“Do nosso ponto de vista, lendo a Constituição, pensando nas regras gerais da interpretação das leis, parece-nos que a interpretação de lei de 95 tem de ser uma interpretação razoável”, respondeu, após questionado sobre que consequências o Governo irá retirar quanto à situação do secretário de Estado da Proteção Civil, cujo filho é sócio de uma empresa que tem negócios com o Estado.

Para o ministro dos Negócios Estrangeiros, o caso do filho do secretário de Estado “é um caso típico que mostra bem o absurdo de uma interpretação literal da lei que esquecesse o princípio constitucional da proporcionalidade”.

À margem de uma cerimónia de assinatura de dois protocolos, em Lisboa, o ministro foi questionado diretamente se esta situação fragiliza o Governo, tendo respondido que “não”.

“O que fragilizaria o Governo seria o Governo não cumprir a Constituição, o que fragilizaria o Governo seria o Governo interpretar as leis sem ter em conta o princípio constitucional de interpretação das leis, o que fragilizaria o Governo é, confrontado com uma dúvida, o Governo não tivesse pedido um parecer à entidade que, junto do Governo, o pode auxiliar nas interpretações da lei, que é o Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República”, salientou.

Aos jornalistas, Augusto Santos Silva assinalou também que “o que fragilizaria o Governo era se o Governo se desviasse para estas questões, esquecendo aquelas que são as responsabilidades enquanto executor das políticas públicas e responsável e tutela da administração pública”.

“Na perspetiva do Governo nós devemos olhar para esta questão, e todas as outras, com razoabilidade, com bom senso, com o sentido da proporcionalidade, porque são essas as determinações da Constituição, devemos fazer uma leitura das leis conforme os princípios de interpretação das leis, quando temos dúvidas devemos perguntar a quem nos pode auxiliar, designadamente a Procuradoria Geral da República, e devemos sempre ser claros e não confundir as coisas”, vincou.

Na ótica do ministro dos Negócios Estrangeiros, “nenhuma norma do código de conduta está a ser violada, pelo contrário, o código de conduta está a ser cumprido” e advogou que “a interpretação literal, fechada, da lei de 95 conduziria ao absurdo”.

Na terça-feira o primeiro-ministro decidiu solicitar um parecer ao Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República para "completo esclarecimento" sobre os impedimentos de empresas em que familiares de titulares de cargos políticos tenham participação superior a 10% do capital.

“Vamos aguardar com serenidade”, disse, insistindo que, para o Governo, “o ponto essencial é que um titular de cargo político ou alto cargo público não pode tirar vantagens para a sua família em função do cargo que exerce”.

A lei das incompatibildades e impedimentos tem estado, nos últimos dias, no centro do debate político, devido à polémica das notícias em torno do filho do secretário de Estado da Proteção Civil que, através de uma empresa em que é acionista, fez três contratos com o Estado.

De acordo com a lei em vigor, as empresas de familiares de titulares de cargos políticos e públicos com mais de 10% do capital não podem fazer contratos com o Estado, podendo ter como consequência legal a demissão do titular desse cargo.

Na segunda-feira à noite, o Observador, e depois o JN, noticiaram que o filho de Artur Neves era sócio de uma empresa, com 20% do capital, que fez três contratos públicos com o Estado já depois de o pai ter assumido o cargo de secretário de Estado, o que contraria a lei das incompatibilidades e pode ditar a demissão do governante.

Já na terça-feira, José Artur Neves explicou-se e disse que não teve qualquer influência nem estabeleceu qualquer contacto que pudesse resultar em expectativa de favorecimento pessoal do filho e da sua empresa, motivo pelo qual se mantém no cargo.

Hoje, a imprensa dá conta de que também os ministros Pedro Nuno Santos (Habitação e Infraestruturas), Francisca Van Dunem (Justiça) e Graça Fonseca (Cultura) têm familiares que assinaram contratos com o Estado.