Tudo o que é extremo é ofensivo, é perigoso, não beneficia ninguém. É assim ideologicamente, religiosamente e por aí fora. O extremo implica rejeição de um princípio de tolerância. Somos muito rápidos a julgar os outros, somos muito rápidos a encontrar possíveis guetos nos quais gostaríamos de enfiar as pessoas que não concordam connosco ou que não são da mesma cor. E temos um discurso politicamente correcto, tantas vezes, que não corresponde efectivamente ao que pensamos ou sentimos.

Como é que o partido Chega de André Ventura tem votos suficientes para eleger um deputado? Cerca de 66 mil pessoas nos concelhos mais pobres do país, com população envelhecida (com uma média acima dos 65 anos de idade), com os piores serviços de saúde, escolheram o programa de André Ventura. Évora, Beja, Faro e Portalegre com o maior número de votos. Por desalento? Talvez por desespero? Não sei responder, mas são perguntas válidas e importantes para fazermos. Nós que rejeitamos as causas que este partido defende, o seu programa de extremos e propostas que são, repito, retrocessos civilizacionais, devemos tentar compreender porquê e perceber ainda se, daqui a quatro anos, numas novas eleições, existirão mais pessoas com a mesma tendência.

Quando as pessoas estão em dificuldades fazem opções que porventura não fariam se estivessem a viver dias fáceis, já se sabe, mas deveriam existir limites. É o que pensam as pessoas que sabem que a nossa democracia de 45 anos é frágil e não precisa de revisitar certos princípios.

Há umas décadas (1987), Washington Olivetto, criou um anúncio para o jornal brasileiro Folha de São Paulo. A imagem ia movimentando-se num conjunto de pontos pretos que iriam formar uma outra imagem. A voz off debitava factos sobre os inúmeros feitos de um homem em determinado país. Um homem que recuperou a economia, que reduziu a inflação, que adorava música e pintura. A imagem torna-se global e surge Hitler. A conclusão do anúncio era? “É possível contar um monte de mentiras dizendo só a verdade”. O que os eleitores do Chega estão enganados ou sabem no que votaram?