Augusto Santos Silva, que falava numa audição pela comissão parlamentar de Assuntos Europeus, respondia a uma pergunta do BE sobre o caso do cargueiro alemão "Anne", de bandeira portuguesa, que a 27 de maio devolveu uma centena de migrantes à Líbia, país considerado inseguro pela Lei Internacional de Resgate de Refugiados no Mar.

“Uma das lições a tirar é um exame que temos que fazer em conjunto, talvez aqui também na Assembleia da República, [sobre] se o registo internacional que existe hoje numa das nossas regiões autónomas e que permite que Portugal seja um Estado de bandeira de embarcações que não são portuguesas, não são tripuladas por portugueses, não são dirigidas por portugueses e nem recebem ordens portuguesas, compensa os riscos que assumimos disto, quer os riscos materiais, quer sobretudo, no que me interessa, os riscos morais”, disse.

Segundo Augusto Santos Silva, “há 570 navios de bandeira portuguesa a navegar por esse mundo fora” e, “à data dos acontecimentos” com o cargueiro “Anne”, “havia outros três navios de bandeira portuguesa nesse porto líbio”, Misrata.

O ministro disse ainda que a questão é também da União Europeia (UE), frisando que Portugal aguarda a publicação do novo pacto de asilo e migrações pela Comissão Europeia no segundo semestre e está “seguro e disponível” para que esse seja “um dos temas da presidência” portuguesa do Conselho Europeu, no primeiro semestre de 2021.

“Para podermos avançar, porque não podemos deixar apenas aqueles quatro Estados – Malta, Grécia, Itália e Espanha - com a posição de assumirem nas suas costas um encargo, entre aspas, que deve ser de todos”, afirmou.

Augusto Santos Silva voltou a dizer que, no caso do “Anne”, o navio “cumpriu as duas ordens que recebeu do Centro de Salvamento da Malta”, “para resgatar cerca de 100 pessoas que corriam risco de naufrágio no Mediterrâneo” e “para continuar a sua rota até o porto destino na Líbia”.

O ministro assegurou ainda que “o Governo português sempre avisou o comandante do navio da situação que se vive na Líbia”, enquanto desenvolvia diligências diplomáticas com a Alemanha, com Malta e com a Comissão Europeia “para encontrar um destino alternativo seguro conforme com a lei internacional”.

“Infelizmente o comandante decidiu desembarcar as pessoas antes mesmo que essas diligências tivessem efeito útil”, disse.

Decidida após a crise migratória que atingiu a Europa em 2015, a reforma do sistema europeu comum de asilo continua por aprovar.

A comissária europeia dos Assuntos Internos, Ylva Johansson, disse em maio que espera poder apresentar em junho a proposta para um novo pacto.

Os países do sul da UE, designadamente os que mais migrantes recebem nas suas costas, defendem a introdução de um mecanismo vinculativo para que a responsabilidade de acolhimento dos requerentes de asilo seja partilhada por todos os Estados-membros.

O sistema atualmente em vigor baseia-se na Convenção de Dublin, que determina que o requerente de asilo faça o seu registo no país de entrada na UE, deixando os chamados Estados de primeira linha, como Itália, Espanha ou a Grécia, sozinhos perante chegadas maciças de migrantes.