Os números oficiais, cuja fiabilidade só é questionável pela possibilidade de não conterem todos os casos, dizem-nos que o total de pessoas mortas por efeito do vírus ronda um milhão. Só num país, os Estados Unidos, são 200 mil. No conjunto de países da América Latina já são 310 mil. O Brasil tem pelo menos 136 mil óbitos e o México 73 mil. Na Ásia, a Índia vai acima dos 87 mil.

Já são mais de 60 os países, incluindo quase todos os europeus, onde dispara o número de contágios e, necessariamente, o receio de muitos de novo agravamento. Há incertezas sobre a capacidade para controlar essa nova escalada.

O diretor da OMS para a Europa, Hans Kluge, foi claro ao advertir que “o nível de transmissão na Europa atingiu valores alarmantes”. O número de contágios diários na Europa oscilou na última semana entre os 40 mil e os 50 mil. O dirigente da OMS acrescentou que o crescente número de testes não é explicação para a subida na velocidade de aparecimento destes números.

Salta à vista que quase todos temos responsabilidade neste aumento. Vemos demasiada gente que despreza a recomendação de respeito de distância física e de outras medidas preventivas. Há quem se manifeste contra as restrições decididas por autoridades de saúde e governos.

Já estamos com meio ano de cautelas, sem abraços e sem beijos que fazem falta. Muita gente está com desesperantes quedas de rendimentos ou trágica perda de trabalho. Após o pico de março e abril, em maio instalou-se uma sensação de alívio, afinal injustificada. A realidade atual está bem simbolizada por um testemunho publicado na semana passada no The Washington Post: “Olhávamos em frente e víamos que começava a aparecer uma luz lá no fim do túnel, Agora, a luz aproximou-se e constamos que afinal é o farol de um comboio que vem contra nós”.

É sensato pensarmos que isto está para durar. O mais provável é que ainda demore muito tempo até termos vacina que seja simultaneamente fiável e acessível a todos. O confiável Fauci aponta o Natal de 2011.

Assim sendo, como reagir, o que fazer? Há quem despreze a ameaça. Há quem se deixe tomar pelo medo. São as reações a evitar.

Os que desprezam a ameaça e ignoram as restrições estão a pôr-se a eles e a todos nós em risco aumentado.

Os que se deixam tomar pelo medo entram em angústia e sofrimento desnecessário. O francês Michel de Montaigne, fechou-se numa torre de Bordéus para pensar, isto no século XVI, tempo de peste. Escreveu os Ensaios e entre a sabedoria que nos deixou está esta: “Se deixamos entrar o medo, instala-se no nosso peito uma causa comum de tormenta, que nada pode aliviar”. O medo é para ser afastado. Ligado ao medo da pandemia, há a ansiedade pelas consequências económicas e sociais. Há que ter em conta que a escalada dos medos é uma ameaça à vida democrática, dá oportunidade aos que se dizem de poder forte. É o desafio para os líderes democráticos: saberem afirmar a liderança sem necessidade de discurso autoritário. O fim do medo não se decreta, é conquistado pela liderança eficaz.

Frente à ameaça do vírus, sabemos que podemos minimizar riscos: com máscara, com distância física, com cultura de higiene reforçada. Sendo responsáveis, sem concessões, sem exceções. Evitando os ajuntamentos, seja quais forem. Assim, de certeza, contribuirmos para que o vírus não tenha por onde continuar a atacar.

Constata-se a tentação de tantos mais novos de continuarem a estar em grupo nos copos e a dançar. Até com a despreocupação que vem do rumor de que os mais jovens até podem ser contaminados e escaparem a sofrimento, na prática, terem o vírus mas sem padecerem por qualquer sintoma. É uma perceção perigosa, e seria bom que o alerta dos cientistas para esse risco fosse muito amplificado. O conhecimento que os cientistas já nos passaram diz-nos que este vírus SARS-CoV-2 tem outras estratégias de ataque, para além daquelas de curto prazo que requerem hospitalização e às vezes cuidados intensivos para tentar evitar o cenário pior.  Já nos foi explicado que o vírus também usa atacar em modo lento, como que se põe em espera a corroer as nossas defesas imunitárias, espera a ocasião para se infiltrar no sistema nervoso central e, a partir dali, engendrar ataques a órgãos em modo a posteriori que ainda não sabemos se é reversível.

Continua a ser imenso o que falta saber sobre o vírus, mas já sabemos o suficiente para perceber que ele vai continuar a atormentar-nos por bastante tempo mais. Mesmo que seja proclamada a descoberta da vacina, há que contar com vários meses mais com a ameaça de contágio. Resta-nos termos paciência, aceitarmos e cumprirmos com escrúpulo todas as restrições recomendadas e assim ajudarmos, cada um de nós, a parar a cadeia de transmissão do vírus.

Já percebemos que a luz que aparecia no fim do túnel, afinal é a do farol de um comboio que vem contra nós. Mas, se nos protegermos, escapamos.

Uma boa opção é a de darmos atenção ao esforço coletivo para sairmos desta crise sanitária e económica, e há boas histórias de êxito. Não podemos descurar a atenção aos dados reais sobre a pandemia, mas escolher bem como evitar os disparates e até mentiras que há quem goste de propagar.

A TER EM CONTA:

Um outro problema: as dúvidas sobre a urgência na resposta global à crise climática.

A mês e meio das eleições nos EUA, o caos ameaça instalar-se.

O mundo visto por repórteres fotográficos.

Uma outra tragédia brasileira.

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