Este texto faz parte da rubrica Regresso a um Mundo Novo, em parceria com a plataforma 100 Oportunidades, em que vários jovens nos ajudam a pensar o mundo pós-pandemia.


A sensibilidade do turismo a eventos extraordinários bem como a sua crescente importância para a economia mundial fazem com que o futuro no setor esteja a ser equacionado com preocupação. Nos últimos anos, os economistas e outros cientistas sociais procuraram estudar o impacto que certos acontecimentos como grandes eventos desportivos e culturais, crises financeiras, catástrofes naturais, guerras, ataques terroristas (ou a ausência dos mesmos) e até a adesão à moeda única tiveram na capacidade de os países atraírem visitantes.

Também em Portugal, o turismo tem vindo a assumir uma relevância crescente. Em 2018, e de acordo com os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), o turismo valia quase 15% do PIB português e 8% do Valor Acrescentado, um aumento nominal de 7,7% e 8%, respetivamente, relativamente ao ano anterior. Em 2017, o emprego no setor representava 9% do total nacional, um aumento superior ao aumento do emprego na economia nacional face a 2016 (8,7% vs. 3,4%).

Num artigo recente, escrito em coautoria com Vitor Cavalcante (Nova SBE) e Paulo Rodrigues (Nova SBE e Banco de Portugal), procurámos entender o impacto do Brexit (e da consequente desvalorização da libra) neste setor e tirar lições para os próximos tempos. O Turismo britânico em Portugal tem sido, historicamente, um mercado fundamental para os operadores turísticos nacionais. As conclusões foram obtidas contrastando os resultados de duas técnicas estatísticas que permitem identificar a direção e a intensidade das relações de causa e efeito entre variáveis. Assim sendo, analisámos a evolução mensal, no período anterior e posterior ao referendo Britânico, do número de dormidas de cidadãos estrangeiros, por país de residência, em território português. Levámos ainda em conta, por exemplo, os efeitos de outras variáveis como a sazonalidade do turismo, os efeitos do ciclo económico e a variação regional.

As conclusões apontam para um crescimento 16% menor no turismo de cidadãos britânicos quando comparado com o que aconteceu com o número de dormidas médio proveniente dos restantes países da União Europeia. Esses efeitos não foram sentidos imediatamente a seguir ao referendo do dia 23 de junho de 2016, tendo demorado alguns trimestres a materializar-se. O país soube, nessa altura, diversificar os seus esforços, procurando atrair turistas em mercados mais longínquos e beneficiou ainda da queda do turismo no Norte de África.

No contexto da pandemia da COVID-19, os próximos tempos não serão, seguramente, fáceis para o setor. Segundo os dados da estimativa rápida do INE para março de 2020, o número de hóspedes fixou-se nos 701 mil e o número de dormidas em alojamento turístico em 1,9 milhões, situação que se deverá refletir em decréscimos de 49% e 59%, respetivamente, face ao mês homólogo do ano passado. Em relação ao segundo indicador, a estimativa indicia uma quebra semelhante por parte dos residentes (-57%) e dos não residentes (-59%).

Portugal pode e deve beneficiar da perceção de ser um “destino seguro”, seja do ponto de vista da segurança física (o país foi considerado o terceiro mais seguro do mundo segundo o Índice Global da Paz de 2019) como também da segurança sanitária. Também aqui é importante contrariar a dicotomia de Saúde vs. Economia. Neste contexto, gostaria de chamar a atenção para dois sinais de esperança para o setor, saiba ele reinventar-se, tal como conseguiu nos últimos anos, e tornar-se mais sustentável, mais local e menos massificado:

  1. A perceção de uma gestão da crise sanitária eficiente, principalmente quando comparada com o que aconteceu, até ao momento em que escrevo, com os nossos principais concorrentes como a Espanha, Itália e até a França, pode ser uma oportunidade para ganhar quota de mercado internacional. Neste âmbito, o jornal inglês The Telegraph apresenta mesmo “20 razões para voltar a Portugal quando tudo isto passar”.
  2. Portugal tem conseguido atrair reformados do Norte e Centro da Europa que procuram climas mais amenos, turismo de saúde e bons serviços geriátricos. Também para estes cidadãos, a perceção de uma gestão sanitária eficiente, num contexto extremamente difícil, pode ser um ativo marcante nos próximos anos.

Para mais informações sugere-se a leitura de “Lonely Planet: The Impact of Brexit on Tourism” de Vitor Cavalcante, Paulo Rodrigues e João Pereira dos Santos.

*João Pereira Santos escreve segundo o antigo acordo ortográfico  

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