No relatório daquela auditoria levada a cabo pela Inspeção-Geral de Finanças (IGF), agora divulgado, e que incidiu sobre a atividade e as operações financeiras desenvolvidas pela FJB entre 2007 e o final de 2017, conclui-se que naquele período a Fundação “prosseguiu atividades financeiras dirigidas a fins” diferentes dos estatutos, nomeadamente operações financeiras.
A análise revelou que a situação económico-financeira da FJB se agravou desde 2007, com a redução do ativo em 575 milhões de euros e dos resultados líquidos, que evoluíram de 102 milhões de euros positivos naquele ano, para 245 milhões de euros negativos em 2017, “efeito da atividade financeira desenvolvida”.
“As atividades principais desenvolvidas consistiram na realização de operações financeiras com risco de mercado elevado (isto é, aquisição de ações/participações de capital), com contração de empréstimos avultados (980 milhões de euros em dívida no final de 2017)”, lê-se no relatório, que assinala que esta situação agravou o rácio de endividamento da FJB para 207%.
Ao mesmo tempo, o valor afeto aos fins estatutários equivale a apenas 0,1% dos ativos em 2017, ou seja, 599 mil euros.
Segundo a IGF no final de dezembro de 2017, o ativo líquido da fundação totalizava 481,8 milhões de euros, valor que reflete uma redução de 255,8 milhões de euros face a 2016 e de 757,3 milhões de euros por comparação com 2011, sendo esta situação originada “sobretudo pelo decréscimo do valor dos investimentos financeiros”.
Na sequência desta fiscalização, a IGF identificou ainda despesas “sem conexão com as finalidades de cariz social da fundação/IPSS e/ou em benefício direto de familiares do fundador (250 mil euros), sem enquadramento nos estatutos e na lei”.
No entanto, assinala o relatório, “apenas em finais de 2019 (no decurso desta auditoria), o Instituto da Segurança Social da Madeira (ISSM) procedeu ao cancelamento do registo como IPSS [Insituição Particular de Solidariedade Social], por ‘…falta de exercício, durante um período de 3 anos, de atividades necessárias à realização dos fins de segurança social’ (Declaração n.º 22/2019)”.
Além da vertente económico-financeira, a IGF detetou outras desconformidades nomeadamente o facto de a FJB não ter adequado as normas estatutárias ao Estatuto das IPSS na Região Autónoma da Madeira (RAM), no prazo limite legal (até dezembro de 2017), tendo “apenas em 2019” apresentado a proposta, “ainda que com insuficiências”.
Além disso, “não observou a Lei-Quadro das Fundações (LQF) ao celebrar, em 2015, um contrato dação em cumprimento do imóvel ‘Monte Palace Hotel’, para liquidar dívida de 90 milhões de euros à ‘Associação de Coleções’, sem a autorização prévia da entidade competente para o reconhecimento”.
O Instituto da Segurança Social da Madeira (ISSM) também é visado no relatório, com a IGF a referir que detetou “algumas insuficiências na atuação” deste organismo que, entre 2015 e 2018, “só efetuou 11 ações inspetivas a sete IPSS da RAM [Região Autónoma da Madeira], num universo de 55, não tendo abrangido a FJB”. O relatório assinala que em 2019, o ISSM começou a reforçar a sua atuação.
Na sequência desta auditoria, a IGF recomendou ao Governo o cancelamento doo estatuto de utilidade pública de que a fundação beneficia, considerando, inclusive, que o seu registo como IPSS já foi cancelado pelo ISSM, recomendação que já produziu efeitos, tal como o jornal Público tinha adiantado e a Lusa confirmou junto de fonte oficial do gabinete da ministra da Presidência do Conselho de Ministros.
“Considerando que o estatuto de utilidade pública desta entidade decorria do seu próprio estatuto de IPSS, informa-se que o mesmo cessou, de forma automática”, refere a mesma fonte oficial, acentuando que a Fundação Berardo, com sede na Região Autónoma da Madeira, gozava do estatuto de utilidade pública, por lei, pelo facto de ser uma IPSS e que, tal como refere o relatório da IGF, o estatuto de IPSS da Fundação Berardo foi cancelado em 2019 pelo Instituto da Segurança Social da Madeira.
A IGF, recomenda ainda à Secretaria Geral da Presidência do Conselho de Ministros que requeira a nulidade da dação em cumprimento do imóvel “Monte Palace Hotel”, junto das competentes instâncias judiciais.
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