Mais de 559 horas. Qualquer coisa como 23 dias. Este seria o tempo necessário para percorrer a pé os cerca de 2740 km que separam Oklahoma City de Oakland, trajecto feito por Kevin Durant quando, no início da época que agora terminou, decidiu trocar os Thunder pelos Golden State Warriors. O rapaz até é magro, mas não por ter ido a pé.

Aliás, quando saiu de OKC, fugiu a sete pés. Pernas, para que vos quero?

O que interessa é que chegou ao destino e se 23 dias parece muito tempo, imaginem 365. Uma eternidade. Foi o tempo que os Warriors tiveram que esperar para voltar ao local onde tinham sido infelizes: as Finais da NBA. Mas desta vez reforçados com Durant, o exorcista.

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Vamos fazer aqui uma pausa nesta crónica e perceber o elevado potencial de comicidade que teria um exercício de comparação entre o filme “O Exorcista” de 1973 e os Golden State Warriors de 2017. Lembram-se da cena da “menina-aranha” no filme, em que a personagem Regan desce as escadas de costas e apoiada nas mãos e nos pés? Durantula. Lembram-se da outra cena em que Regan agride o seu próprio órgão genital com um crucifixo? Draymond Green. Lembram-se de Regan a levitar sobre a cama e a atirar objectos a quem entra no quarto? Os alley-oops de JaVale McGee. Fiquem com estas ideias.

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Voltemos, então, à crónica e ao exorcista de Oakland. Porque foi esse papel que Kevin Durant assumiu neste filme. E os demónios que habitavam na Oracle Arena foram todos expulsos, sobretudo o fantasma dos Cleveland Cavaliers e a sua histórica recuperação de 1-3 para 4-3 nas Finais da época anterior. Desta vez, e após um duplo triunfo relativamente fácil em casa, os Warriors chegaram aos 3-0 graças a mais uma grande exibição de Durant (31 pontos, 9 ressaltos, 4 assistências, 56% de eficácia), que sentenciou o encontro com um lançamento triplo que fica para a História.

Daí até ao 4-1 definitivo foi um passo e é com a imagem do número 35 dos Warriors agarrado ao troféu de MVP das Finais (médias de 35.2 pontos, 8.4 ressaltos e 5.4 assistências) que nos apercebemos da quantidade de demónios exorcizados por KD.

Deixou de se falar da perda de protagonismo de Steph Curry e da dificuldade de coabitação com Durant, já que o base fez médias extraordinárias de 26.8 pontos, 8.0 ressaltos e 9.4 assistências nas Finais. Deixou de se falar da alegada insatisfação de Klay Thompson com o papel secundário que desempenha, já que o “atirador” garantiu que prefere fazer parte de uma equipa que está a construir um legado do que sair para ser o actor principal de outro filme qualquer. Deixou de se falar da excessiva dependência da prestação defensiva de Draymond Green, com o ex-Thunder a provar que no sistema quase perfeito dos Warriors – idealizado pelo treinador adjunto e guru defensivo Ron Adams – também ele pode funcionar como âncora defensiva da formação de Oakland e ser considerado um defensor de elite.

Na teia de Durantula caíram ainda mais alguns fantasminhas, neste trajeto-recorde de 16 vitórias e apenas uma derrota até ao título, como o da incessante procura por um anel por parte de David West e o da incessante procura por credibilidade por parte de JaVale McGee.

Nesta crónica assombrada, há apenas um fantasma que voltou a ganhar forma e que vai continuar a pairar sobre LeBron James, dos Cleveland Cavaliers, como o próprio assumiu há cerca de um ano, em entrevista à Sports Ilustrated: “A minha motivação é o fantasma que eu persigo. O fantasma jogou em Chicago”. Igualar a marca de seis anéis de campeão do “fantasma” Michael Jordan, o lendário 23 dos Bulls, continua a ser o objectivo de carreira de LeBron, mas, com Kevin Durant em Oakland, essa ambição do 23 dos Cavs sofreu um plot twist como se de um filme de M. Night Shyamalan se tratasse.

Demónios e fantasmas à parte, o abraço entre Kevin Durant e LeBron James após a última buzina do jogo 5 das Finais – o terceiro capítulo da trilogia Warriors vs. Cavs - colocou o ponto final no filme de terror que o último ano representara para o conjunto treinado por Steve Kerr. E, agora, já se pensa da sequela.

Ricardo Brito Reis é jornalista há uma década e meia, mas apaixonado por basquetebol desde que se lembra. É um dos comentadores de basquetebol da SportTV, faz parte do departamento de comunicação da Federação Portuguesa de Basquetebol e é treinador de formação no Sport Algés e Dafundo.

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