Sim, todos temos vontade de festejar um tipo que recusa armar-se em estrela, que denuncia o mau trato aos refugiados e a censura eurovisiva, que canta em dez versos uma história que é um belo hino ao amor, que o faz com magia que nos toca no coração e que seduz a Europa  que distribui os twelve points. Mas, do serviço de notícias, deseja-se que nos traga, de preferência nessa meia horinha, as notícias que nos ajudam a saber e compreender o que se passa à nossa volta e pelo mundo. Há, fora dos noticiários, tempo de sobra para as informações de entretenimento. Calha que a pauta das notícias até está carregada de assuntos que precisamos de entender. Incluindo como lidar com o que há de novo na internet.

Antes de chegar “ao mais maciço ciberataque de que há conhecimento”, uma questão essencial: a liberdade. O respeito pela privacidade de cada pessoa é uma premissa fundamental da liberdade. É um bem que devemos à Revolução Francesa. Nasceu com a protecção absoluta ao correio postal. É um direito que nasceu para preservar cada pessoa da intromissão do Estado e da Igreja. Foi assim que o correio de nossos antepassados possibilitou difundir ideias que abriram portas à modernidade.

As constituições liberais do século XIX consagraram esse direito à vida privada, especificando a inviolabilidade do correio pessoal. Está fixado no artigo 12 da Declaração Universal dos Direitos Humanos. É um direito que foi ampliado, quando foi tempo disso, para proteger a privacidade das comunicações telefónicas perante escutas ilegais. Agora, com os novos meios digitais, este direito amplia-se à protecção da identidade digital e dos dados pessoais. Está em causa a protecção perante intrusos ou mercadores de dados, nesta época em que há quem nos veja, em vez de pessoas, como um dado ou conjunto de dados.

Toda a nossa vida tende a ser enquadrada por dados digitais: as nossas preferências, as nossas compras, até os nossos lugares e contactos. Somos vistos como dados e, portanto, somos um produto que interessa a quem se serve dessa informação para desenvolver negócio.

A recolha de informação sobre cada um de nós, o que antes era ficção de Hollywood, é hoje algo de banal. Tendemos a estar permanentemente sob rastreio. Somos, de facto, possíveis alvos de espionagem constante. O Big Brother de Orwell está há muito superado pelo curso deste século XXI.

As tecnologias digitais dão a impressão de nos abrirem o mundo com liberdade infinita. De facto, ao mesmo tempo, empurram-nos para a exposição da nossa privacidade. Temos ponderado em profundidade o que isso significa e como lidar com essa realidade? Será que estamos a perder na nuvem um direito conquistado com determinação pelos liberais de há dois séculos e tal?

Outra questão, esta da actualidade mais imediata: milhares de computadores pessoais e de grandes empresas e instituições estão a sofrer nestes dias o ataque maciço do WannaCry, um vírus que sequestra dados e que é injetado por criminosos piratas cibernéticos que depois reclamam um resgate em bitcoins para os desbloquear. É a ciberextorsão.

Há um número imenso de pessoas que está mesmo a ficar à beira do ataque de choro com as consequências do WannaCry. Corremos o risco de, um dia destes, um ataque, por exemplo, a uma rede de computadores do controlo aéreo ou ferroviário precipitar uma trágica colisão. Estamos perante a ameaça de ciberarmas como estas, um instrumento à mercê de terroristas e outra gente nefasta.

Os ataques cibernéticos não são algo de novo. Sempre existiram e é por isso que têm sido criadas defesas. Mas os cibercriminosos mostram-se ágeis a explorar os avanços tecnológicos e a ausência de restrições eficazes. Vivemos um tempo de infinita conexão remota e os peritos atestam que a exposição aos golpes de piratas é imensa. Os atacantes infiltram-se de modo praticamente invisível para propagar o seu ataque sem serem detetados.

Está reconhecido que a questão não passa por “se acontecer um novo ataque”, mas “quando acontecer”, como é que será enfrentado.

Parece evidente que é necessário um esforço concertado dos promotores tecnológicos e dos legisladores para proporcionarem ao cidadão o objetivo comum de segurança.

É preciso robustecer o poder dos cidadãos para nos protegermos e para que a propagação de ataques cibernéticos possa ser contida.

As áreas de inteligência artificial e o campo multidisciplinar da engenharia de sistemas são uma grande promessa para essa tarefa que requer ferramentas inovadoras e, seguramente, coordenação eficaz.

Está na natureza humana a superação da adversidade e dos obstáculos. Precisamos de ter noção dos desafios que temos pela frente, para não sermos apanhados indefesos perante os ciberatacantes. É uma tarefa para a educação nas escolas e para informação consistente através dos media.

TAMBÉM A TER EM CONTA:

Trump passou aos russos informações altamente top secret? O Washington Post desencadeou, em 1972, o Watergate que fez cair Nixon. Agora, o mesmo jornal avança as revelações deste Russiagate. A gente de Trump está a negar tudo. O que foi fatal para Nixon foi o que tentou esconder. Idem para Trump? Nos próximos dias, vale estar de olho e ouvido na primeira saída presidencial de Trump, inclui Israel e o Vaticano.

Macron, na campanha presidencial, estilhaçou o PS francês. Agora, ao nomear para primeiro-ministro um homem da direita, está a tratar de instabilizar ainda mais o partido da direita clássica para tentar formar o seu bloco ao centro?

Começam nesta quarta-feira os 12 dias de festival de cinema em Cannes. Happy End, de Michael Haneke, é uma expectativa principal nesta edição que também tem Sofia Coppola, Todd Haynes e muitos mais, com Pedro Almodovar a presidir ao júri e a lenda Claudia Cardinale no cartaz... Nas sessões paralelas, passam quatro filmes portugueses.

Twin Peaks, série de culto de David Lynch, está a voltar, 26 anos depois. Com Angelo Badalamenti como autor de uma das mais marcantes bandas sonoras nos ecrãs.

O gosto de uma galeria de vidas negras captadas por fotógrafos negros.