Há que reconhecer: Donald Trump é imparável. Começou tarde a sua candidatura a candidato republicano , ridicularizado pelos democratas, que o viam como uma caricatura, e desprezado pelos próprios republicanos, que não o identificavam com os seus valores. Os grandes mecenas do partido, os irmãos Koch (petróleo, químicos, energia, etc.) e Sheldon Adelson (o maior dono de casinos do mundo, inclusive em Macau) achavam-no incontrolável, e os republicanos tradicionais tinham-no como profano. Entrou com o seu dinheiro, disse todos os disparates e inconveniências que se podem dizer, e foi arregimentando uma espécie de culto, primeiro entre os racistas e demais grupos perigosos, depois na multidão de cidadãos que acha que o mal do país está no abandono dos princípios originais que o criaram – empreendedorismo, livre iniciativa, sucesso, consumismo.

Do lado democrata, a luta entre uma candidata de que ninguém gosta, Hilary Clinton, e um candidato demasiado esquerdista, Bernie Sanders, está a provocar um desgaste que, para lá da indecisão sobre quem será o escolhido para concorrer, também está a aumentar as possibilidades do arrogante ruivo que quer muralhar a América, expulsar os imigrantes e fazer os aliados estrangeiros pagar as despesas militares do imperialismo americano.

A não ser que surja alguém na convenção do partido suficientemente convincente – e não há ninguém à vista – a nomeação de Trump é inevitável.

Ou, a não ser que o último escândalo que envolve o milionário seja a gota de água. Não só entre o eleitorado, mas também do ponto de vista jurídico, uma vez que estão a decorrer processos judiciais que até dão direito a prisão. A história chegou à comunicação social e às redes sociais na semana passada e tem desenvolvimentos imediatos. O nome do golpe é Universidade Trump e existe desde 2005.

Trata-se de um esquema fraudulento para enganar os incautos em que até os próprios funcionários da operação estão a testemunhar contra Trump. Neste momento há processos a decorrer em dois estados. Na Califórnia, a queixa foi apresentada por alguns dos "alunos" enganados pela "Universidade"; em Nova Iorque pelo próprio Procurador Geral do Estado, Eric Schneiderman. Em ambos os casos alguns empregados da instituição estão a colaborar com a justiça.

Primeiro, o nome: para ser uma Universidade é necessário um registo legal, dependente de uma série de critérios. A operação de Trump não está registada como tal em parte alguma. Na verdade nem tem nenhum registo especial, é apenas um negócio como uma pastelaria ou outro qualquer.

Depois, o currículo: um "curso" básico são três dias – sim, três dias para obter o diploma. A pós graduação leva uma semana e o doutoramento consume mais outra. Há ainda vários seminários, ou cursos facultativos, mas recomendados. E como se chama a especialidade ensinada? De acordo com os documentos entregues nos tribunais, o aluno bem sucedido, isto é, o que frequentar todas as aulas e seminários e pagar as propinas, fica formado em Investimento Imobiliário e doutorado em Investimento Geral.

Em terceiro lugar, o currículo do curso. Embora a instituição tenha como fim ensinar os alunos a investir em imobiliário, na realidade o que faz é vender os seus vários cursos motivacionais, com dicas simplórias, por preços exorbitantes. Ronald Schnackenberg, um dos ex-professores/vendedores testemunhou que a única coisa que os seus superiores queriam saber era quantos cursos seguintes ele tinha vendido, dentro de um sistema progressivo em que cada seminário é mais caro do que o anterior.

Conforme anotou para os autos o Procurador Geral Schneiderman, os três dias iniciais são gratuitos, para convencer os incautos a comprar o "seminário" seguinte, que custa mil e quinhentos dólares. Na aula, "professores" afirmam: "Trump, o mais famoso empreendedor no mundo, vai partilhar consigo o seu método para investir nas condições únicas do presente mercado imobiliário".

Um folheto diz que Trump escolheu pessoalmente os professores, quando na realidade ele não só não escolheu ninguém como nunca aparece nas aulas, nem nenhuma técnica sua é ensinada. O material didáctico utilizado foi produzido por uma empresa especializada em conteúdos para "oradores motivacionais" e empresas de "time-share".

O mais próximo do milionário que os alunos ficam é a oportunidade de serem fotografados ao lado de uma fotografia de Trump montada em cartão.

Aliás, o sistema tem muito a ver com os métodos de "time-share": durante o primeiro segmento do curso, que são os tais três dias gratuitos, os professores dizem às pessoas que deveriam comprar cursos opcionais que podem chegar aos 35 mil dólares. Os professores recebem formação para criar uma ligação emocional com os alunos, de modo a convencê-los a dar o passo seguinte. Quando o problema é o custo, também têm respostas preparadas, incluindo como usar o cartão de crédito ou pedir um empréstimo para estudos ao seu banco. O programa mais caro chamava-se "Elite de Ouro" e a conversa é que quem não conseguie financiar esta quantia também nunca poderá pertencer à Elite de Ouro da Economia.

Inquirido sobre a sua "universidade", Trump já disse que não fez nada de ilegal e que os "consumidores" têm mostrado uma alta aprovação dos cursos; como prova, cita uma página da Internet feita pelos seus serviços, 98percentapproval.com, onde se podem ler testemunhos laudatórios e, por acaso, críticas ao Procurador Geral de Nova York. Finalmente, afirmou que está desejoso que o caso seja julgado, para poder mostrar a verdade em tribunal.

Há um aspecto desta história a considerar; até agora os adeptos de Trump parecem ignorar completamente as suas quatro falências, os vários esquemas de que já foi acusado e, evidentemente, as suas afirmações mais chocantes. Contudo, se há uma situação que costuma cair muito mal na opinião pública americana, são os esquemas de conto do vigário para extorquir dinheiro às pessoas.

Clinton e a imprensa de esquerda, como o site "Politico" e a revista "The New Republic", estão a levantar esta história como uma última prova de que Trump é um vigarista e não tem pejo explorar os mais débeis economicamente. E é mesmo a última: se a Universidade Trump não causar repúdio entre os eleitores mais moderados, nada os impedirá de votar no homem que quer "tornar a América grande novamente".