Sr. Zelensky foi a Bruxelas. O que é que aconteceu — e o que falou com António Costa?

Qual é a notícia?

O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, teve uma receção digna de herói nesta quinta-feira, durante a visita às diferentes instituições da União Europeia (UE), começando pelo Parlamento Europeu, passando pelo Conselho Europeu e (já extra-UE) terminando no Palácio Real, onde se encontrou com o rei Philippe, da Bélgica.

Pelo meio, teve reuniões em separado com pequenos grupos de líderes europeus, já que não havia tempo para encontros bilaterais com os 27 dirigentes do bloco.

De recordar que ontem já tinha visitado o Reino Unido e a França (onde também conversou com Olaf Scholz), nesta que foi a sua segunda visita fora do país desde a invasão da Rússia. Como tal, a visita fez-se quase como de surpresa — não estava na agenda — e sob um forte dispositivo de segurança.

E como correu?

Vamos por partes. No Parlamento Europeu, Zelensky assegurou que a resistência da Ucrânia também é uma defesa do estilo de vida europeu.

"Estamos a defender-nos da força mais anti-europeia do mundo moderno. Estamos a defender-nos e estamos defender-vos", disse o presidente ucraniano, ao lado de Roberta Metsola, presidente do Parlamento Europeu.

"Quero agradecer a todos os que nos enviaram munições, combustível, equipamento. Quero agradecer-te especialmente a ti, Roberta [Metsola], como defendeste a forma de viver na Europa. Obrigado pela vossa energia e determinação. A vossa atenção reflete a Europa moderna, a Europa de paz e a forma de vida europeia, onde reina o Estado de direito e as fronteiras não são violadas e é possível passar de um país para o outro sentindo que não há fronteira. A Europa está a libertar-se da influência de oligarcas russos e a defender-se a si mesma. Com a ajuda de todos, que agradecemos, a Ucrânia vai vencer esta guerra . É a única forma de assegurar o modo de vida e os valores europeus", salientou, falando depois da entrada do seu país na União Europeia.

"A visão de ingressar na UE motiva o nosso povo a permanecer forte e a manter o rumo. A Ucrânia será membro de uma União Europeia que está a ganhar esta guerra. A Europa sempre será a Europa enquanto estivermos juntos e cuidarmos do modo de vida europeu. Para a Ucrânia, será um regresso a casa, um caminho para voltarmos a casa. Estou aqui para defender o regresso a casa dos ucranianos, para que possamos em conjunto beneficiar desse bem comum", salientou.

Seguiu-se então a sua presença no Conselho Europeu, a cimeira de líderes da UE, aos quais agradeceu pelo apoio recebido desde o início da guerra, em fevereiro do ano passado, mas aos quais insistiu em pedir celeridade na entrega de armas.

E o que foi dito?

"Agradeço-vos pessoalmente por este apoio inabalável ao meu país (...) Não se pode pensar em uma Europa livre sem a Ucrânia", disse o presidente ucraniano aos líderes da UE no Conselho Europeu.

Na sua mensagem aos dirigentes dos 27, no entanto, Zelensky reiterou o pedido por mais armas e para adicionar aviões de combate e mísseis de longo alcance aos pacotes de assistência militar.

"Quero agradecer-vos por compreender (...) quanto precisamos de canhões de artilharia, munições, tanques modernos, mísseis de longo alcance e aviões de combate modernos", enumerou o presidente. "Devemos ser mais rápidos que o nosso agressor", pediu.

E como respondeu a UE?

A presidente do Parlamento Europeu, por exemplo, apoiou explicitamente o pedido ucraniano.

Segundo Metsola, os países da UE "devem, agora, considerar fornecer sistemas de longo alcance e os caças de que vocês precisam para proteger essa liberdade que muitos consideram garantida". "A nossa resposta deve ser proporcional à ameaça. E a ameaça é existencial", acrescentou.

Já o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, disse, durante uma conferência de imprensa conjunta que "não é o momento de vacilar, é o momento de dar um apoio total".

Finalmente, Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, assegurou que "é necessário fazer mais" em apoio à Ucrânia.

“Vamos impor sanções a líderes políticos e militares. Mas também, caro Volodymyr, ouvimos muito atentamente as suas mensagens quando o visitámos na semana passada em Kiev, e vamos visar os propagandistas de [Vladimir] Putin, porque as suas mentiras estão a envenenar o espaço público na Rússia e fora. Insistiu nisso, nós ouvimos, vamos dar sequência e vamos atrás deles”, declarou Von der Leyen, dirigindo-se a Zelensky.

A presidente do executivo comunitário, que já dera conta da sua intenção de um décimo pacote de sanções estar pronto quando, a 24 de fevereiro, se assinalar o primeiro aniversário do início da guerra, acrescentou que “o pacote vai incluir proibições adicionais de exportações no valor de mais de 10 mil milhões de euros” e assim debelar ainda mais “a máquina de guerra da Rússia” e continuar a “abalar as fundações da sua economia”.

De resto, os dirigentes das instituições europeias foram bem mais assertivos do que os líderes dos países dos 27, o que não é de estranhar: se houve acordo para o envio de tanques pesados modernos, o pedido por aviões de combate tem sido recebido com maior cautela, já que há o entendimento de que isto pode representar uma escalada de proporções imprevisíveis no conflito.

António Costa, por exemplo, garantiu que Portugal vai enviar três tanques Leopard para a Ucrânia em março, mas descartou o envio de caças F16. "Estão todos alocados a missões de que não podemos prescindir", justificou Costa, salientando que os caças estão numa missão de cooperação com a Roménia.

E no que toca à entrada na União Europeia?

Zelensky continua a insistir fortemente sobre o tema, colocando como horizonte temporal este ano.

"A visão de ingressar na UE motiva o nosso povo a permanecer forte e a manter o rumo. A Ucrânia será membro de uma União Europeia que está a ganhar esta guerra. A Europa sempre será a Europa enquanto estivermos juntos e cuidarmos do modo de vida europeu. Para a Ucrânia, será um regresso a casa, um caminho para voltarmos a casa. Estou aqui para defender o regresso a casa dos ucranianos, para que possamos em conjunto beneficiar desse bem comum", reforçou no discurso ao Parlamento Europeu.

O tema, porém, arrisca-se a ficar em “águas de bacalhau”, já que os líderes do bloco têm sublinhado que o processo de entrada é extraordinariamente complexo e normalmente demora vários anos, em alguns casos mais de uma década.

No rascunho da declaração, a UE "reconhece" os esforços da Ucrânia para a adesão e estimula o país "a continuar neste caminho e a cumprir as condições" estabelecidas pela Comissão Europeia — mas não se compromete com uma data.

Foi referido acima que Zelensky se reuniu com líderes europeus — Costa inclusive?

Sim. Reuniu-se às 17:25 horas locais (16:25 de Lisboa) com António Costa e os líderes de Bélgica, Irlanda, Luxemburgo, Malta e Lituânia.

À chegada ao Conselho, e quando questionado sobre qual a mensagem que iria transmitir a Zelensky, Costa respondeu que iria reiterar “todo o apoio à luta que a Ucrânia está a travar”, pois “seria uma tragédia para o mundo se o resultado desta guerra fosse uma vitória” da Rússia, o país agressor e que está “contra o direito internacional”, desrespeitando “o direito à integridade dos territórios, o direito de soberania dos povos, o direito à autodeterminação de cada uma das nações”.

E o que foi discutido?

Além de disponibilizar a rede de embaixadas e consulados para dar apoio logístico a ações diplomáticas que a Ucrânia queira desenvolver, António Costa garantiu ainda a Volodymyr Zelensky o contributo português em três temas: segurança alimentar, segurança energética e combate ao ecocídio, isto é, a destruição dos recursos naturais, e manifestou-se disponível para participar na fórmula de paz desenhada por Kiev.

No encontro com Zelensky, na quarta ronda de encontros multilaterais à margem da reunião do Conselho Europeu, o primeiro-ministro português considerou, segundo a mesma fonte, “fundamental evitar efeitos colaterais indesejados das sanções, como na segurança alimentar”.

No que respeita ao alargamento da União Europeia à Ucrânia, António Costa disse que Lisboa está “disponível para continuar a apoiar”, salientando que o trabalho de casa não está só do lado de Kiev, a UE tem também de se preparar “a nível institucional e orçamental”.

A mesma fonte adiantou que António Costa ofereceu a Volodymyr Zelensky uma fotografia de um mural em Kiev da autoria do artista português Alexandre Farto, conhecido como Vhils, de Serhiy Nigoyan, o primeiro ativista morto durante a onda de protestos verificada na Ucrânia, em 2014, a reclamar a integração europeia. O primeiro-ministro partilharia mais tarde esse presente na sua conta oficial de Twitter.

*com agências

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