"O primeiro caso de COVID-19 no nosso país foi noticiado no dia 2 de março, o que nos deveria ter proporcionado uma margem de manobra superior à de outros Estados que foram confrontados com o surto mais cedo e em fases em que a informação sobre as medidas a tomar era mais incipiente. Infelizmente, é entendimento da Ordem dos Médicos, da Ordem dos Enfermeiros e da Ordem dos Farmacêuticos que o Governo, e o Ministério da Saúde em particular, não têm estado a acautelar medidas básicas e que podem comprometer todo o esforço de combate a este surto, de que é exemplo máximo a escassez de equipamentos de proteção individual". É desta forma que começa a carta assinada por Miguel Guimarães, bastonário da Ordem dos Médicos, Ana Paula Martins, bastonária da Ordem dos Farmacêuticos, e Ana Rita Cavaco, bastonária da Ordem dos Enfermeiros, dirigida a o primeiro-ministro.

Ao longo do documento é explícita a crítica das Ordens profissionais de Saúde perante os "milhares de relatos de situações muito difíceis" que os profissionais de saúde estão a enfrentar no terreno "sem estar devidamente acautelada a proteção das suas próprias vidas, dos seus familiares e dos seus doentes".

Segundo o texto, "a falta de equipamentos de proteção individual está a contribuir para que entre o número de infetados, ou de pessoas colocadas em quarentena por contacto com caso positivo, estejam muitos profissionais de saúde". Os bastonários colocam mesmo o cenário de, no pico da pandemia, não estarem à disposição "nos nossos hospitais e centros de saúde um número profissionais de saúde suficiente, em virtude de terem adoecido". "Neste momento são várias as falhas de segurança, faltando desde máscaras, a luvas, fatos de proteção e desinfetantes alcoólicos, o que é extensível à rede de farmácias", sublinham.

Preocupados com abordagem "conservadora" aos testes

Como exemplo do que pode vir a suceder, caso não sejam acauteladas as medidas necessárias, a carta recorre aos números do país vizinho que conta com mais de 5400 profissionais de saúde infetados com Covid-19 o que corresponde a um total de 12% das infeções em Espanha.

"A Orientação 013/2020, publicada pela Direção-Geral da Saúde no passado dia 21 de março, mesmo nos casos de alto risco de exposição, apenas prevê uma vigilância ativa do profissional, e, só perante febre ou sintomas respiratórios compatíveis com COVID-19, serão iniciados os procedimentos de caso suspeito, como a realização de exames laboratoriais", pode ler-se na carta. Segundo os bastonários, "esta aplicação conservadora dos testes, tanto nos profissionais como nos casos suspeitos entre cidadãos, vai em sentido contrário ao que se tem feito em países que têm publicado alguns artigos com os bons resultados no controlo do surto através desta metodologia, como Islândia, Alemanha, algumas zonas de Itália ou Coreia do Sul".

"Vivemos tempos extraordinários, em que todos temos de tomar decisões com base em muito pouca informação, mas temos já uma certeza: antecipar, proteger e testar

As Ordens relembram que segundo as informações conhecidas até ao momento, "de que a infeção pode ser assintomática em muitos dos cidadãos", reforçam "a importância de testar mais pessoas na fase de mitigação em que nos encontramos".

"Vivemos tempos extraordinários, em que todos temos de tomar decisões com base em muito pouca informação, mas temos já uma certeza: antecipar, proteger e testar são três metodologias sem as quais nunca poderemos obter os melhores resultados para Portugal e para os portugueses.  Continuaremos a dar todo o apoio e colaboração à Autoridade Nacional de Saúde e ao Governo, como tem acontecido desde a primeira hora. E, acima de tudo, continuaremos empenhados em servir Portugal, tratando e salvando a vida dos portugueses, garantindo o capital humano necessário para que possamos desempenhar a nossa missão com os melhores resultados possíveis", lê-se nos últimos parágrafos do texto.

Em Portugal, a Direção-Geral da Saúde registou na quarta-feira 43 mortos e 2.995 infeções confirmadas.

Dada a evolução da pandemia, a 17 de março o Governo declarou o estado de calamidade pública em Ovar, concelho de 148 quilómetros quadrados com cerca de 55.400 habitantes.

Desde as 00:00 do dia 19, o país encontra-se em estado de emergência, em vigor até às 23:59 de 02 de abril.

O novo coronavírus, responsável pela pandemia da covid-19, já infetou perto de 450 mil pessoas em todo o mundo, das quais morreram mais de 20.000.

Depois de surgir na China, em dezembro, o surto espalhou-se por todo o mundo, o que levou a Organização Mundial da Saúde (OMS) a declarar uma situação de pandemia.

O continente europeu, com cerca de 240.000 infetados, é aquele onde está a surgir atualmente o maior número de casos, e a Itália é o país do mundo com mais vítimas mortais, com 7.503 mortos em 74.386 casos registados até hoje.

Vários países adotaram medidas excecionais, incluindo o regime de quarentena e o encerramento de fronteiras.