No despacho, que adia a leitura da sentença de 21 de setembro para maio do próximo ano, o presidente do coletivo, Francisco Henriques, revela que, desde o fim das férias judiciais, deixou de ter exclusividade para a elaboração do acórdão, passando o magistrado a ter de realizar outros julgamentos, quer como presidente do tribunal coletivo, quer integrando outros coletivos de juízes.
Assim, o juiz considerou que se "mostra completamente impossível" elaborar o acórdão "com a complexidade subjacente" ao processo Vistos Gold até ao próximo dia 21
Além de participar agora em outros julgamentos, o juiz lembra que a isso soma-se o trabalho diário de despacho de expediente, preparação dos julgamentos a que preside, intervenção nas deliberações do tribunal coletivo e, ainda, elaboração dos acórdãos dos julgamentos por si presididos.
O juiz assinala igualmente que, de acordo com a agenda do seu tribunal coletivo, em todas as terças, quartas e quintas-feiras e, algumas segundas-feiras, estão agendados julgamentos, com sessões de manhã e de tarde, sendo "escasso o remanescente do trabalho efetivo para se dedicar à elaboração do acórdão" do processo Vistos Gold.
"Desta forma, por via a evitar sucessivos adiamentos, ao signatário não resta outra alternativa senão a de reagendar a leitura do acórdão para uma data posterior à interrupção judicial da Páscoa", lê-se no despacho, a que a agência Lusa teve acesso.
A nova data - 17 de maio de 2019 - aponta para uma dilação temporal de 246 dias (incluindo sábados, domingos, feriados e férias judiciais), durante a qual o signatário "espera utilizar 120 dias de trabalho na elaboração do acórdão em causa".
"Embora pareça uma longa dilação, na verdade, de acordo com a planificação efetuada pelo signatário, não pode deixar de ser compreendida como uma expectativa arrojada", alerta Francisco Henriques.
O juiz presidente admite que a leitura do acórdão teria ocorrido "num prazo mais curto" caso não tivessem sido alterados os pressupostos, incluindo a questão da exclusividade.
Foi ainda determinado que do despacho fosse dado conhecimento ao Conselho Superior da Magistratura, bem como à juíza presidente da Comarca de Lisboa.
Face ao sucedido, advogados de defesa de arguidos no processo Vistos Gold estão a ponderar apresentar uma petição ao Conselho Superior da Magistratura para que devolva a exclusividade ao juiz que presidiu ao julgamento, por forma a que a decisão de primeira instância não se prolongue demasiado no tempo, conforme avançou à Lusa o advogado João Medeiros, mandatário de Jarmela Palos, ex-diretor do Serviço Estrangeiros e Fronteira (SEF).
Nas alegações finais do julgamento, realizadas antes das férias judiciais de verão, o Ministério Público (MP) pediu a condenação do ex-presidente do Instituto dos Registos e Notariado António Figueiredo a uma pena até oito anos de prisão e a sua suspensão de funções públicas por um período de dois a três anos.
Para os restantes arguidos, incluindo o ex-ministro da Administração Interna Miguel Macedo e a antiga secretária-geral do Ministério da Justiça Maria Antónia Anes, o procurador José Niza pediu que fossem condenados a uma pena única não superior a cinco anos de prisão, admitindo que a mesma possa ser suspensa na execução, à exceção do empresário Jaime Gomes, para quem pediu prisão efetiva.
O procurador decidiu retirar a Jarmela Palos um dos dois crimes de prevaricação de que estava acusado, referente à questão do oficial de ligação em Pequim, mas deu como provado os restantes crimes da acusação, incluindo corrupção passiva.
Nas alegações, o procurador reconheceu que a prova pessoal e testemunhal prestada em julgamento foi fraca, com alguns arguidos a optarem pelo silêncio ou a entrarem em contradição e testemunhas que podiam ter sido decisivas a escudarem-se em lapsos de memória, face ao que haviam dito na fase de inquérito.
Contudo, em sua opinião, as interceções telefónicas, SMS e emails entre os arguidos e a prova documental existente no processo são "claras" e bastantes para provar os factos imputados, ditando a condenação dos arguidos.
As considerações do MP foram contestadas pelos advogados de defesa, que pediram a absolvição dos seus constituintes.
Miguel Macedo demitiu-se em novembro de 2014 de ministro da Administração Interna, tendo-lhe sido imputado pelo MP o alegado favorecimento de um grupo de pessoas que pretendia lucrar de forma ilícita com os 'Vistos Gold', realizando negócios imobiliários lucrativos com empresários chineses que pretendiam obter autorização de residência para Investimento.
Desse grupo faziam parte alegadamente Jaime Gomes, empresário e amigo de Miguel Macedo, António Figueiredo, ex-presidente do Instituto de Registos e Notariado (IRN), e o empresário chinês Zhu Xiaodong.
Em causa estão também alegados favorecimentos a uma empresa de Paulo Lalanda de Castro, ex-patrão da farmacêutica Octopharma, e ao Grupo Bragaparques.
O processo Vistos 'Gold', que tem 21 arguidos (17 pessoas singulares e quatro empresas), prende-se com a alegada prática dos crimes de corrupção ativa e passiva, recebimento indevido de vantagem, prevaricação, peculato de uso, abuso de poder, tráfico de influência e branqueamento de capitais.
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