Equipados com os fatos ou batas, máscaras e luvas, alguns com viseiras ou óculos de proteção, a apresentação dos profissionais de saúde seria peculiar há um ano, mas, dez meses depois de vida em pandemia, já se tornou familiar.
A operação arrancou com tranquilidade. Esta é, afinal, a segunda vez que a Autoridade de Saúde Regional decreta um esforço de testagem massiva naquela freguesia de Vila Franca do Campo, depois de terem sido feitos rastreios à covid-19 em todas as escolas do concelho, bem como na Vila de Rabo de Peixe, no concelho da Ribeira Grande.
Desta vez, serão submetidas a testes rápidos cerca de 2.500 pessoas das zonas mais afetadas pelos surtos nas freguesias de Rabo de Peixe e Ponta Garça, ambas sob cerca sanitária.
Dos cerca de 3.500 habitantes de Ponta Garça, aproximadamente 1.000 serão submetidos ao rastreio de três dias, que começou hoje.
Na fila que se forma em frente ao polo de Ponta Garça da Escola Profissional de Vila Franca do Campo, grande parte das pessoas será testada pela primeira vez.
“Estou aqui às escuras”, afirma Ricardo Pimentel, de 59 anos, que se submete pela primeira vez a uma zaragatoa.
O teste traz uma “consciência mais limpa, para não infetar ninguém e a nós próprios”.
Miguel de Sousa tem 68 anos e foi chamado “de ontem para hoje” para se apresentar naquela escola. Reconhece a importância de participar no rastreio, porque a covid-19 “é uma doença ruim” e é preciso “proteger aí o pessoal”.
Enquanto espera, o estreante mantém-se calmo: “Estou bom agora, até me posso enervar quando entrar, não sei… São coisas que a gente nunca pode prever”.
Passa um pouco das 09:15 (hora local, 10:15 em Lisboa) quando chega mais uma carrinha, ultimam-se os preparativos para começarem a chamar quem faz fila desde antes das 09:00.
Uma profissional de saúde alerta para a necessidade de ser mantido o distanciamento na fila e, como resposta, ouve um protesto que diz “já estou aqui desde as 08:30!”.
No fim da fila, que, por esta altura, junta algumas dezenas de pessoas, Ana Sousa é mais tranquila: “Estou aqui desde as 08:50, mas eu também moro aqui perto. Como estava vendo chegar pessoas, para não ficar para trás, chegámos um bocadinho mais cedo. Tudo se faz”.
A ponta garcense, de 63 anos, também será testada pela primeira vez e acha “bem” que se teste a população “para ver se essa doença acaba”.
“Eu já tinha pensado que fizessem um trabalho desses, para ver. Mesmo assim, calhou, e a gente vai experimentar, porque a gente nunca sabe quem é que está infetado”, afirma.
Jéssica Amaral, de 27 anos, está “um bocadinho ansiosa” com a ideia da zaragatoa, mas tem “quase a certeza” de que o resultado do teste rápido será negativo.
“Não tenho sintomas, nem nada disso. Até ao ponto de hoje, não tive contacto nenhum com nenhum positivo. Já tive família e amigos que tiveram, mas nunca tive contacto com eles antes de saberem que estava positivo”, garante.
À semelhança do que tem acontecido, no esforço de testagem que arranca hoje nas freguesias de Ponta Garça e Rabo de Peixe, serão utilizados testes rápidos.
“Ao fim de 15 minutos, já têm o resultado”, explica Pedro Santos, presidente do concelho de administração da Unidade de Saúde de Ilha de São Miguel (USISM), entidade que está a fazer os testes.
Jéssica Amaral precisa que, ao fim desses 15 minutos, o resultado seja negativo. “Ainda hoje tenho de ir trabalhar”, explica a funcionária de um supermercado.
O administrador da USISM lembra, no entanto, que “o teste rápido só serve para quando a pessoa tem uma carga viral já elevada”, o que significa que “um negativo poderá não ser um negativo”.
Pedro Santos reforça que, “numa fase de pandemia, um teste negativo, seja ele PCR, seja ele rápido, não é um teste a dizer que a pessoa está livre”.
“As pessoas podem fazer a sua vida, contudo, têm de continuar a cumprir as regras de segurança, que são: o uso de máscara, lavar as mãos, manter o distanciamento social, não fazer convívios sociais, higienização das próprias casas, obedecer às regras da Autoridade de Saúde, cumprindo o confinamento a partir das 20:00, como está estabelecido, durante a semana, não ir para espaços públicos com mais do que quatro pessoas, ou seja, cumprir as regras de segurança, isso é o fundamental”, explica.
Desde sexta-feira que, por decisão do Conselho do Governo dos Açores, a ilha de São Miguel está sujeita a uma série de medidas restritivas para travar a pandemia, entre as quais a existência de cercas sanitárias nas freguesias micaelenses de Rabo de Peixe (Ribeira Grande) e Ponta Garça (Vila Franca do Campo).
Com a implementação das cercas, que vigorarão até 22 de janeiro, fica proibida a circulação e permanência na via pública e é determinado o encerramento dos estabelecimentos de ensino, de restauração, bebidas, similares e cafés e o cancelamento de todos os eventos culturais ou de convívio social alargado, nestas duas freguesias da ilha de São Miguel.
Os Açores têm atualmente 765 casos positivos ativos, sendo 736 em São Miguel, 23 na Terceira, um no Faial, um no Pico e quatro nas Flores.
Foram detetados até hoje na região 3.157 casos de infeção pelo novo coronavírus SARS-CoV-2, que causa a doença covid-19, verificando-se 23 óbitos e 2.270 recuperações.
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