Estas posições de Porfírio Silva, membro do Secretariado Nacional do PS que defende que o espaço político do seu partido se deve fazer representar nas eleições presidenciais de 2021, constam de uma “carta aberta” que dirigiu a Ana Gomes e que publicou na quinta-feira à noite no seu blogue “Machina Speculatrix”.
Neste texto, Porfírio Silva, também vice-presidente da bancada socialista, volta a criticar uma estratégia no sentido de o PS “declaradamente ou por não se posicionar” apoiar a eventual recandidatura presidencial de Marcelo Rebelo de Sousa e diz acreditar que a candidatura de Ana Gomes “pode ter um papel positivo” na representação do socialismo democrático nesse ato eleitoral.
“Só que, para isso, não podemos enganar-nos de adversários, nem enganar-nos de causas. Nem ceder ao facilitismo de saltar por cima do Estado de direito, barreira contra a incivilidade”, adverte, contudo, Porfírio Silva.
O membro do Secretariado Nacional do PS justifica depois à ex-eurodeputada o que o leva a traçar aquelas duas linhas vermelhas.
“Tudo isto me interessa, como socialista, pelas simples razão de não tencionar votar em qualquer candidato da direita – poderia fazê-lo se fosse necessário para travar um candidato neofascista, mas não creio que estejamos nessa contingência – e de não querer votar em candidatos que se apresentam contra o projeto europeu”, diz, aqui numa alusão às candidaturas do comunista João Ferreira e da bloquista Marisa Matias.
Na perspetiva do dirigente socialista, “Ana Gomes aparece, aos olhos de alguns, como uma candidata da esquerda do PS”.
“Mas não vejo que a sua candidatura possa ser aglutinadora se persistir numa tónica muito presente nestes primeiros dias da sua condição de candidata, que consiste em falar como se tivesse vindo principalmente para atacar o líder do PS e atual primeiro-ministro. Alguns apareceram publicamente a apoiá-la com a justificação de ser necessário fazer frente a António Costa”, refere.
Também de acordo com Porfírio Silva, entre os que manifestaram apoio à candidatura presidencial da ex-eurodeputada socialista, “até houve quem acrescentasse que o problema de Marcelo Rebelo de Sousa é ser demasiado próximo de António Costa, esperando que Ana Gomes corrigisse isso”.
“Ainda estou para perceber se isso corresponde ao que idealizava Francisco Assis quando lançou a sua candidatura”, interroga-se nesta parte da carta aberta que dirigiu a Ana Gomes, antes de deixar um aviso.
“Espero que não se repita a tentação das últimas presidenciais [de 2016], quando alguns no PS viram a candidatura de Maria de Belém como uma oportunidade para atacar o PS e a sua direção, tentando manipular uma eleição presidencial para um mesquinho ajuste de contas intrapartidário (o que, finalmente, só prejudicou a própria candidata). Seria conveniente que se tornasse claro que a Ana Gomes não cai em armadilha semelhante”, salienta o membro da direção do PS.
Nesta carta, Porfírio Silva rejeita a acusação de que António Costa tenha mandado calar o PS em matéria de eleições presidenciais”.
“Uma coisa é solicitar aos membros do Governo que não confundam as suas funções com o debate pré-eleitoral; outra, bem diferente, seria solicitar aos socialistas que não se envolvam no debate, o que não aconteceu. Aliás, este debate já começou nos órgãos do PS, os quais, certamente, serão chamados a decidir oportuna e atempadamente sobre esta matéria importante para a nossa democracia”, argumenta, antes de se pronunciar sobre os perigos do populismo à direita, mas também no espaço da esquerda.
“A sua candidatura pode dar um contributo relevante para o próximo processo eleitoral presidencial, à esquerda, embora eu preferisse poder votar numa ou num candidato do socialismo democrático que apostasse mais claramente no reforço da democracia representativa, participativa e deliberativa, sem atropelamentos ao Estado de direito e sem cedências aos falsos moralismos dos puros contra os impuros”, aponta.
Porfírio Silva reconhece depois que a presença de Ana Gomes no espaço público “tem bandeiras, bandeiras relevantes como a dos direitos humanos”.
“Mas precisamos conhecer melhor como traduz, para estes tempos, uma mensagem renovada do socialismo democrático aos portugueses. Coisa que, em minha opinião, não resulta daquilo que conhecemos da sua intervenção pública. Politicamente, as presidenciais não podem ser apenas um choque de paixões. Têm de ser um espaço de renovação da esquerda democrática. Poderá querer fazer isso tomando como alvo o partido que é a grande força do espaço político de que se reivindica?” questiona o vice-presidente da bancada socialista.
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