“O maior sinal da irreverência do projeto Bons Sons é os projetos musicais que trazemos, inovadores e atuais, nomes consagrados e projetos novos - e nós gostamos muito -, também apoiados nesta ideia da diversidade, versar sobre esta questão da diversidade estilística e artística. A música é diversa e é possível uma pessoa gostar de estilos completamente diferentes e conviver com pessoas completamente diferentes, e isso é bastante significativo para nós”, disse hoje à Lusa Miguel Atalaia, diretor artístico do festival Bons Sons, no arranque de um evento que assinala 18 anos e que tinha já, a meio da tarde, os passes gerais "praticamente esgotados".
Até domingo são esperadas 35 mil pessoas, a maioria delas já instaladas nos diversos parques de campismo em Cem Soldos, no distrito de Santarém, num festival que tem a particularidade de ser feito em comunidade, envolvendo toda uma aldeia de 700 habitantes, com 10 palcos espalhados pela localidade e com uma escolha transversal de artistas na música portuguesa.
Na aldeia-festival, o seu perímetro delimita o recinto que acolhe 10 palcos integrados nas ruas, praças, largos, auditório, igreja e até em garagens e lagares, com o cartaz, que assinala os 18 anos do Bons Sons, a integrar nomes como os de Gisela João, Valete, Club Macumba, Adiafa, Estilhaços, The Legendary Tigerman, Ana Lua Caiano, Rafael Toral, Cara de Espelho, a guitarrista Luísa Amaro e o Coro das Mulheres da Fábrica, entre muitos outros, a par de dança, teatro, cinema, jogos tradicionais, gastronomia, e atividades para todas as idades.
Maria Silva e Katrine Pieper, de 41 e 49 anos, respetivamente, vieram de Coimbra “para apreciar a aldeia, atuar, acampar e curtir”, estando a meio da tarde a “explorar” Cem Soldos, uma pequena localidade transformada num imenso palco e que as duas amigas, que fazem parte do Coro das Mulheres da Fábrica, vão pisar na dupla condição de festivaleiras e artistas.
“Vamos atuar no sábado mas decidimos vir acampar os quatro dias para conhecer o festival e usufruir deste conceito de aldeia manifesto”, disse à Lusa Maria Silva, estreante no Bons Sons.
Já Katrine Pieper, por sua vez, destacou do Bons Sons os “conceitos ambientais” e a “celebração da ruralidade”, tendo estado em Cem Soldos pela primeira vez em 2011, então integrada numa equipa dos cerca de 100 voluntários que se juntam aos 700 habitantes da aldeia na construção e realização do festival.
De Pedrógão Grande vieram Raquel Alves e Hugo Neves, que estacionaram a autocaravana em Cem Soldos, “para participar no evento até ao final” e “usufruir de tudo” o que a aldeia oferece por estes dias.
“O conceito do festival é o que mais me cativa, em termos gerais. Já tinha ouvido falar muito bem, e com a panóplia de artistas portugueses em cartaz é juntar o útil ao agradável”, disse à Lusa Raquel Alves, que se estreia no Bons Sons e que estava acompanhada de Hugo Neves, a quem convidou e ofereceu um passe geral para o evento.
“Eu estive cá no ano passado e posso dizer que já fui a muitos festivais mas este é completamente diferente, num ambiente intimista, com concertos fantásticos e com um conceito de aldeia em manifesto que me cativa muito”, declarou Hugo Neves, antes de se embrenhar pelas praças e ruas de Cem Soldos com a sua parceira de festival.
Com o mote "Viver a Diversidade" nos 50 anos do 25 de Abril, o festival Bons Sons regressa este ano com “um largo renovado” e com “novos desafios”, mantendo a máxima "Vem Viver a Aldeia", conceito que norteia o festival desde a sua génese e que a organização acredita poder “contagiar” outros lugares, declarou Miguel Atalaia.
“Acreditamos que é possível criar aldeias vivas, com dinâmica, com capacidade criativa e capacidade coletiva e, acima de tudo, com relações. Isso é, talvez, o que mais nos diferencia e queremos contagiar outros lugares”, afirmou o diretor artístico, tendo lembrado a criação de um manifesto em 2019 - “uma bússola com 10 pontos” -, que “toca em áreas tão diversas do desenvolvimento local e das comunidades, como o envelhecimento, a educação, o território e a ecologia”, entre outras.
“A partir desse manifesto reforçámos o conceito já antigo do ‘Vem viver a aldeia’, porque, mais do que assistir a concertos, é viver este ambiente, e este ano falamos de viver a diversidade porque acreditamos que as comunidades são mais ricas, resilientes, coesas e capazes, se tiverem pessoas diversas”, afirmou.
Organizado desde 2006 pelo Sport Clube Operário de Cem Soldos (SCOCS), o Bons Sons manteve-se bienal até 2014, passando depois a realizar-se anualmente, “mantendo uma programação exclusiva da música portuguesa, completamente aculturada e diversa, como é o nosso hábito”, sublinhou o diretor artístico do evento, numa referência à capacidade de se abrir e adaptar a outras culturas.
O festival regressa este ano depois de uma paragem devido a obras de requalificação urbana do Largo do Rossio, área habitualmente ocupada pelo festival, que surge nesta edição completamente renovado.
Mário Rui Fonseca, da agência Lusa
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