Numa audição na comissão parlamentar dos Negócios Estrangeiros, a deputada social-democrata Paula Cardoso questionou o ministro – que tutelou a Defesa entre 2018 e 2022 - sobre o ofício noticiado na última edição do Expresso, datado de março de 2020, no qual Gomes Cravinho foi informado da derrapagem no custo das obras no antigo Hospital Militar de Belém, alegando que o ministro, ao não dizer nada, deu a sua autorização tácita ao aumento da despesa.
“Em nenhuma circunstância se pode imaginar que isso é um pedido de autorização, em nenhuma circunstância se pode imaginar que, não dizendo nada, tacitamente está aprovado”, respondeu João Gomes Cravinho.
O ministro dos Negócios Estrangeiros salientou que “aquilo que é preciso quando se faz uma solicitação é identificar claramente” os valores.
“Não é dizer ‘isto vai custar mais do que nós pensávamos, achamos que vai custar mais um montante e talvez mais outros montantes, depois logo se vê’. Isso não é um pedido de autorização”, vincou.
O governante afirmou que “quando se faz um pedido de autorização num regime de exceção ou não, os requisitos passam por ter uma cabimentação, uma identificação de fonte de financiamento, um compromisso associado à cabimentação”.
Cravinho salientou que o ofício em causa não foi “muito claro em relação às despesas que seriam necessárias”.
O ministro citou ainda o relatório da Inspeção-Geral de Defesa Nacional (IGDN) sobre a matéria, designadamente quando refere que “não foi evidenciado na documentação disponibilizada um pedido expresso da DGRDN [Direção-Geral de Recursos da Defesa Nacional] à tutela para autorizar a despesa ao abrigo de regime excecional de contratação pública”.
Continuando a citar o relatório, apontou “uma inexistência de qualquer formalização de pedido de autorização para a tutela, com indicação de valores, fontes de financiamento ou de cabimentos associados”.
Momentos antes, o deputado do PSD João Montenegro tinha defendido que o ministro dos Negócios Estrangeiros perdeu as condições para se manter no cargo, acrescentando que Gomes Cravinho, “como responsável pela política externa do Governo, não tem condições de exercer o cargo com idoneidade e credibilidade” e que a sua prestação “está ferida de morte”.
O social-democrata acrescentou que o ministro “tem uma relação difícil com a verdade”, acusando-o de omitir informação ao parlamento: “Omitiu aqui nesta casa. Disse que não sabia da derrapagem das obras no Hospital Militar de Belém, mas afinal sabia”, acusou.
“Aquilo que eu vejo é muita jactância, mas em termos concretos nada. Muitas insinuações, muitas afirmações mas no concreto… ‘O senhor ministro omitiu informação’, mas quer concretizar? Gostava de ouvir”, contra-atacou Gomes Cravinho.
Também o deputado e líder do Chega, André Ventura, considerou que o ministro está fragilizado.
“Vou recordar o que me respondeu [no parlamento em 20 de dezembro]: “não, não autorizei nem sequer me foi solicitado, nem informado”. Olhe, aparentemente foi-lhe informado, e se foi informado é-lhe solicitado ou os ofícios que recebe são só a dar-lhe uma informação? (…) O ministro mentiu, é o que eu acho”, atirou.
Na resposta, Gomes Cravinho começou por responder de forma irónica: “Há pouco tempo dizia que eu menti, agora diz que acha que eu menti, é preciso mais do que achar, é preciso mostrar, e o que veio aqui fazer hoje não demonstra rigorosamente nada”.
Gomes Cravinho acusou Ventura de um “esforço claro para baralhar as pessoas”, salientando que nunca disse que “não foi informado” do aumento dos custos com as obras, apenas que não a autorizou.
A frase em causa de Gomes Cravinho, no debate de 20 de dezembro no parlamento foi: “Se eu autorizei algum acréscimo de despesa para além dos 750 mil euros? Não, a resposta é não, não autorizei, nem aliás me foi solicitado que autorizasse”, assegurou na altura.
Cravinho acrescentou que se tivesse seguido a recomendação da Inspeção-Geral de Defesa Nacional (IGDN) de elaborar um despacho de delegação de competências a autorizar a despesa com efeitos retroativos “a situação hoje era bem diversa” e quem seria responsável era ele.
Pelo PS, o deputado Francisco César criticou o PSD pela forma como se colocou perante o ministro, começando por dizer que o governante não tem condições "e só depois de o condenar é que pede os esclarecimentos".
O socialista argumentou também que se tivesse sido dada autorização pelo ministro para os gastos extra “quem teria sido condenado seria o senhor ministro e não o antigo diretor-geral [de Recursos da Defesa Nacional]”, Alberto Coelho, arguido no âmbito da Operação 'Tempestade Perfeita'.
“Que mau exemplo é este quando nós procuramos condenar quem denunciou esquecendo quem cometeu um ilícito”, lamentou.
(Notícia atualizada às 19h26)
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