Ana Saltão era suspeita de ser a autora de mais de dez disparos que mataram Filomena Alves, de 80 anos, numa residência em Coimbra, na tarde de 21 de novembro de 2012, tendo sido acusada pelo Ministério Público de um crime de homicídio qualificado e de um crime de peculato (pelo furto da arma de um colega da PJ do Porto).
O presidente do coletivo do Tribunal de Coimbra, Miguel Veiga, sublinhou que a decisão de absolvição pelo princípio 'in dubio pro reo' foi unânime, quer por parte do coletivo, quer por parte do tribunal de júri criado para este julgamento.
Durante a leitura da sentença, Miguel Veiga dividiu a acusação do Ministério Público em três aspetos essenciais - o motivo para o crime, o uso da arma de uma colega da PJ e as circunstâncias em que terão ocorrido o crime -, colocando em causa cada um dos pontos.
O juiz explicou que o móbil apontado pelo Ministério Público - motivações económicas - não é sustentado, considerando que este foi um "dos pontos mais espinhosos" da acusação.
A arguida e o marido eram um "casal claramente de classe média", com um vencimento de cerca de 1.500 euros cada, que, apesar das despesas que tinham, podiam recorrer à ajuda dos pais de Ana Saltão ou da avó do marido, frisou, sublinhando que, neste contexto, não há a demonstração "de verdadeiro e especial aperto" - uma "emergência dramática" que pudesse levar ao homicídio da vítima.
Relativamente à utilização da arma de uma colega da PJ da Diretoria do Norte, o presidente do coletivo voltou a questionar a tese do Ministério Público.
"Temos elementos que nos possam dizer de forma segura que a arma desapareceu por alguém a ter subtraído e que esse alguém foi a arguida? Não podemos", vincou, referindo que também aí ficaram a faltar "muitas peças do puzzle".
Já sobre as circunstâncias em que a arguida teria cometido o crime, o Tribunal de Coimbra deu como assente que os tiros que vitimaram Filomena Alves foram dados por volta das 15:53, sendo que Ana Saltão foi vista por uma vizinha, na Maia, depois de almoço.
Para Miguel Veiga, a arguida teria muito pouco tempo para chegar a Coimbra e cometer o crime, numa rua de sentido único e com muito movimento.
O juiz chamou ainda a atenção para a acusação, que refere que a arguida terá revelado frieza e preparação.
No entanto, argumenta, "há uma dose de amadorismo" no crime, sendo que, naquelas circunstâncias, Ana Saltão ter-se-ia arriscado a ser vista por alguma vizinha da vítima em Coimbra, face ao número de tiros disparados àquela hora do dia.
Miguel Veiga considerou ainda "muito estranho" a filha da vítima ter estado oito meses sem se aperceber de que tinha perdido a chave de casa da sua mãe.
"Tudo isto é muito estranho", notou, classificando também de "estranhos" alguns atos por parte da investigação.
Durante a sentença, ficou por explicar por parte do coletivo a análise que fez em relação aos resíduos de disparos encontrados num blusão de Ana Saltão, que a defesa apontava para a possibilidade de terem sido contaminados, por terem sido postos no chão da PJ do Porto, após a sua recolha.
A inspetora da PJ já tinha sido absolvida na primeira instância, em 2014, foi depois condenada a 17 anos de prisão pela Relação de Coimbra, mas o Supremo recusou a decisão e o julgamento voltou a ser repetido em maio, novamente com recurso a tribunal de júri, que reiterou agora a absolvição de Ana Saltão.
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