Iniciado há dois anos como projeto-piloto em três agrupamentos escolares do concelho de Baião, o "Referencial de Educação para a Segurança, Defesa e Paz", de adesão voluntária, já chegou a mais escolas do distrito do Porto, da área metropolitana de Lisboa, Viseu e, na semana passada, a Vila Real.

A ideia de levar os conceitos da Defesa Nacional às escolas, de uma forma transversal aos currículos, tem, pelo menos, 17 anos. Em 1999, um despacho dos então ministros da Educação, Marçal Grilo, e da Defesa, Veiga Simão, propunha criar uma estrutura "que contribua para a introdução e disseminação" "de instrumentos e recursos de formação associados à defesa nacional e à ação das Forças Armadas" visando uma "cidadania ativa e responsável".

Em entrevista à Lusa, o diretor do IDN, general Vitor Viana, disse que o projeto, que foi tentado de várias formas ao longo dos anos, "ganhou novo impulso" com a decisão do atual governo de envolver as autarquias e os diretores dos agrupamentos escolares.

O referencial é um documento "associado à ética, aos valores dos direitos humanos, à identidade nacional" e assenta em "conhecimentos que contribuem para um exercício de cidadania dinâmico, ativo e responsável", contribuindo "para a qualidade da democracia", sustentou.

"Segurança, Defesa e Paz", "Contexto Internacional e Quadro Nacional, Mundialização e Interdependência", "Identidade Nacional e o Quadro Internacional" e, por último, "Forças Armadas e Forças de Segurança - Quadro Institucional, Organização e Missões", são os quatro temas do referencial.

"Quais são os eixos para garantir a paz, para mediar conflitos, quais são as ameaças e riscos à segurança internacional, como é que nós estamos no mundo. Qual é o mundo que nos envolve, não é possível falar sobre segurança, defesa e paz sem perceber onde estamos", exemplificou.

O tema mais escolhido pelas escolas foi até ao momento os direitos humanos e a paz. Já o tema das Forças Armadas e Forças de Segurança é aquele em que se notam "mais dificuldades", o que "não surpreende", disse o general Vitor Viana.

"O nível de conhecimento dos nossos cidadãos sobre estas matérias é insuficiente", reconheceu.

Na Escola Secundária Marquês de Pombal, Lisboa, o professor Nuno Albano usa o referencial "como enquadramento" dos conteúdos programáticos do curso profissional de Multimédia, que visitará em meados do mês a Força Aérea.

Para esta escola, situada em Belém, foi mais fácil abordar os temas militares no âmbito do referencial já que teve, até julho de 2015, o Regimento de Lanceiros n.º 2 como vizinho, na Calçada da Ajuda, para o qual produziu cinco DVD de divulgação.

E ainda antes de terem o referencial como "enquadramento", os alunos do curso já tinham trabalhado com a GNR e com a Marinha.

Para a maioria dos jovens no entanto, admite Nuno Albano, é a primeira vez que há um contacto com as entidades militares. A sensibilização para os temas do referencial surge assim "de forma natural", sustentou.

"A Unidade de Controlo Costeiro [da GNR] foi fazer uma interceção a embarcações no rio Tejo. Imaginem um adolescente que é colocado numa lancha rápida e anda a fazer a filmagem, a reportagem desse tipo de missões. Para nós é motivador, temos cinco turmas que participam. E os nossos alunos estão a trabalhar, sem dar por isso, nos conteúdos do curso", descreveu.

Alexandre, 16 anos, registou a "dimensão com que a GNR opera, a organização, a hierarquia, a obediência" quando teve oportunidade de estar do lado de dentro "da missão": "A missão foi escoltar o presidente irlandês ao Mosteiro dos Jerónimos, penso que era uma reunião com um político português e a nossa missão era captar a atividade da GNR no seu dia normal, uma escolta, que as pessoas não têm acesso a isso".

Na Escola Secundária Maria Amália Vaz de Carvalho, foi escolhido o tema dos "direitos humanos, a globalização e a identidade nacional" e, entre os trabalhos realizados, destaca-se a criação de um grupo de debate sobre a Amnistia Internacional, por alunas do 12.º ano.

"Aquele que nos é mais difícil é as Forças Armadas porque é mais difícil cruzar com as nossas matérias", disse a professora Ana Goulart, adiantando que no 3.º período letivo está prevista uma palestra nessa área.

Ana Serôdio, aluna do 12.º ano, indica os temas abordados no grupo de debate: "O ódio que se está a gerar a nível internacional, pelo medo e pela falta de segurança".

"Sobretudo não apoiar essa mensagem de que devemos estar contra as pessoas, não apoiar o fundamentalismo, perceber a diferença entre ser-se muçulmano e ser terrorista. Não é a mesma coisa, os muçulmanos não tem as mesmas ideias que os terroristas, os refugiados não são maioritariamente terroristas, porque esses vêm nos aviões connosco, com documentos falsos, não vêm a fugir de uma guerra", explicou.