SAD. A sigla continua a estar na ordem do dia no panorama do futebol português. Um assunto que ganha contornos de discussão, mais ou menos acesa, quanto associada a uma palavra. Clube. Clube-SAD, Sociedade Anónima Desportiva-clube. Umas vezes, diferentes nomes, onde ambos são o mesmo, outras, mesmo que não o sejam, vivem em sintonia e, há ocasiões, por não serem a mesma pessoa, não se sentam à mesma mesa.

Fernando Veiga Gomes, sócio da Abreu advogados, defende que “clube e SAD devem ser a mesma coisa e trabalhar em comum”. Quando funciona de forma diferente “começam a chocar”, avisa. “O grande património são os adeptos e os investidores têm que perceber isso. Sempre que vivem de costas voltadas, acabam mal”, reforça o especialista em Direito do Desporto em conversa com o SAPO24 durante a qual se falou basicamente dos dinheiros no futebol.

Há boas e bonitas histórias e há histórias (más) mal contadas. E, tal como a rábula “queres primeiro as boas notícias ou as más notícias”, começamos pelas últimas.

O mal surge num exemplo que o advogado, diz conhecer “bem”: Atlético Clube de Portugal. “Falta de controlo e certificação prévia de quem era o investidor levou a que fosse comprado por uma empresa conhecida por práticas (ilícitas) que já tinha feito noutros países e que, em Portugal, à frente de toda a gente, fê-lo descer de divisão, por duas vezes. Desapareceram. E o Atlético acabou na última divisão distrital”, recorda.

Por isso, considera urgente que a Lei das SAD’s “seja revista”. É uma lei “cheia de obrigações”, mas onde “não há consequências para o incumprimento dessas obrigações”, alerta. “Um investidor compra a SAD, gere-a a seu bel-prazer sem que o clube, por incumprimento das regras da própria lei, tenha forma de resgatar aquilo que é o seu maior património: a equipa sénior de futebol”, adverte. “Devia haver regras que permitam que o clube resgate o futebol”, remata.

Face à entrada de dinheiro fresco e acionistas de todo o mundo que compram clubes por esse mundo fora, Fernando Veiga Gomes alerta para um problema a montante: “a infiltração criminosa na propriedade dos clubes”. Avisa que o “betting (apostas), corrupção e lavagem de dinheiro” estão a entrar no capital dos clubes, clubes que são usados “como plataforma para práticas ilícitas”. Por isso, defende, a existência de “um sistema”, à semelhança de outros países, com um conjunto de “regras mínimas”, que passam por “saber quem são as pessoas, origem dos capitais e quem é o último beneficiário efetivo”, afastando, assim, o fantasma de conflito de interesses e influências sobre questões de natureza desportiva nas competições.

“Cada vez mais não percebemos o racional económico e desportivo de determinada transferência. O jogador sai do clube e ninguém entende. E isso põe em causa a integridade das competições”, sublinha. “Alguém, por detrás de um clube, que tem o poder de fortalecer ou enfraquecer os clubes em detrimento de outros, a meio de uma competição, e pode alterar o resultado da mesma competição. Chega a janeiro e tira e mete noutro lado”, exemplifica.

Chega do lado B. Ou A, conforme as perspetivas. “À partida, os investidores são todos bons”. É tempo dos bons exemplos. Ou antes, de um “belicismo” exemplo: o Famalicão. “Tem investidores identificados e é um bom exemplo do que se pode fazer em termos de investimento”, aponta. “Trazer jogadores de qualidade, investir nos adeptos e nos sócios, na marca, na comunicação e nas infraestruturas desportivas. Faz engrandecer o símbolo como um todo”, descreve.

“Nos últimos quatro anos, o governo mostrou-se alérgico ao futebol”

A equipa do Distrito de Braga está em primeiro lugar na Liga NOS. Vindo da Liga PRO (2ª divisão), poucos são aqueles, que na sua racionalidade, acreditam que será campeão nacional. No entanto, está no topo da tabela e a animar (foram a Alvalade vencer o Sporting, crónico candidato ao título nacional) este arranque de época.

No futebol a conversa é corrente. Fala-se dos quadros competitivos, da necessidade de competitividade nos campeonatos, alternância de vencedores, mas a verdade, nua e crua, é que os campeões são sempre os mesmos, com honrosas exceções.

Para Fernando Veiga Gomes, os quadros competitivos “encaixam” na meta proposta pela Liga de Clubes e pelo presidente, Pedro Proença, de colocar a liga portuguesa na posição 6 do ranking da UEFA. “Temos jogadores e todas as condições para competir e com as ligas atrás dos 5 Grandes. Por isso, é essencial a questão dos direitos audiovisuais centralizados. Os quadros competitivos encaixam nessa resposta”, sustenta o advogado da Abreu Associados.

“Nos últimos quatro anos o governo mostrou-se alérgico ao futebol, muito equidistante”, critica, trazendo à discussão o que sucedeu noutros campeonatos. “Na Itália e em Espanha, o governo agiu. Espanha centralizou e as receitas triplicaram. 

“Portugal exporta mais jogadores de futebol que cortiça. Basta um João Félix”

A indústria do futebol português não quer ganhar dinheiro”, questiona. “Portugal exporta mais jogadores de futebol que cortiça. Basta um João Félix”, exclama.

“Temos uma indústria que devemos acarinhá-la. E se a indústria não se entende, tem de ser por decreto de lei, se não, mantém-se o status quo”, alerta.

“Há clubes que venderam os direitos até 2028, depois, em 2025, vão estender contratos para ter antecipação de receitas e vamos andar sempre nisso. Há que colocar uma pedra, ver quem vendeu até mais tarde e colocar um limite. Ninguém vende a partir daí e depois negociar todos juntos”, sugere. “Mexe em interesses instalados de que tem 80 por cento das receitas, entram em campo com orçamento de 90 milhões com outros com 5 milhões”, aponta.