Em julho, o Papa Francisco anunciou a criação de 21 novos cardeais, incluindo o agora nomeado bispo de Setúbal, D. Américo Aguiar, no consistório marcado para 30 de setembro.

Nunca na nunca na história do país existiram tantos cardeais portugueses — nem tantos em idade de serem eleitores, confirma ao SAPO24, D. Manuel Clemente, Cardeal Patriarca Emérito de Lisboa.

O futuro “cardeal Américo” conta que sentiu inicialmente algum medo com esta nova missão atribuída pelo Papa, uma vez que se sentia apenas um “danoninho”. Como é que um “jovem de Leça do Balio” se tornou tão próximo de Francisco?

O que é um consistório?

Um consistório é um encontro entre o Papa e os cardeais, que se reúnem por ordem do pontífice e sob a sua presidência.

Os consistórios podem ser ordinários — são convocados todos os cardeais, pelo menos os que se encontrem em Roma, para falar sobre assuntos importantes ou para a realização de atos solenes — ou extraordinários — são convocados todos os cardeais para se pronunciarem sobre temas importantes.

O consistório ordinário — como este que agora se realiza — é o único que tem carácter público, por incluir atos solenes. Por isso, podem ser convidadas outras pessoas.

De recordar que um consistório não é a mesma coisa que um concílio (junta os bispos do mundo inteiro) ou que um sínodo dos bispos (reúnem-se os representantes dos episcopados).

Quantos cardeais existem e quantos são portugueses?

Segundo a agência Ecclesia, o Colégio Cardinalício tem neste momento 221 membros (119 eleitores, 102 com mais de 80 anos).

Neste número estão incluídos cinco portugueses, dois deles com mais de 80 anos (ou seja, não podem eleger o próximo Papa):

  • D. Manuel Clemente, Cardeal Patriarca Emérito de Lisboa
  • D. António Marto, Bispo Emérito de Leiria-Fátima
  • D. José Tolentino Mendonça, arquivista e bibliotecário da Santa Sé
  • D. Manuel Monteiro de Castro, penitenciário-mor emérito (não eleitor)
  • D. José Saraiva Martins, prefeito emérito da Congregação para as Causas dos Santos (não eleitor)

Quem são os futuros cardeais? 

Os futuros cardeais têm várias nacionalidades e, da lista de 21 nomes, três têm mais de 80 anos:

  • Robert Francis Prevost (EUA), Prefeito do Dicastério para os Bispos
  • Claudio Gugerotti (Itália), Prefeito do Dicastério para as Igrejas Orientais
  • Víctor Manuel Fernández (Argentina), Prefeito do Dicastério para a Doutrina da Fé
  • Emil Paul Tscherrig (Suíça), Núncio Apostólico
  • Christophe Louis Yves Georges Pierre (França), Núncio Apostólico
  • Pierbattista Pizzaballa (Itália), Patriarca Latino de Jerusalém
  • Stephen Brislin, Arcebispo da Cidade do Cabo (África do Sul)
  • Ángel Sixto Rossi, Arcebispo de Córdoba (Argentina)
  • Luis José Rueda Aparicio, Arcebispo de Bogotá (Colômbia)
  • Grzegorz Ryś, Arcebispo de Lodz (Polónia)
  • Stephen Ameyu Martin Mulla, Arcebispo de Juba (Sudão do Sul)
  • José Cobo Cano, Arcebispo de Madrid (Espanha)
  • Protase Rugambwa, Arcebispo coadjutor de Tabora (Tanzânia)
  • Sebastian Francis, Bispo de Penang (Malásia)
  • Stephen Chow Sau-Yan, Bispo di Hong Kong (China)
  • François-Xavier Bustillo, Bispo de Ajaccio (França)
  • Américo Manuel Alves Aguiar, nomeado Bispo de Setúbal (Portugal)
  • Ángel Fernández Artime (Espanha), reitor-mor dos Salesianos
  • Agostino Marchetto (Itália), Núncio Apostólico (não eleitor)
  • Diego Rafael Padrón Sánchez (Venezuela), Arcebispo emérito de Cumaná (não eleitor)
  • Luis Pascual Dri (Argentina), padre confessor no Santuário de Nossa Senhora de Pompeia, Buenos Aires (não eleitor e não recebe o anel e o barrete cardinalícios no Vaticano devido à sua idade, 96 anos)

Então Portugal passa a ter mais um cardeal? 

Sim. D. Américo Aguiar, recentemente nomeado bispo de Setúbal, passa a ser o sexto cardeal português, o quarto eleitor.

Depois de um encontro com o Papa Francisco, o primeiro-ministro, António Costa, também lembrou que Portugal tem "uma relação secular" com o Vaticano, "sempre muito positiva e rica" e comentou a recente nomeação de D. Américo Aguiar.

"É um motivo de grande orgulho termos a maior representação de sempre de cardeais [portugueses], quatro deles eleitores, dois deles bastante jovens. Seguramente serão cardeais por muitos e bons anos, por muitas décadas. É um sinal importante que o Papa Francisco tem dado no sentido de renovação e de rejuvenescimento da Igreja".

Como é que D. Américo Aguiar reagiu à notícia da sua elevação a cardeal?

Em entrevista conjunta à agência Lusa e à agência Ecclesia, D. Américo assumiu não ter “expectativa nenhuma” em relação à sua elevação a cardeal, reconhecendo que os primeiros sentimentos, a 9 de julho, quando foi conhecida a sua nomeação, “foram de medo, foram de incapacidade”, foram de se sentir um “danoninho”.

Rapidamente, porém, surgiu a confiança. “Eu tenho uma coisa – que mesmo quem porventura não me aprecia [reconhece] – que é quando tenho um desafio entrego-me na totalidade a esse desafio, aprendo e tento corresponder e é nessa disponibilidade que vou responder ao desafio”, assegura.

D. Américo Aguiar viu a sua nomeação para o colégio cardinalício como “um gesto de homenagem aos jovens, aos jovens portugueses envolvidos na preparação da Jornada Mundial da Juventude, por quem o Papa sempre manifestou grande carinho, grande homenagem, grande gratidão nos quatro anos” em que decorreu a preparação do encontro mundial de Lisboa.

Sobre os motivos concretos da escolha de Francisco, o futuro bispo de Setúbal admite que os contactos frequentes que teve com o pontífice em Roma para a preparação da Jornada tenham sido fulcrais.

“Nós, nos últimos quatro anos, tivemos a graça – e nunca este jovem de Leça do Balio pensou alguma vez privar com o Papa. Portanto, eu acredito e interpreto humanamente que o facto de ter tido seis, oito, 10, 12 audiências privadas com o Papa ao longo destes quatro anos, levou a que ele me mirasse e tirasse as medidas e concluísse e decidisse o que decidiu”, afirma o “cardeal Américo”, como já era conhecido no seminário.

Quanto ao que poderá ser o exercício do seu papel enquanto cardeal, D. Américo Aguiar sublinha concordar com uma frase que leu recentemente e que aponta para o estar a assistir-se a uma mudança de paradigma: de cardeais “príncipes da Igreja” para cardeais “príncipes do Papa”.

“Isto é interessante e eu acho que é isso que o Papa, nas suas últimas nomeações, tem reforçado: não é poder, não é fausto, não é nada disso. São aqueles que ele chama mais proximamente para junto de si, sem ser até geográfico, mas para aquilo que seja o governo da Igreja, naquilo que seja o ter mais perto as sensibilidades, seja da idade, seja da geografia, seja das outras circunstâncias”, afirma.

Como vai ser a cerimónia de criação dos cardeais?

O cerimonial que vai ser seguido este sábado está disponível integralmente no site da Santa Sé.

Como é habitual, a cerimónia inclui a imposição do barrete e a entrega do anel cardinalícios. Além disso, cada cardeal fica com um novo título ou diaconia, ou seja, a responsabilidade simbólica por uma igreja de Roma, como sinal de “participação na solicitude pastoral do Papa” na cidade.

D. Américo Aguiar é o 17.º a ser criado cardeal nesta cerimónia.

A celebração acontece na Praça de São Pedro, pelas 10h00 (menos uma em Lisboa). De seguida, os novos cardeais fazem as tradicionais visitas de cortesia, no Palácio Apostólico do Vaticano, às 11h30.

À tarde, às 16:30, na Igreja de Santo António dos Portugueses, em Roma, D. Américo Aguiar celebra missa.

Já no dia 4 de outubro, às 09:00, festa litúrgica de São Francisco de Assis (o Papa escolheu o nome de Francisco para o pontificado inspirado neste santo), o líder da Igreja Católica preside, na Praça São Pedro, à missa com o Colégio Cardinalício, na abertura da Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos.