Numa apresentação feita a partir da Câmara Municipal de Lisboa (CML), Fernando Medina começou por referir que, se por um lado, "não escolhemos a pandemia que estamos a viver” no que toca aos desafios apresentados pela covid-19, por outro há "uma palavra a dizer sobre o futuro".

Recordando que Lisboa é a Capital Verde Europeia para 2020, Fernando Medina referiu como a pandemia "só tornou a capital verde mais urgente, mais precisa”, especialmente no que toca às consequências para a saúde pública que têm os níveis de poluição da cidade. "Se fizemos um esforço tão notável para evitarmos milhares de mortos como resultado do que seria uma pandemia desenfreada no nosso território, temos exactamente a mesma responsabilidade para evitarmos os mais de 6000 mortos que o nosso país anualmente tem com causas diretamente ligadas à poluição”, disse o autarca.

Como tal, face à escolha entre "o regresso a uma cidade poluída e congestionada”, ou a uma cidade “menos poluída, mais saudável, mais sustentável, e com melhor qualidade de vida para todos”, o Medina disse que o "caminho a prosseguir" é pela segunda opção, sendo necessário "agarrar o momento para fazer aquilo que ainda não for feito”.

Recordando ter apresentado já como pilar para a cidade a sua política de habitação materializada no Programa Renda Segura, o Presidente da CML apresentou então dois outros eixos da política governativa para a capital, o "Lisboa Ciclável" e o "A Rua é Sua".

Mais 200 quilómetros de ciclovia em 2021

Dadas as atuais restrições de 30% da lotação dos transportes públicos devido ao controlo da pandemia, a autarquia teme que milhares de viagens seja efetuadas por outros meios e que o meio automóvel seja o privilegiado.

Como tal, e calculando que 68% das deslocações em Lisboa são inferiores a cinco quilómetros, a CML vai promover uma forte aposta na rede viária de ciclovias, destinada a, segundo Fernando Medina, "criar uma rede estruturante, que cubra os principais eixos de circulação, para chegar aos principais lugares de Lisboa", algo que, admite o autarca, "ainda não existe".

Aos 105 quilómetros de ciclovia já existentes, Lisboa prevê a criação de mais 26 quilómetros até julho e outros 30 quilómetros até setembro. Já no primeiro trimestre de 2021, serão construídos outros 20,5 quilómetros, aumentando o total da rede para mais de 200 quilómetros.

Até julho, vão ser criadas ciclovias na Alameda dos Oceanos e nas avenidas de Pádua, Cidade Luanda, Almirante Reis, da Índia, 24 de julho, da Liberdade e Uruguai, juntando-se assim às vias já construídas na avenida de Berlim, Cidade Bissau, Castilho e Marquês da Fronteira.

Segundo o documento partilhado pela CML, "todas as ciclovias serão segregadas, aumentando segurança e a confiança" e a rede está a ser criada através do sistema "pop-up", ou seja, com pinturas em vias anteriormente destinadas à circulação automóvel e com separadores.

Esta solução, defendeu Fernando Medina, promove soluções rápidas e "de baixo custo", tendo sido aplicada nas ciclovias já construídas na avenida de Berlim, Cidade Bissau, Castilho e Marquês da Fronteira. O autarca, no entanto, concedeu que, no caso de obras de caráter definitivo, os valores podem ser mais elevados, sendo anunciados obra a obra, mas que apresentará de futuro qual o custo estimado global para todo o plano.

Para setembro estão reservadas intervenções nas avenidas de Roma, Marechal Gomes da Costa, de Ceuta, Lusíada, de Berna, Conde Almoster, José Malhoa e das Descobertas, sendo que em 2021 vão ser adicionadas ciclovias às avenidas Gago Coutinho, Restelo, Torre de Belém, Álvaro Pais, Carlos Paredes e Helena Vieira da Silva.

O resultado destas intervenções, defendeu Medina, não será "um somatório de quilómetros de ciclovias", mas sim "uma rede estruturante de ciclovias" definida por seis eixos, como o "Eixo Marginal", que vai ligar Algés ao Parque das Nações, ou o "Eixo Central", da Ameixoeira ao Terreiro do Paço.

Apoios no valor de quatro milhões de euros para comprar bicicletas e criar lugares de estacionamento

Outra das medidas promovidas pela CML vai passar pela comparticipação na compra de bicicletas, sendo a medida destinada em exclusivo a residentes da cidade de Lisboa e não abrangendo trabalhadores que residam noutros concelhos.

Apoiando até 50% do valor de aquisição de bicicletas, a autarquia dispõe até 100 euros para bicicletas convencionais, mas este apoio destina-se apenas a estudantes — do 2º ciclo até ao Ensino Superior. Para os outros residentes, podem ter apoios até 350 euros na compra de uma bicicleta elétrica, aumentando esse valor para 500 euros se for destinado à compra de uma bicicleta de carga.

Em resposta às questões dos jornalistas, Fernando Medina esclareceu que a esta medida entra em vigor hoje e abrange "todas as lojas da cidade de Lisboa". Todas as compras já feitas neste dia contarão, mas "nesta primeira fase tem de funcionar um mecanismo de reembolso", porque a autarquia não quer que "as pessoas adiem as suas compras”. "Vamos trabalhar para que o sistema seja mais prático e fácil, que é articular com todas as lojas de venda de bicicletas de Lisboa para não se ter de proceder a reembolsos", prometeu Medina.

Outra das medidas ainda abrangendo a mobilidade pelo meio do ciclismo é a criação de lugares de estacionamento para bicicletas, mencionado Medina que este aumento era há muito pedido devido aos receios do roubo de bicicletas. Vão então ser criados 1050 lugares de estacionamento fechado nos parques subterrâneos da EMEL e concessionados pela CML, somando -se ainda 1700 lugares nos principais interfaces de transporte público da cidade e outros 5000 lugares para "estacionamento em todas as entidades de interesse público que o solicitem, como escolas, clubes desportivos e outras instituições", segundo o documento distribuído pela CML.

O estacionamento, especificou o autarca, vai ser de uso gratuito.

As verbas destinadas tanto à criação de lugares de estacionamento como à comparticipação da compra de bicicletas estão estimadas em quatro milhões de euros, variando, no caso das bicicletas, consoante a "distribuição que haja em relação à compra de bicicletas convencionais ou elétricas”, disse Fernando Medina.

Rua Nova da Trindade e Largo dos Sapadores sem carros entre os 100 projetos para Lisboa

O outro grande eixo de intervenção que a Câmara Municipal de Lisboa vai assumir é o "A Rua é Sua", algo que, mencionou Fernando Medina, segue "a linha programática" que a autarquia já tinha assumido em projetos como o "Uma Praça em cada Bairro", de aumento da fruição do espaço público em detrimento da circulação e espaço automóvel.

Atendendo aquilo que era um plano da autarquia à atual necessidade de manter medidas de distanciamento durante a pandemia, a CML vai proceder a intervenções para aumentar o espaço de distância entre as pessoas e também os espaços de atendimento, criando "zonas de espera espera associadas a atividades básicas" como "retalho alimentar, restauração, equipamentos de saúde, farmácias, paragens de transportes públicos".

Estas medidas, segundo o plano da CML não se vão efetuar por agora com obras de cariz permanente, mas com o que a autarquia determina como sendo "urbanismo tático", feito ao delimitar-se espaços com intervenções de arte urbana, com espaços de sombra ou com o aumento das áreas de esplanada, podendo este ser feito "através da supressão de lugares de estacionamento e/ou de uma via de trânsito".

As formas de atingir este aumento do espaço pedonal, refere a autarquia, passam pela desobstrução e aumento de passeios,  supressão de vias de trânsito automóvel e colocação de obstáculos (como floreiras ou pilaretes) para impedir a circulação automóvel, sendo ainda medidas de segurança a implementar o alargamento das zonas onde o limite máximo de velocidade seja de 30 km/h ou a instalação de sinalética.

Entre os projetos que a CML tem para a cidade, destacam-se a supressão de trânsito na Rua Nova da Trindade, na Baixa, e no Largo dos Sapadores, na Penha de França, tornando-se ambos os espaços para uso exclusivamente pedonal. Para além disso, a Avenida da Igreja, em Alvalade, a Praça Norte, nos Olivais, e o Mercado de Arroios, deverão passar a ter o trânsito cortado aos fins-de-semana.

Entre outras medidas apresentadas, o troço entre o Largo da Trindade Coelho e a Calçada da Glória da Rua de São Pedro de Alcântara vai passar a ser de coexistência exclusiva entre transportes públicos e uso pedonal, e tanto a Avenida 5 de Outubro, nas Avenidas Novas, como um troço da Estrada da Luz, em São Domingos de Benfica, vão perder estacionamento e parte da via para se aumentar a área do passeio.

Ao todo serão 100 as intervenções a considerar para a cidade, tendo sido hoje apresentadas as 20 mais desenvolvidas até à data. De acordo com Fernando Medina, a CML vai "tentar acelerar ao máximo estas intervenções". Apesar do seu calendário "depender de vários fatores e do trabalho articulado com as juntas de freguesia”, o autarca prevê que “uma boa parte delas esteja já disponível no verão, época em que o tempo mais convida às pessoas estarem fora de casa”.

Todos estes projetos, mencionou o autarca, estão a ser feitos numa colaboração entre a CML e as juntas de freguesia, referindo ainda que as intervenções estarão de futuro disponíveis para consulta pública.

Trânsito na Baixa mantém-se por agora

Uma ausência notória no plano de medidas da autarquia foi o projeto da Zona de Emissões Reduzidas (ZER) Avenidas/Baixa-Chiado avançada no início do ano.

Esta previa que, a partir de julho, a trânsito automóvel na zona da Baixa-Chiado passasse a ser exclusivo para residentes, portadores de dístico e veículos autorizados, entre as 06:30 e as 00:00.

Questionado quanto à aplicação da ZER, Fernando Medina disse que ia "propôr à Câmara a recalendarização do seu desenvolvimento”, especificando que "a limitação da circulação automóvel, que estava prevista que ocorresse agora", vai ser "avaliada" para ocorrer "num momento posterior".

Apesar de considerar o ZER um "projeto da maior importância” e que "vai ser levado até ao fim”, Medina disse ser necessário "ter a noção que neste momento que vivemos, muitas lojas ainda não abriram, muitos trabalhadores ainda estão em casa, estão em lay-off, não sabem como vai ser a sua vida". “A última coisa que queremos ser é um fator de dificuldade e perturbação sobre uma vida que está muito alterada”, admitiu o autarca.

No entanto, outras componentes cruciais à ZER vão avançar, sejam as alterações urbanísticas acima mencionadas, seja a extensão da rede ciclável na Avenida da Liberdade, na Praça dos Restauradores, na Praça do Rossio e na Rua do Ouro", seja a abertura de concurso para adquirir "os meios e os recursos necessários à plena introdução da ZER, como os pórticos, os limitadores e outros os meios necessários à sua execução".

"Não há melhor exemplo do que é Lisboa Capital Verde a avançar do que estas duas iniciativas"

Questionado pelo SAPO24 quanto ao atual calendário de medidas e eventos do Lisboa Capital Verde 2020, entretanto afetado pela pandemia da covid-19, Fernando Medina disse que a " recalendarização de eventos que estavam agendados" vai ser apresentada em breve.

No entanto, o autarca optou também por destacar que tanto o plano "Lisboa Ciclável" como o "A Rua é Sua" são formas como a cidade está fazer jus ao título que recebeu pois "não há melhor exemplo do que é Lisboa Capital Verde a avançar do que estas duas iniciativas".

"Este foi um galardão que nós recebemos que sempre dissemos que só seríamos merecedores de o ganhar se fizéssemos algo com ele. Aquilo que hoje vos apresento é uma determinação muito clara deste executivo”, defendeu Fernando Medina, acrescentando que "se alguma lição a pandemia nos trouxe da Lisboa Capital Verde é acelerar e intensificar a nossa agenda verde", considerando ainda que o título "ganhou centralidade nas políticas urbanas”.