Temos assistido a um contínuo feminicídio que assusta, que se revela todas as semanas em notícias que começam com marido matou a mulher e a sogra, mulher foi morta pelo companheiro, homem furou tímpano à namorada com dois socos, mulher encontrada morta... as variações de um cenário de permanente violência e terror. Porquê? Importa perceber que exercício de poder é construído contra as mulheres.

Historicamente, sabemos da diminuição consecutiva do papel das mulheres em todas as frentes, em todas as frentes significa profissional, familiar, sexual, económica, política. Às mulheres sempre foi negada uma voz, um sentido de propriedade, de legitimidade. A tradição vai longa e demasiado antiga e é urgente educar as novas gerações de meninas (e de meninos!) no sentido da paridade, no sentido da liberdade, no sentido do poder.

As mulheres são tão poderosas quanto os homens. Não têm de o ser mais ou menos, apenas tanto quanto. Dá-me igual que amanhã seja o dia da mulher, dá-me igual que se tente instituir que hoje, dia sete de março, seja o dia de luto nacional pelas vítimas de violência doméstica e de violência contra as mulheres. Não acho bem, nem acho mal (embora suspeite de muito paternalismo), infelizmente fui educada para tomar rédeas da minha vida e não me agradam discursos de fragilização sobre as mulheres e a sua existência em sociedade.

Esta é a razão pela qual nunca fui adepta do Dia da Mulher, dirão que é uma embirração como qualquer outra. Que a ministra da Presidência e da Modernização Administrativa venha propor um dia de luto nacional pode ajudar a chamar a atenção para as questões das vítimas de abuso e violência. Não sou cínica, mas não consigo deixar de pensar que é uma operação boa para as redes sociais e afins, não é uma medida de formação a juízes que julgam casos de violência e abuso. E se os juízes precisam de formação! E também não é uma reflexão sobre o corporativismo do conselheiro superior da magistratura, que leva à impunidade de muitos, e como acabar com esta forma de estar na sociedade, os juízes devem ser tão penalizados quanto as outras pessoas. Ninguém os fiscaliza, pois não?

Não quero ser mázinha, mas que importa o dia da mulher e as rosas que nos distribuem se, a seguir, muitos homens destratam as mulheres no seio da família, no local de trabalho, na via pública? Parece-me crucial educar e mudar mentalidades. Parece-me urgente apoiar as mulheres que não conseguem livrar-se de teias apertadas e violentas. Parece-me evidente que ser mulher é, ainda hoje, demasiado perigoso.

Hoje, dia de luto nacional, morreu mais uma mulher. Foi assassinada pelo marido em Vieira do Minho. Tinha 40 anos. Passaram-se 66 dias desde o início do ano, morreram 12 mulheres, uma menina de dois anos e dois homens. Repito: ser mulher continua a ser perigoso. Um dia de luto serve para quê? Um dia com rosas e coisas queridinhas serve para quê?