“Um desastre”, “um erro catastrófico”, “uma desilusão”. É assim que tem sido descrita a entrevista ao príncipe Andrew, emitida este sábado no programa “Newsnight”, da BBC, televisão pública do Reino Unido.
A entrevista chegou depois de vários meses de associação do príncipe ao magnata norte-americano Jeffrey Epstein, que se suicidou na cela em agosto deste ano enquanto aguardava julgamento por acusação de crimes sexuais.
Virginia Giuffre, uma das pessoas que acusam Epstein, afirma ter sido forçada, quando era menor de idade, a ter relações sexuais com o príncipe Andrew, enquanto Epstein a mantinha como “escrava sexual”, recorda a Reuters.
No final de agosto, Andrew, o segundo filho da rainha Isabel II, tinha defendido a sua amizade com Epstein e afirmado que queria "esclarecer os factos para evitar novas especulações”.
As declarações de Andrew na entrevista deste fim de semana - não autorizada pela rainha -, naquela que foi a primeira vez que falou publicamente sobre a sua relação com Epstein, foram errantes nalguns momentos e originaram muitas críticas.
“Uma desilusão” e “demasiadas pontas soltas”: As ondas de choque da entrevista
Mark Stephens, que representou James Hewitt depois do seu alegado caso com a princesa Diana, afirmou, citado pelo The Guardian: “Esta estratégia [de conceder uma entrevista] só funciona se tiveres uma boa resposta para toda e qualquer questão. E aqui há demasiadas pontas soltas”.
“Se o príncipe se tivesse mantido em silêncio, teria sido capaz de se manter fora do caso. Agora, abdicou dessa privacidade”.
Um outro advogado de topo no Reino Unido descreveu a entrevista como “um erro catastrófico”.
Um ex-funcionário do gabinete de imprensa do Palácio de Buckingham, Dickie Arbiter, disse à BBC que “qualquer pessoa com sensibilidade no mundo das relações públicas terá atirado as mãos à cabeça”. Esta entrevista “não foi um simples desastre, foi todo um acidente em cadeia”.
Os advogados que representam algumas das vítimas do multimilionário norte-americano classificam as declarações de Andrew como implausíveis e sugerem que o príncipe responda perante o FBI.
“A ação certa e honrosa que o príncipe Andrew devia tomar agora era voluntariar-se a ser inquirido pelo FBI e pelos procuradores” que continuam a investigar o caso Epstein, disse ao The Guardian Gloria Allred, uma das advogadas das vítimas.
Outra das críticas que têm chegado é o facto de o príncipe ter “ignorado por completo” as vítimas.
“A parte mais importante disto tudo são as vítimas e muito pouco foi dito sobre elas na entrevista”, disse Gloria Allred ao jornal britânico, acrescentando que “o príncipe decidiu submeter-se ao julgamento da opinião pública com esta entrevista e as pessoas podem decidir se acreditam nele ou não”.
Uma outra advogada das vítimas que acusam Epstein, Lisa Bloom, também considera que a entrevista foi “uma profunda desilusão” e disse ao The Guardian que as declarações do príncipe foram insuficientes para esclarecer a sua relação com o norte-americano: “Ele tem o direito de negar as alegações e de se defender, mas onde está a o pedido de desculpas por ter uma ligação tão próxima a um dos pedófilos mais prolíficos da história?”.
Além das críticas, também as entidades que estão associadas, de alguma forma, ao príncipe Andrew, têm sido desafiadas a repensar essa ligação. “Qualquer organização apoiada por Andrew devia pelo menos rever o seu envolvimento”, disse ao The Guardian Catherine Mayer, uma biógrafa da casa real que é também presidente e co-fundadora do Partido da Igualdade das Mulheres (Women’s Equality Party).
Marcas como Barclays e KPMG fazem parte dos parceiros do Pitch@Palace, uma iniciativa do príncipe para ligar empreendedores a pessoas que ajudem a alavancar os negócios.
O que disse, afinal, o príncipe para gerar tantas críticas?
Andrew admitiu que o comportamento de Epstein foi “impróprio”, mas disse que não lamenta a sua amizade com o multimilionário pelos contactos que lhe deu no mundo dos negócios.
"As pessoas que conheci e as oportunidades que me foram dadas, quer por ele quer através dele, foram realmente muito úteis”, disse o príncipe na entrevista.
Quando questionado sobre o seu envolvimento com Virginia Giuffre, Andrew negou qualquer possibilidade de isso ter acontecido.
“Posso dizer categoricamente, absolutamente que nunca aconteceu. Não tenho memória de ter alguma vez ter conhecido esta senhora”, afirmou Andrew.
“Se és um homem, ter sexo com alguém é algo que vês como positivo. Por isso, se tentares esquecê-lo é difícil. É dificil não te lembrares de nada quando é algo positivo”, tentou explicar na entrevista.
O príncipe apresentou justificações para contrariar as alegações que são feitas pela mulher. Uma delas é o facto de na altura sofrer de um problema de saúde que o impedia de suar, pelo que não podem ser verdade as afirmações de que estaria transpirado enquanto dançava com a jovem [à época] numa discoteca em Londres.
O príncipe garantiu ainda que, na noite em que é dito que terá conhecido a jovem, estava num programa familiar, depois de ter ido a uma festa de crianças numa pizzaria com a sua filha.
Andrew disse também não se lembrar de ter tirado uma fotografia com Virginia Giuffre, apesar de haver uma imagem a circular em que os dois aparecem juntos.
Giuffre afirma que os dois estiveram numa festa numa discoteca em Londres, em 2001, antes de terem ido para a casa de Ghislaine Maxwell (uma milionária socialite britânica que tem sido associada a Epstein), onde terão tido relações sexuais.
Andrew insistiu que não teve sexo com mulheres da rede organizada por Epstein em nenhuma das suas propriedades, mas confirmou que voou no jato do multimilionário, que esteve na sua ilha privada e que ficou na sua casa de Palm Beach (Flórida) e na mansão em Nova Iorque.
O príncipe disse que o motivo para não se lembrar de ver raparigas jovens em casa de Epstein é o facto de, como membro da família real, estar habituado a ter “elementos do staff a circular a todo momento”, e por isso não interagir com ninguém que considerava ser do staff.
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