A Embaixada da Rússia em Portugal publicou na semana passada, no seu ‘site’, um “comentário”, motivado pelas “declarações inaceitáveis do cantor Pedro Abrunhosa”, no dia 02 de julho, num concerto em Águeda.
Para músicos e bandas como Carolina Deslandes, Irma, Agir, Jimmy P, Karetus, Cati Freitas, Diogo Clemente, Dama, Perfume e Rita Rocha, numa publicação partilhada por todos na rede social Instagram, “este comunicado confere uma ameaça inaceitável num país democrático como Portugal”.
O “comentário” da embaixada levou a uma tomada de posição do Governo português, pedida por Pedro Abrunhosa e a agência que o representa, a Sons em Trânsito. O Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE) repudiou o “tom e conteúdo” do comunicado da embaixada russa e defendeu a liberdade de expressão como “inalienável”.
Segundo fonte oficial do MNE, em declarações à Lusa, “foi transmitida à embaixada da Federação Russa, através dos canais diplomáticos, o repúdio pelo tom e conteúdo do comunicado da embaixada relativo ao concerto do músico Pedro Abrunhosa”.
“Tal como o MNE, também nós, artistas, músicos, cidadãos, temos que demonstrar a nossa indignação e estar solidários com o Pedro. Não foi só o artista Pedro Abrunhosa a ser intimidado, foi toda a classe artística nacional. Muitos foram aqueles que no passado lutaram para que vivêssemos em liberdade. Jamais a nossa integridade física pode ser ameaçada por, como diz o Pedro, combatermos bombas com palavras”, lê-se na publicação partilhada por vários músicos e bandas no Instagram.
Todos defendem que “nem a Europa, nem Portugal se podem tornar a barbárie”.
“A intimidação não nos calará, pois no dia em que o medo nos cale a voz, viveremos na escuridão”, afirmam.
Durante o concerto em Águeda, Pedro Abrunhosa falou sobre a guerra na Ucrânia, antes de começar a cantar o tema “Talvez Foder”, no qual aborda questões como a guerra, a fome e o fascismo.
“Não podemos, nem vamos esquecer, que a Europa vive uma guerra. E a guerra mais estúpida de todas, uma guerra perfeitamente evitável, uma guerra de ódios, uma guerra em que famílias como as nossas todos os dias têm que fugir”, afirmou na altura.
O músico lembrou que também “há quem não fuja, e numa ilha da Ucrânia um marinheiro respondeu a um apelo de um barco russo dizendo: ‘Barco russo, go fuck yourself’, que é como quem diz ‘russian boat …’, que é como quem diz ‘Vladimir Putin, go fuck yourself’”.
“Este grito hoje tem que se ouvir em Moscovo e em Kiev”, disse.
A representação russa deu conta que “tem recebido cartas dos compatriotas russos zangados que afirmam estar chocados pelo comportamento dum dos famosos cantores portugueses Pedro Abrunhosa”, que, durante o concerto “se permitiu dizer várias coisas grosseiras e inaceitáveis sobre os cidadãos da Federação da Rússia, bem como os seus mais altos dirigentes”.
A embaixada russa fez saber que as palavras do músico português, “indignas do homem de cultura que ainda por cima representa o país, que está a se manifestar abertamente contra qualquer tipo de ódio e discriminação, foram ouvidas” e que “as respetivas conclusões serão tiradas”.
Pedro Abrunhosa e a Sons em Trânsito consideraram que a embaixada quis dizer que a voz do artista “se ouviu nos corredores do poder russo e que as autoridades daquele país ficarão atentas às atividades do músico”.
Para a embaixada, os “gritos vergonhosos” de Pedro Abrunhosa “enquadram-se em mais de que um artigo da legislação penal portuguesa" e que informaram "os órgãos competentes de aplicação da lei”.
“A Embaixada da Rússia continua a vigiar os interesses dos cidadãos russos residentes em Portugal, e nenhumas provocações ignóbeis contra eles ficarão sem resposta”, conclui.
Entretanto, na segunda-feira, o grupo parlamentar da Iniciativa Liberal propôs que o Parlamento manifeste um “protesto veemente” contra o comunicado da embaixada, considerando que se trata de “um atentado inaceitável à liberdade de expressão”.
Houve também outros músicos a demonstrarem publicamente apoio a Pedro Abrunhosa, como José Cid, Paulo Bragança, David Fonseca, James dos Reis ou Rita Redshoes, além do presidente da Câmara Municipal do Porto, Rui Moreira, a apresentadora de televisão Catarina Furtado, o radialista Pedro Ribeiro e o ‘chef’ Hélio Loureiro.
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