Promovido pela Câmara do Porto e materializado pela Associação do Porto de Paralisia Cerebral (APPC) o projeto integra o Contrato Local de Desenvolvimento Social 4.ª Geração e decorre, desde 2020, na antiga sede do FC Cerco do Porto, no coração de um bairro problemático a dois passos do Centro de Formação Profissional do Porto, o maior do Norte.
Dois anos após ter integrado o projeto e aproveitado os ensinamentos das Oficinas “Vão mais longe”, Josefino ultrapassou a “parede virtual que existia entre o bairro e o centro de formação e hoje é mais um dos formandos que lá estão em busca de um futuro”, revelou à Lusa a coordenadora do projeto, Isabel Rute.
Aos 41 anos, desempregado e pai de cinco filhos, Josefino quer ultrapassar o estigma e entrar no mundo do trabalho, mas não de qualquer forma, assegurando que o fará “com os diplomas na mão”.
“Ser cigano e haver o estigma não me retira a esperança de entrar no mercado de trabalho. Logo que eu tenha diplomas a provar que tenho capacidade para fazer aquele trabalho, não poderei ser discriminado. Sou igual aos outros”, disse.
E assegurou; “Eu gosto de ser mandado, não gosto de ser discriminado. Se eu for trabalhar, terei de cumprir o que o patrão diz, não pode ser de outra maneira”.
Ao lado Rui Maia, de 41 anos, conta que foi para o projeto estimulado pelo primo, apontando agora à conclusão do “9.º ano e depois do 12.º, para depois seguir para a faculdade”, impulsionado por conselhos que primeiro sugeriram “tirar enfermagem, mas também o curso de assistente social”.
“A minha esposa também está a tirar o 9.º ano e pretende tirar o 12,º até porque temos três filhas e quero que elas estudem mais do que eu. (…) É uma estratégia para a vida das minhas três filhas”, contou dos novos horizontes que o projeto lhe trouxe para a vida.
De volta à questão do estigma, Rui Maia foi perentório na resposta: “o estigma ultrapassa-se com os estudos e com a experiência, só com um curso conseguiremos chegar lá”.
Sobre as conversas no bairro, Josefino conta que, com o seu exemplo, demonstrou aos vizinhos que os ciganos “têm cabeça para aprender a ler e a escrever” e que, fruto disso, há quem já lhe tenha dado “os parabéns”.
Pai de cinco filhos é com orgulho que relata que “o mais velho, de 18 anos, tem o 10.º ano”, enquanto a “filha, de 16, fez o 9.º ano” e o de seis anos “passou para a segunda classe”, completando que a esposa “vai começar no projeto em setembro, assim que recomeçarem as aulas dos filhos [que estão na pré-escola]”.
Uma parte deste sucesso reside em Fátima Sousa, reformada do ensino, onde lecionou Física e Química e que, quase 50 anos depois, retomou o voluntariado para “tentar ajudar pessoas que estão sem emprego, que querem fazer um curso de formação profissional e que não se sentem à vontade, e poder ajudá-los ao nível da leitura e da escrita”.
De si, diz com quem ela trabalha que “incute grande autoestima nas pessoas que ajuda”, um pormenor que a antiga professora não quer valorizar, preferindo o lado prático do seu labor: “são pessoas que estão à procura de um emprego ou de preparação para um emprego”.
“Já ajudei cerca de uma dezena delas, mas de forma mais prolongada foram menos”, acrescentou.
Segundo a coordenadora, Isabel Rute o programa, apoiado por fundos comunitários, vai estender-se até setembro de 2023 e atua nas freguesias de Campanhã e do Bonfim, no Porto.
“O público a que se destina é muito heterogéneo (…), vai desde as pessoas idosas em situação de isolamento social (…) aos adultos que terminaram a escolaridade e estão em situação de desemprego, incluindo os de desemprego de longa duração, sendo que também trabalhamos com as famílias e com as crianças, no sentido de promover algumas competências parentais”, explicou.
Comentários