Se os restaurantes ganhassem dinheiro com os almoços hipotéticos que nunca chegaram a ser marcados, ter um restaurante seria dos negócios mais lucrativos do mundo. Todos nós já marcámos um almoço hipotético ao encontrar um conhecido, colega ou amigo perdido que não víamos há algum tempo. Conversa de circunstância de minutos que termina sempre com: “Foi um prazer ver-te, a ver se marcamos um almoço um dia destes”; “Sim, temos de marcar”, responde o outro. Escusado será dizer que a engordarmos, nunca será desse almoço que nunca verá a luz do diz. Se quando dizemos “Temos de marcar um almoço” a comida fosse logo comprada e cozinhada, o desperdício alimentar no mundo seria ainda maior. Por falar nisso, é curioso como somos todos contra o desperdício alimentar, mas refilamos se o pão não é de hoje. Humanos a ser humanos.

Perder laços faz-nos sentir velhos, queremos agarrar-nos ao passado e às pessoas que nele habitam, sem percebermos que se deixámos de ter contacto foi porque provavelmente o contacto não era assim tão imprescindível. O almoço que nunca é marcado, raramente é um almoço que ambas as partes anseiam. Sim, há amigos perdidos para o tempo, há amizades que não são regadas como deviam, mas a maioria das pessoas com as quais não vamos almoçar é porque não nos apetece. Uma coisa é conversar dois minutos com alguém que não nos diz muito, outra é partilhar uma refeição onde o assunto pode morrer ainda nos couverts. Depois fica um silêncio chato enquanto ambos se apercebem a razão pela qual aquele almoço esteve tanto tempo no limbo das refeições hipotéticas. “A ver se marcamos um café” ou “A ver se bebemos um copo”, são variações mais inteligentes. Primeiro, um café é um compromisso rápido que pode durar apenas enquanto houver assunto. Segundo, porque com um copo, normalmente o assunto não falta. Pode haver é o efeito secundário de pensarmos que, afinal, até temos afinidades com aquela pessoa e decidimos marcar um almoço que vai ser uma seca.

Às vezes, cometemos o erro de dizer o “A ver se almoçamos um dia destes” só por cortesia e da outra parte temos uma resposta “Claro, quarta-feira, podes?”. Por um lado, não queremos, por outro, estamos perante alguém que quer mesmo almoçar connosco e sentimo-nos mal por inventar uma desculpa ao género “Quarta-feira? Eh pá, tenho de ir ao urologista porque apareceu-me aqui umas borbulhinhas…”. Quanto mais detalhado e íntima for a desculpa, menos a outra pessoa desconfia. Uma boa desculpa é a do jejum intermitente. Sempre que alguém com o qual não tenho interesse de almoçar me convida eu respondo “Agora não almoço, jejum intermitente, só como a partir das 16h00 e já deve ser tarde para ti para almoçar…”. 

Como seres humanos temos esta necessidade de manter laços e ligações mesmo que ténues com pessoas das quais não iríamos sentir falta se morressem. Ensinam-nos desde pequenos que é bom ter muitos amigos, invejamos quem é popular e conhece toda a gente e tem festas de anos com cinquenta pessoas. Em adulto isso torna-se complicado porque um gajo tem de trabalhar e não tem tempo para regar todas as amizades, além de que se gasta muito dinheiro em prendas de aniversário e não se consegue fazer dieta com jantares de anos todos os fins de semana. Desconfio sempre de quem diz que tem mais de vinte amigos chegados. É sempre gente sem grande critério nas suas relações e que não valoriza a amizade.

“A ver se marcamos um almoço um dia destes…”. Passarão anos até que troquemos palavras com aquela pessoa outra vez e, quando isso acontecer, alguém vai dizer “Nunca chegámos a marcar o tal almoço, temos de ver disso”; “Eh pá, sim, esta semana estou a mil, mas na próxima a ver se combinamos”. O ciclo repete-se até um dia recebermos a notícia, por intermédio de alguém, que essa pessoa morreu e respondemos “A sério? Que cena, vê lá que eu tinha combinado ir almoçar com ele um dia destes”.

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