O enredo gira à volta de uma história de amor entre os dois protagonistas, Olívia e Francisco, que vivem em palco aquilo que os une e separa.
Olívia é a personagem principal interpretada por duas protagonistas mediáticas, Bárbara Tinoco e Carolina Deslandes. Já Francisco é trazido à vida por Diogo Branco.
O musical acontece em três atos: 1971, 1974 e 1975. No final, existe ainda um salto para a atualidade, e a peça encerra com as personagens nos dias de hoje a celebrar os 50 anos do 25 de Abril.
Pode considerar-se que existem duas versões da mesma peça, visto que quem interpreta a personagem principal, ora Bárbara Tinoco, ora Carolina Deslandes, se vão revezando entre a personagem principal, Olívia, e a sua irmã, Clara, sendo que aparecem sempre as duas no espetáculo. Ainda que tenha visto a peça duas vezes, esta não é uma experiência obrigatória, mas vale a pena para quem quiser escolher a melhor Olívia.
Esta produção conta com cinco músicos ao vivo, numa banda que tem desde o piano, à guitarra e ao violoncelo, com o teatro Maria Matos a apresentar uma acústica fantástica, dando a ideia que estamos a assistir a um concerto da época que nos acompanha durante toda a ação.
A música é claramente da assinatura das autoras, Tinoco e Deslandes, não destoando do estilo a que habituaram aqueles que acompanham a sua carreira noutros palcos. Não é música de intervenção, nem para ficar no ouvido para sempre, mas faz sentido na história que se vai desenrolando à nossa frente. Seria interessante, à semelhança do que se faz no estrangeiro, gravar as músicas deste musical, e assim talvez ficasse na memória mesmo depois de desaparecer de cena. Quiçá até possamos ainda ouvir algumas destas canções originais a serem interpretadas nos próximos espetáculos a solo das autoras.
O elenco é na sua maioria jovem, multifacetado, com coreografias pensadas e em sintonia em palco. As protagonistas, ainda que com menos experiência em palcos de teatro, dedicaram-se neste novo formato, mostrando estar à altura do desafio. Nota-se uma certa hesitação em algumas partes, mas é visível o apoio e entreajuda entre todos os atores, que inclui veteranos como Dinarte Branco e Jorge Mourato. Entre as duas cantoras, destaca-se ligeiramente a interpretação de Carolina Deslandes, o que é previsível dado ter alguma experiência anterior na representação.
O cenário peca por ser escuro, incluindo nas partes mais felizes da peça. Ainda assim, apresenta um formato original, suportado em prismas que rodam e trazem continuamente novas localizações ao espectador. Vamos entrando em novos locais e até novos países sem existirem grandes transições, e isso dá ao espetáculo uma dinâmica muito própria e com ritmo.
No que diz respeito à história, vamos sendo conduzidos por esta narrativa de amor complicada pelas consequências de viver num regime ditatorial, no Portugal antes do 25 de Abril. Porém, esta acaba por ser apenas uma desculpa para mostrar as complicações de ser jovem e de ter ideias naquela altura, de querer um país diferente e não saber como, de querer amar os pais, mas não os compreender, e sobretudo de querer ser livre.
“O amor também pode ser um ideal” é um dos motes do espetáculo, que termina com a conclusão que: “Nunca vamos ter a democracia que imaginámos”.
Existem lapsos na parte histórica do espetáculo, como o facto de a PIDE (Polícia Internacional e de Defesa do Estado) ser referida várias vezes quando a narrativa começa em 1971, altura em que esta autoridade já tinha sido substituída pela DGS (Direção-Geral de Segurança), existente entre 1969 e 1974, já no governo de Marcello Caetano.
Mas isto são apenas detalhes de uma narrativa que, no geral, apesar de não ser perfeita, faz jus à sua origem shakespeariana moldada pelas vivências de uma época pré-liberdade em que, quer escritor do texto, quer encenador, não viveram. Este é um musical feito em português e por portugueses, que ensina às novas gerações aquilo que foi Abril e como este não deve ser esquecido, mesmo que nunca tenhamos a democracia que queremos.
É importante realçar que, à exceção de Dinarte Branco, Maria Henrique e João Maria Pinto, os restantes atores em palco nasceram no pós-25 de Abril. No entanto, dão-no a conhecer como se lá estivessem, mostrando a quem ouve que talvez perceber Abril seja mais fácil a cantar.
Reforço a ideia de que este não é um musical de intervenção, não é um musical político, mas sim uma história de amor, que mostra a dificuldade que era viver num país em ditadura e num país em construção onde também as pessoas se tinham de reconstruir para uma nova realidade nunca explorada.
Para quem quer saber mais sobre este musical da Força de Produção e Primeira Linha, aconselho a leitura da reportagem do SAPO24 no ensaio de imprensa, onde mostramos os testemunhos do autor, Hugo Gonçalves, do encenador, Ricardo da Rocha, e de Bárbara Tinoco e Carolina Deslandes.
Este espetáculo vai estar em cena no Teatro Maria Matos, em Lisboa, até 28 de abril, os preços variam entre os 20 e os 25 euros, e os bilhetes podem ser adquiridos aqui.
Em maio, nos dias 30 e 31, ruma à cidade do Porto, onde estará no Coliseu Porto Ageas, com bilhetes entre os 15 e 35 euros, também já disponíveis aqui.
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