“Precisamos de todos os olhos e ouvidos atentos no máximo de locais possíveis para conseguir ter o máximo de informação sobre a espécie”, afirmou hoje à agência Lusa Inês Roque, investigadora na Universidade de Évora e voluntária na Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA), entidades promotoras do censo nacional.
O objetivo é conhecer a distribuição e a abundância da coruja-das-torres, cuja população tem diminuído em Portugal.
Esta ave noturna vive próxima das pessoas e muitas vezes nidifica em edifícios, pelo que os promotores desafiam a comunidade a participar no censo e, entre hoje e domingo, realiza-se o segundo “Fim de semana das coruja-das-torres”, no qual se convidam voluntários de todo o país a permanecerem pelo menos 10 minutos na rua, depois de escurecer, e a reportar as corujas-das-torres que tenham visto ou ouvido.
No entanto, a qualquer momento podem ser reportados contactos auditivos ou avistamentos da ave e de ninhos.
A investigadora disse que as escolas estão também a ser envolvidas na iniciativa, estando, até ao momento, 1.621 alunos inscritos em 40 escolas de 29 concelhos, de Braga a Vila do Bispo (Algarve). Foram também realizadas ações presenciais com mais de 500 alunos.
“Toda a gente, independentemente do nível experiência, pode participar”, afirmou Inês Roque.
Os primeiros resultados recolhidos neste censo poderão ser divulgados durante o mês de abril.
Apesar de estar presente de Norte a Sul do país, a população da coruja-das-torres tem vindo a decrescer e são várias as ameaças que a espécie enfrenta: os atropelamentos, a alteração e destruição dos habitats, o aumento da agricultura extensiva, a bioacumulação de alguns pesticidas no seu tecido adiposo, a pilhagem aos ninhos e ainda a “imagem negativa” pela sua associação à morte.
A coruja-das-torres é uma ave de rapina noturna de tamanho médio (cerca de 35 centímetros de comprimento), com plumagem branca na face em forma de coração e plumagem dorsal de cor cinzenta e alaranjada. Quando vista em voo, à noite, pode assemelhar-se a um vulto branco e pode ser identificada pelo som que, nos adultos em voo, é estridente e “arranhado”, assemelhando-se ao de uma roldana perra.
No sábado, em Tarouca, distrito de Viseu, vai ser apresentado o projeto “Colocação de caixas-ninho no mosteiro”.
O mosteiro é o de Santa Maria de Salzedas onde foram instaladas três caixas-ninho com o objetivo de estimular o regresso das corujas ao edifício e “repor o equilíbrio ambiental e ecológico”.
Trata-se de uma iniciativa da Direção Regional de Cultura do Norte (DRCN), em colaboração com a Junta de Freguesia de Salzedas.
Em comunicado, a DRCN disse que a presença das corujas-das-torres no Mosteiro de Salzedas “não é uma novidade”, mas que a espécie parece ter “abandonado” o edifício histórico há alguns anos.
Agora, acrescentou, a expectativa é repor a população de corujas neste habitat, já que a sua presença é dissuasora dos pombos, considerados uma das maiores ameaças para o património edificado.
A investigar a coruja-das-torres desde 2006, a Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), em Vila Real, já recolheu 6.500 regurgitações desta ave, de onde retirou cerca de 23.000 presas.
“Ao analisarmos em laboratório as regurgitações conseguimos perceber que espécie de ratos é que nos temos naquela região. É uma metodologia morosa no laboratório, mas em termos de resultados é bastante enriquecedora porque traz muita informação sobre a presença das espécies de pequenos mamíferos”, afirmou à Lusa Hélia Gonçalves, investigadora do Laboratório de Ecologia Fluvial e Terrestre do Centro de Investigação e Tecnologias Agroambientais e Biológicas da UTAD.
A ave noturna é considerada parceira na investigação e foi também uma fonte de informação para a construção do novo Livro Vermelho dos Mamíferos de Portugal Continental, que deverá ser lançado em abril e que contou com a colaboração da UTAD.
Hélia Gonçalves explicou que a coruja-das-torres se alimenta essencialmente de ratos, mas pode também apanhar pássaros ou morcegos. Engole a presa inteira, absorve os tecidos moles e as estruturas ósseas, penas ou pelo ficam numa cavidade do sistema digestivo do predador que depois é regurgitado.
“O máximo que eu identifiquei até agora numa regurgitação foram 10 ratos”, apontou a investigadora, que referiu que o número médio de presas encontrado é quatro.
Mas, os estudos à coruja-das-torres, nomeadamente às suas penas, ajudam também a monitorizar contaminantes ambientais (mercúrio e pesticidas).
“Esta coruja caça onde nós produzimos os nossos alimentos. É uma excelente candidata a bioindicador de contaminação de fonte agrícola”, afirmou, por sua vez, Inês Roque.
A investigadora da Universidade de Évora disse que anualmente é feita a monitorização de ninhos, a qual arranca em abril na Companhia das Lezírias, o acompanhamento do desenvolvimento de juvenis e a anilhagem científica.
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