Chegar a Belém não foi fácil esta manhã. Se para muitos o percurso de metro mais comboio não revelava grandes dificuldades, quem optou por os autocarros teve outra sorte, já que rapidamente deixaram de poder percorrer a zona onde iria passar o Papa. Eram 9:00 da manhã quando o SAPO24 chegou a Belém e o trânsito já tinha parado de circular desde as 7:00.
Faz sentido, estava para chegar o Santo Padre e em frente do Palácio de Belém já se podia ver a multidão: adultos, crianças de grupos de catequese e com os pais, grupos de jovens de todas as nacionalidades e senhoras de idade que gritavam mais alto do que os mais novos "Papa, Papa!".
Pelo ar só se ouvia cânticos, gritos e bandeiras a abanar. Todos queriam marcar presença e ser ouvidos pelo Papa. "Esta é a juventude do Papa!", gritavam vários grupos nas suas diferentes línguas, outros rezavam e até houve tempo para cantar o hino nacional várias vezes. E mesmo quando a chuva caiu, nada abalava os peregrinos, que gritavam ainda mais forte pelo Santo Padre.
Após o avião com o Sumo Pontífice passar sobre Belém, escoltado pelos F16 da Força Aérea, foi a vez do próprio cumprimentar as pessoas que, de todos os cantos do Jardim Afonso de Albuquerque, lá estavam para o receber. Até no cimo do monumento, no meio do jardim, a estátua da figura que dá nome ao espaço estava de todas as cores, com peregrinos empoleirados para ver o carro do líder católico.
Alguns viram o Papa, outros certamente não, porque ao contrário do que se esperava o Papa não vinha no papamóvel, mas sim num automóvel normal, de onde acenava às pessoas. Alguns, apesar da desilusão de não conseguirem ver o Papa a 100%, conformaram-se, porque afinal de contas Francisco está a fazer a sua maior visita de sempre a Portugal e oportunidades para o ver não irão faltar durante a semana.
É importante realçar que, apesar da festa e da felicidade que marcou o primeiro dia desta visita do Papa, entre os que esperaram pelo líder da Igreja estavam também vozes em desacordo com as políticas ambientais, bem como algumas dezenas de manifestantes da Associação Sindical de Profissionais de Polícia ASPP/PSP (ASPP).
Foi junto ao Museu Nacional dos Coches que encontrámos uma britânica residente em Portugal há mais de seis anos. Emily Lancaster, acompanhada da filha, a pequena Sienna Lancaster, faziam um protesto climático contra o desperdício causado pela Jornada Mundial da Juventude (JMJ).
Emily usava um vestido feito de talões de papel (faturas e recibos) que armazenou durante 13 meses. Além disso, empunhava um cartaz onde se lia: "Our young people need a clean planet, not corruption" ("Os nossos jovens precisam de um planeta limpo e não corrupção"). Já Sienna não tinha nenhum fato especial, mas tinha uma mensagem para partilhar e um cartaz que dizia: "Temos de ajudar o planeta".
Em entrevista ao SAPO24, Emily destacou que "queria aproveitar o dia de hoje para sensibilizar as pessoas para a ideia de não gastar recursos a pedir recibos e faturas, que acabam por ir fora logo a seguir a serem impressos e, por isso, é necessário que se arranje outras opções de recibo".
"Em Portugal, existe a cultura em todos os negócios de se imprimir as faturas, e eu adorava ver um futuro próximo em que esta realidade não existisse, em que a lei era alterada, poder mandar-se por email e evitar este desperdício diário de papel", referiu.
"O ambientalismo também pode ser católico"
Acrescentou também que "estamos em 2023 e este evento gastou muito dinheiro, recursos que podiam ser gastos na inclusão social, problemas da cidade e não foi nada disso que aconteceu. Imaginem todo o plástico de uso singular usado aqui, todo o lixo, a relva estragada nos parques. Até as coisas marginais em que não pensamos estão a ser afetadas por estas pessoas em enchentes".
Deixa por fim uma mensagem ao Papa: "Hoje em dia devemos priorizar a inclusão social e a sensibilidade e é isso que devemos querer ver nos jovens, é o mais importante".
"O ambientalismo também pode ser católico e ontem havia imenso lixo no chão, jovens a beber cerveja, garrafas no chão... Por isso, o Papa deve saber disso e ser parte da solução", aponta também.
Siena também tinha algo a dizer ao Papa, e não nos deixou ir embora sem referir que, se pudesse falar com ele, dir-lhe-ia que "precisamos de cuidar do ambiente porque muita gente não está a pensar no planeta e só põe lixo no chão e nós devemos ajudar".
Despedindo-nos da mãe e filha, continuamos a seguir a rua em frente ao Palácio de Belém, onde milhares de peregrinos observavam o Papa Francisco e o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa. Encontrámos então uma manifestação da Polícia de Segurança Pública, mais precisamente do sindicato da Associação Sindical de Profissionais de Polícia ASPP/PSP (ASPP), que com milhares de colegas a proteger o Papa e a garantir a segurança de Lisboa por estes dias, não perderam a oportunidade para manifestar as suas reivindicações aos membros do governo presentes.
Segundo os representantes com quem falámos, o objetivo foi aproveitar a presença de imprensa internacional para chamar à atenção para o problema da polícia local.
De acordo com César Nogueira, Presidente da Associação dos Profissionais da Guarda e dirigente da ASPP: "O que procuramos aqui hoje é consideração, que é o que tem faltado da parte do governo e dos governos que já passaram. Os governos não consideram o trabalho das polícias, não temos um vencimento digno - apenas 890 euros em início de carreira - algo que é sobejamente pouco para aquilo que é a missão que fazemos".
"Em Portugal, já se sabe que a polícia sofre desconsideração. No mundo e na Europa ainda não"
Pede também que "já no próximo Orçamento de Estado haja alterações aos estatutos remuneratórios, ao subsistema de saúde, onde os polícias descontam 14 meses e só usufruem 12, além de ser injusto descontar 3,5%, algo que não há igual a nível nacional".
Foram à JMJ dezenas para que as pessoas saibam e vejam que o "governo anda a desconsiderar os profissionais", acrescenta, e diz que "cabe ao governo negociar de forma séria e não o que tem sido feito nos últimos meses, onde têm sido apresentadas propostas e apenas aceites as determinações do governo". "Isso não é negociar!", aponta.
"Este é um evento com visibilidade mundial. Em Portugal, já se sabe que a polícia sofre desconsideração. No mundo e na Europa ainda não, e é isso que estamos aqui a fazer. Portugal só é um país seguro graças à carolice dos profissionais e não graças ao que o governo tem dado aos profissionais", refere.
Olhando para o lado de lá das cancelas onde mais de mil polícias guardavam o Papa, César Nogueira afirma que sabe que tem o apoio dos colegas e que por vontade deles também viriam reivindicar.
Do lado oposto ao sindicalista, também falámos com o manifestante mais irritado, Duarte Almeida, que estava a manifestar-se em frente ao Papa porque diz saber que foi "mal tratado por sucessivos governos durante anos e chegámos ao cúmulo de, como os professores, vermos as carreiras congeladas e sem promoções".
Acrescenta que o Papa nem os viu, mas milhares de jovens passaram pela manifestação, além de jornalistas, e sublinha: "quem quer as festas devia pagá-las, não os portugueses que vivem num estado laico e isto não deve ser uma campanha eleitoral, porque a maioria dos políticos nem deve acreditar em Deus".
Após terminar a nossa entrevista, apontou para os colegas de manifestação: um grupo de vários professores que se deslocaram a Belém de propósito para apoiar a causa dos polícias. Nas suas palavras, os polícias sempre apoiaram as reivindicações dos professores, por isso eles também apoiam as dos polícias.
A meio da manhã lá começou tudo a dispersar, quando o Santo Padre partiu para o CCB. Nessa altura, já os 150 confessionários do Parque do Perdão funcionavam em pleno e decorria a Feira das Vocações, espalhada por pequenas ruas com os nomes das cidades onde aconteceram as jornadas anteriores e que coloriam todo o espaço da Cidade da Alegria.
Pelo resto do dia, muitos voltaram para os comboios cheios mas eficientes, que eram a única forma de sair de Belém. Outros optaram por ficar pelo recinto e aproveitar tudo o que havia nesta parte da Jornada. O Papa, esse, só voltaria ao final da tarde para uma missa à porta fechada nos Jerónimos. Até lá, muito havia a fazer porque, afinal de contas, a JMJ fica até domingo.
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