Nesta agora composição de 720 lugares, o Partido Popular Europeu, família de PSD e CDS, continua a ser o maior grupo (185 eurodeputados), lugar que ocupa desde o fim do século passado, com uma diferença ainda significativa para o S&D (137), família do PS. O Renew, família da IL, diminui a sua representação, mas mantém-se como a terceira força (79), apesar do desastre eleitoral de Macron em França. 

Estes três partidos somam mais de 400 eurodeputados e superam, assim, a maioria absoluta de 361 eurodeputados necessária para decisões chave do futuro da União. Deste modo, é expectável que nos próximos dias a negociação entre estas forças definam as prioridades políticas para esta legislatura, bem como quem serão as personalidades que ocuparão os cargos mais importantes em Bruxelas.

Num sóbrio exercício de futurologia, arriscamo-nos a apontar que o PPE irá assegurar que Ursula von der Leyen continue como Presidente de Comissão e que Roberta Metsola possa ser reconduzida para um segundo mandato, na primeira metade da legislatura. O S&D poderá tentar escolher um socialista para a função de Presidente do Conselho Europeu, possivelmente António Costa ou a Primeira-Ministra dinamarquesa Mette Frederiksen. Aos Liberais deverá caber o Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, sendo a Primeira-Ministra da Estónia Kaja Kallas um nome forte.

Depois de um grande crescimento em 2019, os Verdes europeus também perdem influência no Parlamento Europeu (52), com uma queda expressiva na Alemanha e deixando de ter representantes portugueses, mas continuam a ser suficientes para uma formação maioritária com PPE e S&D, o que retira margem de negociação aos liberais. Mais à esquerda, a Esquerda, de BE e PCP, mantém-se como o grupo político mais pequeno do hemiciclo (36). 

O crescimento mais esperado era o do polo mais à direita, porém o aumento de número de eurodeputados não é significativo. Os Conservadores e Reformistas (ECR) sobem ligeiramente (73), beneficiando de uma grande vitória de Meloni com o Fratelli d´Italia a eleger 24 eurodeputados. O Identidade e Democracia (ID) não atinge o crescimento expectado enquanto grupo político (58), dado que suspendeu recentemente a AfD do seu grupo, partido que foi segundo na Alemanha com 15 eurodeputados. Estas famílias podem sofrer reformulações nesta nova legislatura, podendo readmitir membros suspensos ou mesmo reorganizarem-se.

Em termos nacionais, começando pelos maiores Estados, destaque para a vitória da Rassemblement national (ID) de Le Pen em França com 30 Eurodeputados e da CDU/CSU (PPE) na Alemanha, os dois com mais do dobro da expressão dos partidos de Scholz e Macron, resultados que enfraquecem os dois principais líderes europeus. Vitória do PP (PPE) em Espanha e da coligação de Donald Tusk (PPE) na Polónia, contendo Vox e PiS. 

Nos Países Baixos, o PVV de Wilders só não vence por causa de uma grande coligação entre socialistas e verdes, mas é o partido que individualmente consegue mais mandatos. Na Áustria, o partido FPO (ID) alcança mesmo a vitória. Na Bélgica, o Primeiro-Ministro De Croo demitiu-se, contudo não podemos ignorar que além das europeias, os belgas votaram simultaneamente para as eleições federais e regionais, e que o seu sistema é bastante complexo. Na Húngria, o Fidesz de Orban continua com uma vitória clara, embora menos expressiva, tendo o Primeiro-Ministro reafirmado a instrumentalização da palavra paz no seu discurso de vitória, questionando novamente o apoio à Ucrânia. Na Dinamarca, o partido da Primeira-Ministra perde para o SF (Verdes), embora com o mesmo número de mandatos. 

Chéquia e Eslováquia reúnem-se com vitórias da família liberal, tendo o SMER (suspenso do S&D) do alvejado Primeiro-Ministro Robert Fico ficado em segundo lugar. Os partidos do PPE vencem igualmente nos países bálticos, na Finlândia, Bulgária, Grécia, Eslovénia e Croácia. Socialistas vencem ainda na Suécia, Malta e Roménia, sem mais mandatos, e em Portugal.

A vitória do Partido Socialista em Portugal é tangencial, tal como a da AD tinha sido nas legislativas, conseguindo mais um mandato que a AD (8) e menos um que em 2019. A coligação do Governo mantém o número de eurodeputados (6- PSD e 1- CDS).  Marta Temido, apesar de prestações menos conseguidas com a defesa do seu programa, parece manter uma boa imagem de uma parte da população que a associa à pandemia. Sebastião Bugalho, ainda sem dados mais detalhados que permitam perceber a repartição deste resultado, aparenta ser um trunfo jovem que satisfez faixas etárias mais velhas do que os da sua geração. Apesar destas não poderem ser entendidas como as eleições do apelo ao voto útil, os dois principais partidos voltam a ultrapassar a casa dos 30% e concentram em si quase dois terços dos votos, e mais de dois terços dos mandatos.

O terceiro e quarto lugar também ficaram muito próximos, com o Chega ligeiramente, à frente e ambos elegendo dois eurodeputados. Foi aqui que residiu a maior surpresa, o Chega que após as legislativas se autoproclamava como favorito a vencer europeias, fica-se por um pódio Tangercial, pois não apresentou um candidato bem preparado e coerente ao longo da campanha, com os dotes retóricos de Ventura, e enquanto partido não revelou clareza de ideias, até na própria escolha da família política europeia e na sua posição quanto à integração europeia. Por outro lado, a aposta da IL num nome com bons índices de popularidade, carisma, ideias simples e percurso também fora da política deu bom resultado.

Por último, a disputa foi até ao fim para várias forças elegerem um eurodeputado, calhando a fava da frustração ao Livre, apesar da surpresa da prestação do seu candidato. BE e PCP conseguem salvaguardar a sua presença no Parlamento Europeu, perdendo um eurodeputado em relação a 2019. Nota ainda para a queda do PAN, que fica atrás do ADN, mesmo com a desigualdade de armas dos partidos sem representação na Assembleia da República, que não tiverem as mesmas oportunidades para apresentarem as suas ideias.

As ilações nacionais destas europeias além de inoportunas são escassas, até pela proximidade das legislativas, e dado que o resultado satisfez o discurso dos dois principais partidos. A opção dos portugueses pelas opções mais moderadas no Parlamento Europeu concretizou-se na eleição de 17 mandatos em 21 para três grupos políticos que definem os compromissos na União. A expressão nacional segue a tendência de viragem à direita, sendo difícil para o horizonte do PS apresentar uma alternativa de esquerda, sem descartar artificialmente o Chega da equação. Estes resultados inconclusivos podem serenar as negociações do Orçamento do Estado deste ano. 

Com mais certezas, contaremos com um Parlamento Europeu em Bruxelas e Estrasburgo para os próximos cinco anos, porque sem dissoluções os mandatos são levados até ao fim, com possibilidade de maiorias estáveis em muitas matérias. Esta aparente estabilidade contrasta com a grande imprevisibilidade do futuro de governos de vários Estados, que não só influenciará a composição do Conselho, como o comportamento dos seus membros que reagem às perspetivas eleitorais nacionais. 

Esta será uma legislatura que colocará à prova pilares da União Europeia:

A paz, com a defesa intransigente da Ucrânia enquanto vítima de uma agressão contrária ao Direito Internacional e do espaço europeu de forma coesa. 

A prosperidade, numa região que perde força no comércio internacional, não tendo autonomia energética ou setor industrial proeminente. 

A estabilidade, com sociedades que enfrentam sérias crises sociais, como na habitação, que geram frustrações e descontentamentos adensados por algoritmos que estimulam a polarização e que nos afastam de uma visão plural, mas partilhada. 

A sustentabilidade, quando outras questões importantes nos retiram foco na promoção da ação climática e no legado que deixamos às próximas gerações. 

A solidariedade, porque se os valores que nos definem se esmorecem, o projeto dissipa-se e não se reforça, com a convicção de um alargamento necessário nos Balcãs e progressivamente a leste. 

Porque a União se faz de Estados e também de cidadãos, precisamos nestes cinco anos de uma comunidade mais participada e uma sociedade civil mais desperta para que com sentido crítico possamos refletir sobre o futuro deste projeto e projetar realizações concretas que deem sentido a este União.