Valls, ex-primeiro-ministro de 54 anos, e Hamon, ex-ministro da Educação, de 49 anos, sonham em mudar a esquerda francesa. Mas, por trás das palavras, há dois projetos. Um, da ala direitista do Partido Socialista Francês (PSF), o outro, da esquerda.
Estandarte de um programa inovador "totalmente à esquerda", Benoît Hamon liderou a primeira volta das primárias organizadas pelo Partido Socialista e disputadas a 22 de janeiro, superando aquele que dirigiu a guinada liberal do quinquénio do presidente François Hollande.
Para se impor, Valls não hesitou em multiplicar os ataques. Este barcelonês que se naturalizou francês aos 20 anos lançou sua candidatura em novembro, apresentando-a como uma "proposta de revolta" face à derrota anunciada do seu campo político nas presidenciais de abril (o partido socialista francês sai bastante enfraquecido do mandato de François Hollande, um presidente em quebra acentuada de popularidade, que deixa França com um desemprego endémico e com um agravamento forte das medidas de segurança na sequência de uma vaga de atentados terroristas sem precedentes).
No domingo passado, Valls ficou em segundo lugar, mas contra-atacou afirmando ser "um combatente". "Lutarei até o fim", garantiu aos seus seguidores. O ex-primeiro-ministro diz que não quer "abandonar os franceses diante da extrema-direita - que destruiria o país - ou da direita (...), nem diante dos Estados Unidos de Donald Trump, ou da Rússia de Vladimir Putin".
O seu rival, que não se considera um "homem providencial", faz pouco do tom marcial do adversário, comparável para muitos ao do ex-presidente de direita Nicolas Sarkozy. "Defenderei com simplicidade e sobriedade o meu projeto porque é global, coerente e não se resume em dizer apenas: 'porque fui primeiro-ministro, serei um bom presidente’”, diz Hamon.
O antigo primeiro-ministro Manuel Valls obteve 31,48% dos votos na primeira volta da esquerda francesa, no passado domingo, a pouco menos do que cinco pontos percentuais de Benoît Hamon (que venceu, com 36,03%). Arnaud Montebourg ficou na terceira posição (com 17,52%), pelo que os seus votantes (consoante se mobilizem para votar Valls ou Hamon) poderão decidir a contenda. A primeira volta da esquerda teve uma participação medíocre: 1,65 milhões de votantes, quando as primárias da direita, em novembro, aliciaram mais de 4 milhões de votantes.
Tanto Hamon como Valls estão mal posicionados nas intenções de voto: muito atrás da candidata da extrema-direita, Marine Le Pen, atrás do conservador François Fillon, mas também do ex-ministro de esquerda (entretanto reposicionado ao centro) Emmanuel Macron e do candidato da esquerda radical Jean-Luc Mélenchon.
Caminhos distintos
Hamon, a quem os socialistas chamam de "pequeno Ben", esgotou as salas nos seus comícios com um público jovem, favorável à globalização, que procura "outra política" ou de um "verdadeiro socialismo".
Este licenciado em história, que se uniu às fileiras socialistas muito jovem, planeia criar um subsídio básico para todos os franceses sem condições, quer diminuir a jornada de trabalho para 32 horas semanais e é favorável à legalização da canábis.
Valls, por sua vez, não esgota as salas. Precisou de cancelar comícios à última hora por causa de cadeiras vazias ou incidentes. Em Estrasburgo, foi atacado com farinha. Em Lamballe, foi atacado por um jovem.
Dentro do partido socialista, a carreira política destes homens, ambos de aspeto juvenil, começou praticamente ao mesmo tempo, em meados dos anos 80, antes de tomarem caminhos diferentes.
Valls passou a ser assistente parlamentar aos 23 anos, antes de atuar como conselheiro do primeiro-ministro reformista Michel Rocard (1988-91) e depois de Lionel Jospin (1997-2001).
Foi eleito em 2001 prefeito de Evry, uma cidade popular no sul de Paris, e depois tornou-se deputado. Foi eliminado na primeira volta das primárias socialistas de 2011 e apoiou o candidato François Hollande. Quando este último foi eleito presidente, foi recompensado com o ministério do Interior.
Benoît Hamon, por sua vez, entrou no partido socialista em 1987. Seis anos depois, foi presidente do Movimento de Jovens socialistas e em 2008 tornou-se em porta-voz do partido.
Foi ministro de Hollande, mas saiu do governo em 2014, em desacordo com a política económica do executivo.
Os slogans de campanha dos dois candidatos resumem as suas visões: "fazer o coração da esquerda bater", para Hamon; ”uma República forte, uma França justa", para Valls.
A primeira volta das eleições presidenciais francesas realiza-se a 23 de abril próximo. Caso seja necessária uma segunda volta, este escrutínio realiza-se em maio.
Béatrice Le Bohec/AFP
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