Livros: Apeirogon – Viagens Infinitas, O Infinito num Junco, O Torto Arado, Pequenas Cadeiras Vermelhas
Convidada: Sandra Barão Nobre, escritora e biblioterapeuta
Moderadores: Elisa Baltazar e João Dinis, anfitriões do “É Desta Que Leio Isto”
Data: 22 de julho de 2021
Ouça aqui a conversa com Sandra Barão Nobre:
Não conseguiu estar presente na última sessão do “É Desta Que Leio Isto”? Neste artigo poderá ler um resumo do encontro e ouvi-lo na íntegra no áudio acima. A conversa girou em torno da biblioterapia, desconhecida por muitos, e de livros aos quais devemos dar uma oportunidade durante estas férias de verão, já que, normalmente, é uma altura em que podemos colocar as leituras em dia. Para nos ajudar nesta seleção, ouvimos Sandra Barão Nobre, escritora e biblioterapeuta.
Sobre a convidada – Sandra Barão Nobre:
- Tem como formação-base o curso de Relações Internacionais, mas ler e ajudar os outros através da leitura está-lhe no sangue e é por isso que é biblioterapeuta
- A biblioterapia é, nas palavras de Sandra Barão Nobre, um “método de apoio ao desenvolvimento pessoal e à resolução de problemas através dos livros”.
- Em contexto de terapia feita através da leitura, Sandra Barão Nobre faz um “levantamento das preocupações e objetivos” de cada pessoa, e elabora uma lista de livros para a mesma. A biblioterapeuta explica que não dá “pistas” sobre o porquê de escolher certos títulos, uma vez que é a pessoa sujeita a terapia que tem de tirar as suas próprias conclusões.
- A convidada é autora e já viajou por vários continentes a fim de escrever sobre os mesmos.
Sobre os livros:
O Infinito num Junco - Irene Vallejo
- Foi “das melhores coisas” que Sandra Barão Nobre leu nos últimos anos.
- Segundo a biblioterapeuta, “é um daqueles livros que tem livros dentro”, uma vez que nos vai dando outras sugestões de livros complementares.
- Fala sobre a origem da escrita e “as nossas motivações enquanto espécie” para inventar algo tão importante como a escrita, que marca a distância “entre a pré-história e a história”.
- A obra foca momentos tão importantes da história da escrita quanto os papiros, a primeira biblioteca em Alexandria, o trajeto até o livro ser um objeto como hoje o conhecemos, entre outros.
- Segundo Sandra Barão Nobre, este será um “livro para leitores apaixonados por leitura”. No entanto, e apesar de poder ser mais exigente para pessoas sem tantos hábitos de leitura, é escrito de forma bastante leve e nada “pedante”.
O Torto Arado – Itamar Vieira Junior
- Define-se, segundo a biblioterapeuta, como “um manifesto político, que nos permite abarcar as consequências de um passado histórico no Brasil, profundamente ligado àquilo que foi o império colonial português e a questão da escravatura”.
- É um livro que fala sobre “injustiça”, mas que, diz Sandra Barão Nobre, nos dá uma certa satisfação devido a um ponto de viragem na narrativa que deixa “um travo de vingança”.
- “Fica essa vontade de mais ajustes de contas e de se ver no Brasil uma sociedade mais equitativa”, diz a biblioterapeuta, que acrescenta a urgência de ler esta obra no contexto do Brasil atual, sob a presidência de Jair Bolsonaro.
- Sandra refere ainda que “os livros não são um produto estanque” e há “conjunturas literárias” que abrem o apetite por certos estilos de livros. O panorama que se vive no Brasil será um bom pretexto para dar uma oportunidade a O Torto Arado e perceber que há problemas que persistem no país.
- Ainda sobre a transversalidade da mensagem literária, a biblioterapeuta dá um exemplo bem atual e diz que “este livro tem um ingrediente muito da nossa época: a exploração da relação do homem com a natureza e as alterações climáticas”.
- A obra recebeu o Prémio Leya, em Portugal, e o Prémio Oceanos, no Brasil.
Pequenas Cadeiras Vermelhas – Edna O’Brien
- O título do livro remonta ao período de guerra associado ao desmembramento da antiga Jugoslávia, nos anos 90, e é uma alusão a uma instalação de que se fez em Sarajevo, na Bósnia. Foram colocadas 11 mil cadeiras na rua, a simbolizar o número de mortos no conflito, sendo que 343 eram mais pequenas e simbolizavam a morte de crianças.
- Nas palavras de Sandra Barão Nobre este “é um livro que fala de como alguns eventos e coisas traumáticas que acabam por contaminar pessoas de outras paragens”.
- A autora convidada, frisa ainda o facto de esta “história ser muito vivida no feminino”, uma vez que relata “a violência vivida pelas mulheres, interpretada pelas mulheres, digerida pelas mulheres” e “reflete sobre as questões das mulheres migrantes, do refazer e recomeçar a vida”.
- Sandra Barão Nobre alerta, no entanto, para o facto de este ser “um livro muito violento”, por isso talvez não possa ser lido de rajada.
Apeirogon – Viagens Infinitas – Colum McCann
- Finalista do Booker Prize em 2020, esta é uma obra, diz Sandra Barão Nobre, “cheia de cultura geral”, tanto ligada à história da zona em que decorre a ação - Israel e Palestina - como relativa a detalhes muito específicos que nos ajudam a perceber os vários momentos da narrativa.
- O livro é baseado numa história real, com algumas pinceladas de ficção, e centra-se em dois pais, um israelita e outro palestiniano que, apesar das diferenças óbvias que fazem perdurar o conflito israelo-palestiniano, têm uma coisa em comum: ambos perderam uma filha na guerra e conhecem-se cientes de que partilham a mesma dor, acabando por se unir devido a essa circunstância.
- Estes dois homens, faz notar a biblioterapeuta, “tinham tudo para querer vingança”. Mas “fazem parte de uma associação que advoga arranjar uma solução para este conflito” e, através do diálogo, encontrar uma solução para que estes dois povos vivam no mesmo território de forma equitativa. Deste modo que, hoje em dia, estes dois pais, cujas filhas perderam para a guerra, viajam pelo mundo e fazem palestras sobre a via do diálogo como solução para o conflito israelo-palestiniano. É neste cenário que o The Guardian descreve este livro como uma obra capaz de "mudar o mundo".
- “Apeirogon” é a palavra grega que define um poliedro de faces infinitas e foi escolhida para título desta obra porque nos permite olhar o conflito de múltiplas perspetivas e sem tomar "o lado de ninguém”.
- Este é um livro volumoso, com cerca de 1001 capítulos, referentes às 1001 noites. No entanto, alguns destes capítulos são muito pequenos, pelo que esta obra se torna bastante fácil de ler.
- De relembrar que, no conto das 1001 noites, havia um rei que matava as mulheres com quem se envolvia. Mas uma, mais astuta, Xerazade, teve a ideia de contar histórias fascinantes ao rei, uma por noite, de modo a que este tivesse sempre vontade de ouvir a próxima e não a quisesse matar. Esta referência é utilizada na obra como forma de permitir que também as filhas dos dois protagonistas desta história, vítimas inocentes, se mantivessem vivas de alguma forma.
Outros livros abordados:
- A Peste – Albert Camus
- 1984 – George Orwell
- Seara Vermelha – Jorge Amado
- Crónicas do Mal de Amor – Elena Ferrante
- Até Sempre, Mulherzinhas – Marcela Serrano
- Cinzas – Grazia Deledda
- Biblio/ Poetry Therapy: The Interactive Process: a Handbook – Arlene McCarty Hynes
- Uma Volta ao Mundo com Leitores – da convidada, Sandra Barão Nobre
- Três Vezes Irão – da convidada, Sandra Barão Nobre
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