Quando falamos de vitimação masculina existe um grande estigma associado, especialmente quando falamos de violência sexual, mas a realidade é que 1 em cada 6 homens é vítima de alguma forma de violência sexual antes dos 18 anos. Apesar disto, constatamos que existe um desconhecimento por parte do público em geral sobre esta realidade, o que promove a reprodução de mitos e crenças erradas acerca desta forma de violência, bem como a manutenção do silêncio a que estes homens estão confinados.

A maioria dos homens vítimas / sobreviventes que procura o apoio especializado da Quebrar o Silêncio, procura apoio pela primeira vez. São homens que foram silenciados durante anos e décadas, sem sentir que podiam falar das suas experiências e que agora estão a fazê-lo pela primeira vez, porque, segundo os próprios relatam, encontraram na Quebrar o Silêncio um espaço seguro para o fazer.

Para um sobrevivente partilhar a sua história representa um passo arriscado, mesmo que seja com alguém da família, uma pessoa amiga ou da sua confiança. Esta partilha é um ato de coragem, de força e que marcará a vida deste homem. Na Quebrar o Silêncio reforçamos que é fundamental valorizar este ato e mostrar que não está sozinho. Sugerimos que tenha em mente as seguintes orientações para o que se pode dizer e para o que se deve evitar, numa circunstância em que um sobrevivente partilhe consigo a sua história de abuso.

O que pode dizer?
- Obrigado por confiares em mim.
- Acredito em ti.
- Lamento que isso tenha acontecido.
- A culpa não foi tua.
- Estou aqui para te apoiar e ajudar-te a ultrapassar isto.
- Os teus sentimentos e pensamentos são normais.
- Não há receitas sobre o que deves sentir.
- Como é que eu posso ajudar-te?

O que deve evitar dizer?
- Como é que alguém te pode ter feito isto?
- Porque não contaste antes?
- Eu compreendo exactamente o que estás a passar.
- Podia ter sido pior.
- Tens sorte de não ter acontecido algo mais grave.
- Devias ter tentado evitar ou fugir.
- Tenta que isso não te afete tanto.
- Quem foi?
- Como é que foste abusado?

Um homem que tenha sido vítima de violência sexual na infância demora, em média, 26 anos até procurar apoio. No entanto, no nosso quotidiano lidamos com casos de homens que só após 40, 50 e 60 anos em silêncio conseguiram finalmente procurar apoio e começar o seu processo. Imagine passar uma vida inteira silenciado e a sofrer as consequências de uma experiência traumática de violência sexual, completamente sozinho e isolado. Imagine passar toda a sua infância, adolescência, primeiras relações, universidade e casamento em silêncio; ter filhos e netos, sempre sem poder partilhar este segredo, nem mesmo com as pessoas mais próximas. É esta a nossa realidade.

Por isso costumamos dizer que quando apoiamos um homem vítima / sobrevivente de violência sexual, apoiamos também a criança que ele foi. Aquele menino que foi abusado sexualmente - na maioria dos casos por um familiar e/ou alguém da sua confiança - que cresceu sem o apoio de que necessitava, que foi remetido para o silêncio que é comum nas vítimas de violência sexual, e que teve de aprender sozinho a sobreviver, a lidar com o impacto e consequências do abuso, muitas vezes encontrando estratégias desadequadas.

A verdade é que uma experiência traumática de violência sexual pode ter consequências devastadoras na vida de um homem sobrevivente, mas não podemos esquecer que além de sobrevivente este homem é filho de alguém e que pode ser o nosso irmão, um colega de trabalho, ou mesmo o nosso pai. Até pode ser o nosso melhor amigo, que nunca viu em nós a abertura para partilhar esse segredo. Por isso, gostava de repetir a questão inicial: se o seu filho, irmão, amigo, marido, pai ou colega lhe dissesse que foi abusado sexualmente, saberia o que lhe dizer?

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