O caso teve início quando Rahaf Mohammed al-Qunun, jovem saudita de 18, viu negada a entrada na Tailândia, onde tentou fazer escada para seguir viagem para a Austrália, país para o qual tem um visto turístico de três meses e onde disse procurar asilo.
Para evitar ser detida, a jovem barricou-se no seu quarto num hotel na zona de trânsito do aeroporto de Banguecoque para impedir que os agentes da imigração tailandesa a colocassem num avião para o Kuwait, de forma a ser devolvida à sua família e transportada para a Arábia Saudita.
"Peço a todas as pessoas que se encontram em trânsito em Banguecoque que se manifestem contra a minha expulsão", escreveu Rahaf Mohammed al-Qunun na sua conta no Twitter.
Num vídeo publicado na mesma rede social, a jovem mostra como se entrincheirou com a ajuda de uma mesa colocada contra a porta do seu quarto de hotel no aeroporto. Rahaf disse que seria expulsa esta segunda-feira, e que teme ser presa no seu país.
"Tenho 100% de certeza de que eles me vão matar no momento em que deixar a prisão saudita", declarou à AFP, prometendo que não sairia do seu quarto enquanto não fosse recebida por representantes do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Ancur).
O encontro deu-se ainda hoje, tendo a imigração tailandesa publicado fotos da sua partida. Numa conferência de imprensa, Surachate Hakparn, chefe do gabinete de imigração, informou que a jovem "deixou o aeroporto com o Acnur, e que definirá o seu caso entre cinco a sete dias". "Se ela não quiser partir, não será reenviada contra a sua vontade", assegurou pouco antes à imprensa, reforçando que "se deportá-la resultasse na sua morte, nós definitivamente não quereríamos isso."
No entanto, uma petição já foi lançada no site Change.org para defender a causa da jovem saudita.
O incidente assume uma dimensão especial após o recente assassinato do jornalista Jamal Khashoggi no consulado saudita na Turquia.
Violência física e psicológica
Pouco antes desta situação se desenrolar, um tribunal criminal em Banguecoque tinha rejeitado um recurso apresentado por Nadthasiri Bergman, uma advogada de direitos humanos para impedir a expulsão de Rahaf.
O recurso baseou-se no facto de Rahaf Mohammed al-Qunun afirmar ter sofrido violências físicas e psicológicas por parte de sua família e que, temendo pela sua vida se voltar para a Arábia Saudita, terá pedido ajuda a vários países europeus, aos EUA, ao Canadá e à Austrália.
Rahaf explicou que foi presa por oficiais sauditas e kuwaitianos na chegada ao aeroporto de Banguecoque depois de fugir da família enquanto estavam a visitar o Kuwait, acrescentando que o seu passaporte foi confiscado à força, algo que foi corroborado pela ONG Human Rights Watch (HRW). Contudo, a embaixada saudita negou que os seus representantes estivessem presentes no terminal do aeroporto tailandês, acrescentando no Twitter "estar em contato constante com a família da jovem".
A jovem saudita, de 18 anos, acusa a família de tê-la trancado num quarto durante seis meses, simplesmente porque ela cortou o cabelo. O serviço de imigração tailandês explica, por sua vez, que ela estava a tentar escapar de um casamento de conveniência.
Uma amiga da jovem, residente na Austrália depois de abandonar a Arábia Saudita, terá dito ao jornal britânico Guardian que Rahaf "é uma ex-muçulmana e tem uma família muito estrita" que está a sujeitá-la "a violência e a assédio sexual", acrescentando que terá "recebido uma ameaça do seu primo" que quer "ver o sangue dela, quer matá-la" devido à sua renúncia.
Em abril de 2017, o destino de outra saudita, Dina Ali Lasloum, de 24 anos, detida enquanto viajava pelas Filipinas em direção a Sydney, despertou a preocupação da HRW. A jovem queria fugir de um casamento forçado, de acordo com a organização.
A embaixada da Arábia Saudita em Manila apresentou o incidente como um caso de família e disse que a menina "voltou com a família para o seu país".
Na Arábia Saudita, as mulheres estão sujeitas a inúmeras restrições, sendo forçadas a ficar sob a tutela de um homem (pai, marido, ou outro, dependendo do caso) que exerce autoridade arbitrária sobre elas e toma decisões importantes no seu lugar.
Uma mulher julgada como tendo cometido um crime "moral" pode ser violentamente punida pela sua família, incluindo a sua execução no caso dos chamados "crimes de honra".
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