“Ela forçava as crianças a comer até, às vezes, os meninos vomitarem. Se as crianças vomitassem para o prato, ela continuava a dar a sopa”, disse a testemunha, adiantando que nessas alturas a arguida dizia: “vomita para o catarro sair”.
A arguida, de 64 anos, está acusada de nove crimes de maus tratos, por factos ocorridos em 2019 e 2020, quando trabalhava no Centro Social de Esgueira, tendo a seu cuidado um grupo de crianças com idades entre um e três anos.
Na terceira sessão do julgamento, que está a decorrer no tribunal de Aveiro, a antiga auxiliar de ação educativa relatou alguns episódios que presenciou, durante o período em que trabalhou na sala da arguida, recordando uma situação em que viu a educadora agredir com “palmadas” alguns meninos que estavam a chorar, porque não queriam dormir na hora da sesta.
Disse ainda ter ouvido, numa outra situação, o barulho de uma palmada e uma criança a chorar, tendo visto depois “os cinco dedos na nádega” da criança, quando lhe estava a mudar a fralda, e referiu que algumas crianças “irrequietas” eram amarradas à cadeira com um lençol na hora de comer, por ordens da arguida.
O coletivo de juízes ouviu ainda a coordenadora da creche, à data dos factos, tendo a mesma revelado que uma vez foi à sala da arguida, alertada por uma colega, e viu-a a dar comida a uma criança que tinha “muitos bocados de maça na boca”.
“Ela estava a insistir e eu disse-lhe para parar”, afirmou, adiantando que a criança "chorava bastante e estava aflita”.
O processo resultou de uma queixa apresentada no Ministério Público (MP) pelos pais das crianças que frequentavam a sala da educadora que, entretanto, foi despedida, após um processo disciplinar.
De acordo com a acusação do MP, a arguida obrigou as crianças que vomitavam no prato a comer a comida onde havia caído o próprio vómito, tendo chegado a amarrar uma criança à cadeira de refeição com panos/lençóis, enquanto esta tomava as refeições.
A arguida terá ainda obrigado as crianças a ingerir alimentos sólidos, tendo, numa das vezes, metido um pedaço de pera na boca de uma menina que se engasgou e deixou de respirar, ficando “estática e com os olhos muito abertos”, tendo sido socorrida por uma das ajudantes que a retirou da cadeira e a colocou no fraldário na posição lateral de segurança.
Segundo o MP, a arguida recusou que a menina fosse observada por um médico e não telefonou à progenitora, nem lhe relatou a situação.
A acusação refere, por outro lado, que a educadora proibiu as ajudantes de dar colo às crianças e, quando estas choravam, “colocava a musica do rádio muito alta e cantava em tom alto, tornando o ambiente da sala inadequado para o bem-estar das crianças”.
Um outro caso relatado envolveu um menino de 2 anos, que se queixava de dores de barriga, mas a educadora terá desvalorizado a situação, dizendo que “aquilo era fita” e que deveriam ser “gases”.
O menino acabaria por ser conduzido ao Hospital de Aveiro, após a ajudante de ação educativa ter contactado o Instituto Nacional de Emergência Médica, tendo-lhe sido diagnosticado “vómitos persistentes e gastroenterite aguda”.
O MP diz que a arguida molestou repetidamente a “integridade física e o bem-estar psicológico e emocional” destas crianças afetando-as na sua autoestima e desenvolvimento enquanto crianças.
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