Já “nas categorias de rendimentos superiores a 2.500 euros, apenas 6% de pessoas perderam o seu rendimento”, adiantam os dados do “Opinião Social”, o questionário do Barómetro Covid-19 da ENSP que acompanha semanalmente a perceção dos portugueses da pandemia.
O estudo alerta que “as consequências económicas da doença e do confinamento, como o desemprego ou redução das fontes de rendimento, podem afetar desproporcionalmente os grupos mais vulneráveis” e considera os resultados obtidos “bastante preocupantes”.
Segundo o estudo, a diminuição do rendimento desde o início da pandemia “não foi igualmente partilhada pelas diferentes classes de rendimento, assistindo-se a uma perda crescente nas categorias mais baixas”.
Mais de metade (52%) dos inquiridos referiram não ter perdas de rendimento, mas no grupo de pessoas cujo agregado familiar auferia entre 651 e 1.000 euros esta percentagem desce para 44%, subindo para 75% entre aqueles que o agregado recebe mais de 2.500 euros.
“Os dados preliminares parecem indicar que a infeção por covid-19 é marcadamente desigual, afetando de forma mais acentuada os concelhos e países que já têm um perfil socioeconómico mais precário e podendo mesmo exacerbar as vulnerabilidades socioeconómicas pré-existentes ao nível individual”, sublinha.
Em declarações à Lusa, a investigadora Joana Alves afirmou que “quem trabalha as desigualdades em saúde já sabe de estudos anteriores que existem diferenças sistemáticas de saúde entre as pessoas de diferentes níveis sociais”.
O barómetro quis perceber se também havia desigualdades na distribuição do número de casos de covid-19 ao nível dos concelhos em Portugal e em alguns países europeus.
“Em termos de resultados obtivemos três níveis de evidência”, sendo o primeiro a nível nacional, em que se observou que “os concelhos com maior densidade populacional, com maior taxa de desemprego, com menor média de rendimento e maior desigualdade de rendimento eram também aqueles concelhos que tinham o maior número de casos de covid-19″, sublinhou Joana Alves.
A nível internacional, confirmou-se que “os países com maiores desigualdades de rendimento e maiores taxas de desemprego eram aqueles também onde existia a maior incidência acumulada de casos por 100 mil habitantes”.
Por fim, a nível individual, constatou-se que “as consequências económicas e sociais da pandemia não estão a ser suportadas de uma forma igual pelos diversos agregados familiares”, disse Joana Alves, explicando que é como se fosse “uma escada social” em que os que “tinham menores níveis de rendimento eram também aqueles que sofriam as maiores perdas desde o início da pandemia”.
O estudo refere que as condições socioeconómicas também podem ter “uma influência significativa no risco de infeção”, explicando que “a falta de compreensão em algumas camadas populacionais” sobre como se propaga a doença pode dificultar a adoção de medidas como a etiqueta respiratória, higienização das mãos ou o uso apropriado de máscara.
Por outro lado, o trabalho precário e a dificuldade de acesso a apoios sociais podem impedir que as pessoas se resguardem mais em casa para se protegerem do vírus. “Trabalhos que não podem ser realizados à distância” ou “a necessidade de continuar a fazer pequenos trabalhos para garantir a subsistência” sujeitam as pessoas a uma maior exposição à infeção.
O estudo aponta ainda que os concelhos com mais médicos por mil habitantes têm um maior número de casos diagnosticados face aos restantes.
Para Joana Alves, “é necessário reforçar a capacidade de os países se organizarem numa definição de políticas conjuntas de saúde e económicas de combate à pandemia” para que “não se agravem as desigualdades entre os países com consequências para todos”.
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