As Academias de Portugal apelam ao ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (MCTES) que “evite uma crise do futuro”. E afirmam que não podem “deixar que nenhum estudante abandone os seus estudos” — o que criaria uma crise no futuro.

No documento a que o SAPO24 teve acesso, os estudantes pedem o reforço e adaptação do sistema de ação social para combater as dificuldades no pagamento de rendas e outras despesas associadas ao Ensino Superior.

Defendendo a importância de respostas “o mais concertadas possível”, pedem que “cada um possa cumprir o seu papel”.

“Desde a suspensão das atividades letivas presenciais as Instituições de Ensino Superior, os docentes e os estudantes cumpriram o seu papel: efetuar uma transição o mais rápida possível para um ambiente de ensino à distância e assegurando que a transmissão de conhecimento continuava mesmo fora do cenário a que todos estávamos habituados. Não foi certamente fácil, mas o esforço conjunto permitiu o obstáculo tivesse sido ultrapassado”, escrevem os estudantes.

“Este novo cenário de ensino levantou uma série de questões de âmbito académico bastante complexas que competem às mesmas [Instituições de Ensino Superior] resolver. Cremos que, mais uma vez, o esforço conjunto será a resposta para este problema”.

Antes de as aulas presenciais terem sido suspensas por ordens do governo, já as universidades aplicavam, de forma descoordenada, medidas de contingência.

Todavia, a suspensão trouxe novos desafios aos estudantes: desde estágios cancelados a dissertações que devem ser reformuladas para se adaptarem ao teletrabalho.

Disso mesmo fala a carta, que lembra ainda que a “suspensão de atividades letivas presenciais e o período de isolamento em que a generalidade da comunidade académica se colocou levantaram problemas também fora do âmbito académico”.

“Revelam-se dificuldades de alguns estudantes em terem acesso a equipamentos informáticos e internet, essenciais para acederem aos conteúdos lecionados”, explicam.

Para além disso, “a diminuição de rendimentos de muitas famílias irá criar dificuldades no pagamento de rendas e de outras despesas associadas à frequência do ciclo de estudos. E estas dificuldades prolongar-se-ão durante tanto tempo se prolonguem as dificuldades das famílias de cada estudante”.

Apesar de os reitores terem afirmado que o ensino à distância se mantém, o SAPO24 sabe que há unidades curriculares nalgumas faculdades que não estão a ter aulas — para além das componentes laboratoriais, que também se encontram suspensas.

O ministro prometeu ações, mas a resposta “é exatamente nenhuma”

No Dia Nacional do Estudante (24/03), Manuel Heitor garantia não só “o normal funcionamento dos pagamentos de bolsas e contratos de investigação, das bolsas de estudo de ação social e respetivos complementos e benefícios e das bolsas de estudo de apoio à realização de períodos de estudos em mobilidade”, mas também “os apoios sociais de emergência” para fazer face a “um período de eventuais novas dificuldades económicas para as famílias”.

“Outras eventuais situações de emergência serão analisadas sempre que seja necessário. O objetivo será sempre de garantir que todos os estudantes têm condições para prosseguir e/ou continuar os seus estudos superiores”, dizia o ministro, numa carta  enviada aos estudantes, no dia 23 de março.

Os dirigentes dizem ter ficado “esperançosos” com o cenário de “uma resposta musculada por parte do Sr. Ministro”. Porém, “quase uma semana depois a resposta por parte do MCTES para este problema é exatamente nenhuma”, acusam.

“No início desta carta dissemos ser importante reconhecer que todos têm o seu papel no meio desta crise. O sistema de ação social, o seu reforço e sua adaptação a novos cenários é responsabilidade de V. Exa.. As IES e as estruturas académicas tudo têm feito para resolver todos os problemas que surgiram desta brusca mudança mas não nos peçam para fazer tudo”.

“O que pedimos, Sr. Ministro, é uma resposta”, escrevem os dirigentes das federações académicas. Reconhecendo que o momento atual é “de dificuldade”, disponibilizam “total colaboração” com o Governo.

O documento é subscrito também pelos presidentes das federações académicas da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, da Universidade do Minho, da Universidade de Aveiro, da Universidade da Beira Interior, da Universidade do Algarve, da Universidade de Évora e da Associação Académica de Lisboa.

Propinas mantêm-se, mesmo sem todas as aulas

Na semana passada, os reitores das universidades decidiram manter o pagamento das propinas, mesmo sem aulas presenciais. Todavia, garantem estar atentos e preparados para apoiar os alunos que possam vir a ser financeiramente afetados pelos efeitos da pandemia da covid-19.

Para o presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), António Fontainha Fernandes, não fazia sentido naquele momento suspender ou reduzir o valor das propinas. No entanto, António Fontainha Fernandes sublinhava que as instituições estão atentas e preparadas para acionar os serviços de ação social caso haja algum aluno que precise. Uma prática que já vem sendo habitual nas instituições.

“Existe uma dimensão social do problema que está a ser acautelada também pelo Governo que lançou um conjunto de medidas para prevenir o impacto da pandemia”.

 Instituições é que decidem sobre as práticas pedagógicas

Na passada quinta-feira, o ministério do Ensino Superior reforçou que são as instituições que decidem sobre as práticas pedagógicas e de ensino, depois de os professores terem acusado o Governo de falta de medidas.

“As práticas pedagógicas e de ensino/aprendizagem no ensino superior, incluindo o acesso a mecanismos de avaliação contínua ou a épocas de exames, são matérias que se enquadram no âmbito exclusivo da autonomia pedagógica das Instituições de Ensino Superior (IES)”, referia o gabinete de imprensa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (MCTES), numa nota enviada para as redações.

Os professores do ensino superior queixaram-se da falta de "medidas concretas por parte do ministro Manuel Heitor, considerando que tem mantido uma incerteza sobre inúmeras questões.

“Devia haver mais coordenação a nível nacional. Neste momento temos universidades com decisões diferentes perante problemas iguais e, mesmo dentro da mesma instituição, temos departamentos a decidir de forma diferente”, lamentou o presidente do Sindicato Nacional do Ensino Superior (SNESup), Gonçalo Leite Velho, citado na altura pela agência Lusa.

Sublinhando a autonomia das instituições, o Ministério garantia que tem acompanhado a situação que se vive neste momento devido à pandemia da covid-19.

O ministro “tem estado em permanente articulação com o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas e o Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos, através dos seus presidentes e de muitos dos dirigentes das instituições, tendo em vista garantir a maior normalidade possível no funcionamento das instituições”, referia o gabinete de imprensa.

Além destes contactos, também tem havido um “contacto direto com responsáveis a nível europeu para articular todas as ações que têm sido e terão de ser implementadas”.

A tutela lembrava ainda que as Instituições de Ensino Superior estão mobilizadas para garantir as condições ao desempenho académico dos estudantes, incluindo a facilitação das condições necessárias para os estudantes prosseguirem os estudos e terem a avaliação da sua aprendizagem.

“O nosso objetivo comum só pode ser de que nenhum estudante saia prejudicado no seu desempenho académico”, sublinhava o ministério, lembrando um conjunto de iniciativas lançadas para fazer face à pandemia da covid-19, tais como alterar a legislação para permitir que as reuniões de júri sejam realizadas por videoconferência e através de meios eletrónicos, para que os alunos possam terminar os seus ciclos de estudo.

Também no caso dos estudantes que estavam no estrangeiro, o Governo contactou os alunos para perceber se queriam regressar ao país, tendo sido dada “prioridade ao contacto com cerca de 540 estudantes que se encontravam em mobilidade na Itália”.

Por outro lado, as regras do Erasmus + Educação e Formação foram flexibilizadas para que os alunos pudessem suspender o programa sem serem prejudicados.

A tutela lembrava ainda que, apesar da suspensão das aulas presenciais, as instituições de ensino superior mantiveram abertas cantinas e alojamentos para responder aos estudantes deslocados que não tinham condições de regressar a casa, quer dentro do país quer fora.

*Com Lusa