O relatório sobre "o complexo de incêndios de Pedrogão Grande e concelhos limítrofes", iniciado a 17 de junho último, realizado pelo Centro de Estudos sobre Incêndios Florestais, coordenado por Domingos Xavier Viegas e hoje entregue à ministra da Administração Interna, contabiliza 65 mortos e mais de 200 feridos naquela tragédia, um dos "mais graves ocorridos" em Portugal e um dos "piores da Europa".
O documento, que versa sobre as várias ocorrências na zona, indica que o incêndio mais grave resultou das ignições de Escalos Fundeiros e de Regadas, observando que esta última foi "menosprezada, tendo até à junção com o incêndio de Escalos Fundeiros, apenas um meio pesado de combate terrestre dedicado".
O relatório, que aborda a forma como uma trovoada seca afetou o incêndio, conclui que a falta de meios de socorro junto das casas, a falta de energia elétrica, de água e de comunicações, gerou uma fuga de pessoas que "procuravam ir para locais seguros, mas a grande escala deste fenómeno, tornou os locais seguros muito distantes e o fogo interrompeu o trajeto que essas pessoas seguiam".
"A progressão muito rápida do incêndio colheu várias pessoas de surpresa nas mais variadas direções para que tentaram fugir, lê-se no relatório que foi hoje divulgado no portal do Governo.
O documento aponta que a falta de limpeza da envolvente das estradas permitiu que muitas pessoas fossem colhidas em plena fuga, pelo fumo e pela radiação do incêndio, pelas chamas da vegetação em redor e mesmo por árvores caídas na própria estrada.
"A quase totalidade das vítimas morreu quando tentava fugir de carro pela estrada e, apenas num troço de 400 metros da EN-236-1, perderam a vida 30 pessoas", sublinha o relatório.
Da análise realizada resultou ainda a conclusão que "apenas quatro das 65 vítimas mortais deste incêndio perderam a vida dentro de casa", em situações que ainda estão em investigação, sendo contudo certo que "todas elas tinham algum problema de mobilidade ou de saúde".
"Verificou-se que para a larga maioria das vítimas e mesmo para outras pessoas que sobreviveram à exposição do fogo enquanto fugiam, a permanência em casa teria sido a opção mais segura", enfatiza o documento.
O relatório nota ainda que o sistema de comunicações por rádio e telefone teve uma falha geral em toda a região, por limitações inerentes aos sistemas, por sobrecarga de utilizadores ou ainda deficiente utilização de alguns dos sistemas.
Outra conclusão importante indica que a prestação de apoio psicológico e socorro médico e hospitalar teve "deficiências que importa estudar melhor", sendo evidente que a situação do país na prestação de socorro a doentes queimados graves é "ainda insuficiente para acidentes desta escala".
Outro aspeto que resulta das conclusões é o facto de que os municípios de Pedrogão Grande e de Castanheira de Pera não dispunham de Plano Municipal de Defesa da Floresta Contra Incêndios (PMDFCI) validados pelo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).
"Este facto inibiu estas entidades de receberem financiamento durante os últimos anos para promoverem ações de prevenção, com manifesto prejuízo destas", conclui o relatório, que avança com diversas recomendações, uma delas manifestando reservas quanto "às evacuações compulsivas generalizadas".
O relatório recomenda um "grande cuidado na seleção dos quadros de Comando da estrutura da Autoridade Nacional da Proteção Civil (ANPC) e dos bombeiros" e defende que o ICNF deverá "ter uma presença maior e uma participação mais efetiva na gestão do problema dos incêndios florestais".
No campo da prestação de socorro médico em catástrofes como esta, o relatório vinca que "há que melhorar muito a organização de um serviço de busca e salvamento, para prestar socorro e apoio sanitário, em todo o território afetado".
Entre outras recomendações está a de que seja criado um Programa Nacional de Gestão de Incêndios Florestais, que envolva e congregue as entidades mais diversas da sociedade civil e do Estado.
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