Alfredo Cunha é autor de muitas das imagens que se tornaram símbolo de uma época, entre as quais um retrato do capitão de Abril Salgueiro Maia. Aos 20 anos, foi um dos fotojornalistas que registaram para a posteridade o dia 25 de Abril de 1974, em Lisboa, e os momentos que se lhe seguiram, incluindo o Verão Quente de 1975 e o processo de descolonização.
Na exposição que é inaugurada na sexta-feira na galeria Underdogs, Alfredo Cunha mostra imagens de Portugal “forrado de cartazes, e grafitado, em 1975”.
“Era o Facebook mais democrático que vi até hoje. Havia alguma censura, porque quando alguém não queria pintava por cima. Era, de facto, onde se dizia tudo o que havia para dizer. Toda a gente se expressava: à direita, à esquerda, os anarquistas…”, recordou, em declarações à Lusa, durante a montagem de “Viva a Liberdade”.
Nas paredes da galeria, o fotógrafo mostra o que mais o seduzia em tempos de uma Liberdade recente, “que era a expressão política”.
“É evidente que tem uma tendência política, é óbvio, que é a minha. O meu posicionamento político [de esquerda] é claro nesta exposição”, afirmou.
Entre as 15 fotografias expostas — todas a preto e branco — “há pelo menos cinco completamente inéditas, que eram desconhecidas, porque nunca foram mostradas antes em exposição”.
Alfredo Cunha tem passado os últimos dois anos a “viajar” no seu arquivo, que reúne milhares de imagens, captadas entre 1972, quando começou no jornal O Século, e em 2015, quando deu a carreira no jornalismo por terminada.
Nessas ‘viagens’ descobriu coisas de que já não se lembrava, “coisas surpreendentes, a que o tempo também acrescentou”.
“Porque, no quotidiano, habituamos e viciamos o olhar. Tenho como norma fotografar sempre que me surpreendo, depois no que me surpreende tento perceber porque é que me surpreendeu, e então ir ao pormenor. Mas primeiro as coisas têm que me surpreender”, partilhou Alfredo Cunha.
O fotógrafo destaca o facto de as imagens, num “género de fotografia clássico, da fotografia humanista portuguesa”, estarem a ser mostradas “numa das galerias mais de arte moderna de Lisboa”.
Inaugurada em 2013, a galeria faz parte da plataforma cultural Underdogs, criada em 2010 pelo artista português Alexandre Farto (Vhils) e a curadora francesa Pauline Foessel, que se dedica à divulgação do trabalho de artistas cujas carreiras, em grande maioria, começaram nas ruas, no ‘graffiti’ e Arte Urbana.
Alfredo Cunha começou a colaborar com Vhils há cerca de um ano e meio, para o projeto “25 de Abril de 1974, quinta-feira”, que inclui um livro e exposições com o mesmo nome.
A imagem do projeto, que faz capa do livro, é o icónico retrato de Salgueiro Maia, da autoria de Alfredo Cunha, reinterpretado por Vhils.
Essa é a fotografia que o fotógrafo aponta, entre as milhares que tirou, como a que melhor representa a Revolução dos Cravos.
“Não é a melhor, nem sequer está entre as dez melhores [entre as fotografias que tirei naquela época], mas é aquela onde está a alma do 25 de Abril. E foi por isso que a escolhi para a capa do projeto, apenas com a reinterpretação do Vhils, também para atrair os jovens para esta realidade que é a Democracia”, explicou.
Além do retrato de Salgueiro Maia, Vhils reinterpretou outras três fotografias de Alfredo Cunha e o resultado pode ser visto no espaço cápsula da galeria Underdogs, e está também incluído no livro “25 de Abril de 1974, quinta-feira”.
“Viva a Liberdade”, exposição com a qual a galeria Underdogs assinala os 50 anos do 25 de Abril de 1974, pode ser visitada até 27 de abril. A entrada é livre.
Entretanto, no âmbito do Programa de Arte Pública da Underdogs, é inaugurado no dia 25 de abril em Santarém, no Jardim da Liberdade, um painel de azulejos, com cinco metros de altura e quatro de altura, da autoria do Pedrita Studio e inspirado numa fotografia de uma multidão captada por Alfredo Cunha no dia da Revolução dos Cravos.
Este painel, composto por mais de 800 azulejos, é “uma homenagem a todas as pessoas anónimas que se ergueram para derrubar o fascismo em Portugal”, segundo a Underdogs.
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