“A nível europeu existem leis, mas são poucas e insuficientes e as que existem nem são cumpridas”, afirmou à Lusa João Saraiva, um dos três autores de um estudo publicado na revista “Forum of Animal Law Studies” em conjunto com Teresa Giménez-Candela e Helena Bauer, da Universidade Autónoma de Barcelona.
Segundo o biólogo, que criou um grupo de investigação sobre ética e comportamento animal na Universidade do Algarve (UAlg), o estudo “cruzou pela primeira vez” a biologia e o bem-estar dos peixes com a legislação existente, “juntando dois mundos que habitualmente não se cruzam”.
“Este cruzamento mostrou onde estão as insuficiências na lei e como e onde se pode colmatar, com mais investigação ou melhor aplicação da lei” adiantou, considerando que a forma como estes animais são mortos “é uma das medidas a alterar”, para além da “densidade de cultivo e a implementação do enriquecimento ambiental”.
Como solução apontou a “implementação da lei que já existe”, que passa também por “conhecer a biologia e o bem-estar das espécies que se cultivam e dar formação aos trabalhadores” das aquaculturas “ao nível do bem-estar animal, como aconteceu com as pecuárias”.
Outro ponto inclui a criação de “sistemas de certificação como já acontece para a sustentabilidade nas pescas”, onde o consumidor fica a “saber a forma e o local de captura, podendo decidir, por exemplo, não consumir espécies pescadas por arrasto”.
Na aquacultura, “pouco se sabe, apenas o país de origem”, sublinhou, notando que “as alterações no bem-estar dos animais melhoram a qualidade do produto”.
Segundo o investigador, o stress “provocado na morte” leva “à libertação de hormonas que transformam o sabor e a textura da sua carne”, o que já não acontece “num peixe que morra rapidamente e sem sofrimento”.
Considerando que a perceção do público sobre o bem-estar animal — principalmente o sofrimento infligido no seu cultivo ou morte, — “tem vindo a aumentar”, faz o paralelismo entre a diferente interpretação dos chamados ‘mercados vivos’.
“Em Portugal quase que queremos o peixe vivo nos mercados ou o marisco vivo nos restaurantes, mas criticamos os mercados chineses com os quais podemos encontrar semelhanças”, lamentou.
João Saraiva adiantou que a morte por atordoamento já acontece na Alemanha e na Suíça, começando também a ser praticado “na Turquia, Noruega e Itália”.
Como animais cultivados para consumo humano, os peixes de aquacultura estão protegidos pela legislação europeia, “ao mesmo nível que uma galinha uma vaca ou um porco”.
No entanto, na prática, as “únicas normas que norteiam a produção só têm em vista a qualidade final do produto apresentado ao consumidor”, nomeadamente a “presença de hormonas ou se a comida que lhes dão não está podre” disse.
A nível mundial, são cultivados para consumo humano “menos de 30 espécies de animais terrestres, contrastando com as 400 de peixes”, o que é um desafio para a definição de critérios de bem-estar animal.
Neste momento, a equipa de João Saraiva está a ultimar os procedimentos para a criação do “primeiro e mais completo selo de certificação para o bem-estar animal para 25 peixes de aquacultura”, para uma empresa mundial responsável por outros selos de certificação.
Truta, salmão, robalo, dourada, corvina, lírios e esturjão para caviar são alguns desses peixes, concluiu.
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