por parte da CNE e uso abusivo de força com detenções ilegais e torturas a vários cidadãos em várias províncias, situações que continuam a registar-se.
Segundo a ata de apuramento final das eleições gerais de 24 de agosto,o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) e o seu candidato, João Lourenço, foram vencedores com 51,17% dos votos, seguido da União Total para a Independência de Angola (UNITA), com 43,95%.
Com estes resultados, o MPLA elegeu 124 deputados e a UNITA 90 deputados, quase o dobro das eleições de 2017.
O Partido de Renovação Social (PRS) conquistou dois assentos no parlamento ao somar 1,14% de votos dos eleitores, o mesmo número de deputados que conquistaram a Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA) e o Partido Humanista de Angola (PHA) com 1,06% e 1,02 de votos respetivamente.
A coligação CASA-CE, a APN e o P-Njango não obtiveram assentos na Assembleia Nacional, que na legislatura 2022-2027 vai contar com 220 deputados.
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