O que se passa com os salários dos funcionários públicos?

António Moura dos Santos
António Moura dos Santos

Qual é o tema?

A Federação de Sindicatos da Administração Pública (Fesap) alertou no início da semana que as tabelas de retenção na fonte do IRS, da maneira como neste momento estão desenhadas, absorvem os aumentos salariais de milhares de funcionários públicos.

Hoje, após reunir-se em Assembleia Geral, exigiu ao Governo que corrija o que considera serem erros nas tabelas, pedindo também que se reduza o IRS.

Mas como é que as tabelas estão a afetar os trabalhadores?

O líder da Fesap, José Abraão, deu um exemplo à agência Lusa:

Um assistente técnico, que passou a receber 861 euros ilíquidos em janeiro (mais cerca de 104 euros face ao ano anterior), com os descontos de 11% para a Segurança Social e de 3,5% para a ADSE e "a retenção na fonte de IRS de 10%, vai levar menos um euro do que um assistente operacional que entra hoje a ganhar a base remuneratória, de 761,58 euros", não retendo IRS.

Na prática, "um assistente técnico com 10 anos de serviço recebe 650 euros em termos líquidos e um assistente operacional que entra hoje para a Administração Pública recebe 651,23 euros", disse José Abraão, defendendo que o Governo deve corrigir as tabelas de retenção na fonte.

Hoje deu outro exemplo, o dos assistentes operacionais que viram o seu salário bruto passar de 709 para 757 euros em 2022 (devido a uma valorização registada em junho) e que em janeiro deste ano passam a somar àquele valor mais 104 euros.

Para o dirigente sindical “não é compreensível” que “destes 150 euros de valorização, cerca de 100 euros vão para impostos e contribuições”. Ou seja, este trabalhador “vai ganhar mais em 2023 do que em 2022, mas fará sentido que com esta valorização de 150 euros, retire cerca de 100 euros para impostos e contribuições?”, questionou.

E agora?

Agora, na melhor das hipóteses, os trabalhadores públicos vão terminar janeiro com estas alterações visíveis na sua folha salarial, sendo que a Fesap considera que “não é razoável” nem “compreensível” que, após o aumento e valorização salariais que alguns destes trabalhadores vão ter este ano, fiquem a ganhar em termos líquidos menos que colegas recém-entrados na Administração Pública.

“A nossa preocupação será sempre corrigir as tabelas do IRS”, disse José Abraão, acrescentando que, a par desta, há também a “preocupação de continuar a sinalizar ao Governo que é preciso olhar para os salários, valorizando-os, mas também olhar para a redução da enorme carga fiscal” sobre os rendimentos do trabalho.

O objetivo é, precisou, “que o caminho que se pode e deve fazer [no âmbito do acordo plurianual que o Governo assinou com a Fesap e a frente sindical liderada pelo Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado], é este de valorizar os salários brutos, mas que isto tenha uma expressão com significado também nos salários líquidos”.

Que consequências pode esta situação ter para o Governo?

Perante o mar de contestação com que 2023 teve início, o Governo decerto quererá evitar abrir outra frente de conflito. É por isso que o ministro das Finanças, Fernando Medina, anunciou que vai reunir-se esta quarta-feira com as estruturas sindicais no sentido de discutir uma revisão das tabelas de retenção na fonte do IRS.

Deixar as coisas como estão pode abrir fendas no acordo plurianual que o Governo assinou em outubro com as estruturas sindicais da função pública da UGT, a Fesap e o STE, até porque ficou desde logo estabelecido que este acordo pode ser revisto sempre que haja "alteração substancial" das condições que levaram à definição das medidas.

A Fesap, de resto, avisou que nesta terça-feira iria analisar “o cumprimento dos restantes pontos do articulado, nomeadamente no que respeita à negociação das carreiras não revistas de grau de complexidade 2 e 3, uma vez que tarda em ser definido um calendário negocial com esse objetivo, algo que já devia ter sido feito ainda antes do final de 2022”.

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