Fraldas de caridade ultra absorventes que absorvem toda a análise crítica de quem as usa bem para lá da prematuridade. São tão eficazes que o que devia ser visto com o a cor natural do que é próprio do cocó, é visto como o líquido azul usado nos anúncios para a merdinha ficar agradável à vista. Se nas fraldas se fica aquém, em tanta outra coisa está a ir-se para lá de além.
Por um lado, nada é verdade, tudo é inventado, fabricado e manipulado. Tudo é mentira, as notícias são “fake”, e a ciência é agora feita de factos alternativos, e não há nada que seja o que aparenta. Por outro, aceita-se acriticamente tudo o que nos é posto no prato para comer, come-se o que nos é metido à frente, praticamente dado à boca, sem sequer tentarmos tirar da caixa de plástico. O plástico é colorido, brilha e parece saber bem. Metemos à boca e a vida continua.
Portanto, se temos quem berre que as vacinas são as garras da Nova Ordem Mundial que nos vão agarrar e dominar, controlados pela tal suposta elite que domina o mundo, temos também quem não consiga olhar para uma campanha de marketing altamente manipuladora e ver para lá do embrulho. Muitas destas pessoas, as que acharam lindíssima a campanha, são realmente bem-intencionadas e se puderem ajudar bebés prematuros só com o partilhar de um vídeo, óptimo. Nem dá trabalho a pensar e ainda contribuem. Muitas outras, são só obcecadas com o capitalismo e, para elas, tudo o que as marcas fazem – mesmo sabendo que é tudo pelo lucro – é só virtudes e não pode ser alvo de escrutínio. É giro que tanta gente se recuse a ver para lá da famigerada boa intenção em “ajudar” com medo de perceber como funciona o sistema por detrás dela. Ajudei, sinto-me bem comigo mesmo, e se ousar tentar perceber o que estás por trás disto, se calhar as expectativas saem defraudadas e já não me posso sentir tão bem. Dói a todos.
A culpa não é do indivíduo, é do sistema, mas o indivíduo pode não se conformar com o sistema. A responsabilidade de resolver os grandes problemas sociais estruturais não pode ser embutida no comportamento de cada um, mas cada um pode agir muito para além da partilha de um vídeo, se quiser realmente contribuir para a sua resolução. É preciso é querer um bocadinho. Ou então, podem só tentar continuar a mandar-me mensagens, como muitos fazem, a tentar lavar o rabo do Jeff Bezos só porque ele deu não sei quantos milhões para ajudar na luta contra a covid, enquanto paga salários miseráveis a grande parte dos trabalhadores que nem direito a baixa médica paga têm, enquanto é dos maiores exploradores da invasão da privacidade das pessoas e do uso de big data para sua manipulação, usando e abusando do capitalismo de vigilância. Também adoro que me tentem explicar que deu não sei quantos milhões para um projecto de protecção do ambiente, enquanto tem um império que tanto polui como usa lobbies nos EUA e na EU, para lutar contra leis que serviriam para combater as alterações climáticas porque eventualmente lhe diminuiriam o lucro.
É preciso também referir que estas grandes empresas adoram fugir aos impostos (via paraísos fiscais) e têm também benefícios fiscais sempre que fazem estes donativos? Contornam o sistema e ainda passam por heróis. Espectacular, assim vale a pena. Se as marcas são todas monstros que fazem tudo com as piores intenções? Óbvio que não. Mas um pouco de sentido crítico para as distinguirmos umas das outras, e para perceber melhor o que fazem e por que o fazem, é capaz de dar jeito.
Sugestões mais ou menos culturais que, no caso de não valerem a pena, vos permitem vir insultar-me e cobrar-me uma jola:
- O Colapso: série para ver na Filmin.
- Catarina e a Beleza de Matar Fascistas: teatro.
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