1. Uma língua de prestígio

A língua que nos passou a palavra «escola» é previsível: o latim.

A palavra, em latim, era «schola» e deu a volta ao mundo: aparece não só nas línguas latinas, como em muitos outros idiomas, incluindo o inglês, onde tem a forma «school». Foi aportar a línguas ainda mais distantes, como o indonésio, onde se escreve «sekolah». Como lá chegou? Por via do português, que levou a palavra até àquelas paragens.

Mas voltemos ao latim. Onde foram os Romanos buscar o vocábulo? Também não surpreende: ao grego «skhol» («σχολή»).

O latim que chegou a este recanto ocidental do Império vinha cheio de grego lá por dentro. O grego era uma língua de muito prestígio na Roma Antiga e muitos romanos aprendiam-no — e usavam muitas palavras gregas nas frases latinas. Muitas dessas palavras acabaram por chegar à nossa língua.

Muito tempo depois, houve palavras gregas que chegaram ao português por outras vias — lá chegaremos. No caso de «escola», a palavra veio mesmo dentro do latim que se transformou em português.

Voltando atrás: será que os Gregos inventaram «skhol» do nada?

2. Tempo de lazer

Como acontece muitas vezes, uma palavra anterior ganhou um novo sentido. Os seres humanos, quando precisam de uma nova palavra, olham em redor e pegam nos materiais que já existem. Juntam palavras, reduzem palavras, dão significados novos a palavras que já existem…

A palavra grega «skhol» significava algo como «tempo de lazer». Veio a significar também o que se fazia com esse tempo. Ora, o que muitos faziam era conversar — e o que se aprende a conversar! As conversas entre quem ensina e quem aprende acabaram por dar origem às escolas…

Terá sido este, com mais ou menos desvios, o caminho mental que a palavra fez. A palavra grega já viria de trás, de outras viagens, desde os indo-europeus e, antes deles, desde a origem da linguagem. Mas fiquemo-nos por esta transformação de «lazer» em «escola», origem do sentido da nossa palavra.

3. A falácia etimológica

Há quem tente ver na origem das palavras a sua verdadeira essência, o seu significado antes das deturpações que vieram depois. É um erro que tem um nome técnico: falácia etimológica. Ora, as tais deturpações são um dos motores da criação de palavras novas.

Essas pequenas mudanças criam também uma complexidade em que mal reparamos. Basta pensar em «escola». A palavra tem vários significados relacionados, mas subtilmente diferentes: «o meu filho gosta da escola nova»; «as crianças andam todas na escola»; «aquele filósofo fez escola»; «a tropa foi uma escola para mim». Também aqui reside a riqueza da língua.

Portanto: saber que a palavra «escola» tem origem na palavra grega para «lazer» não nos mostra o verdadeiro sentido da palavra. Mas, enfim, sempre nos ajuda a sublinhar algo muito importante: a escola não é só um espaço onde se ouve o professor. É também um espaço onde se brinca e onde se conversa — com o professor, é verdade, mas acima de tudo com os amigos: conversas sérias, conversas parvas, conversas sobre nada, conversas sobre tudo. Conversas onde se aprende muito.

(Baseado numa crónica anterior no SAPO24.)

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Marco Neves | Professor e tradutor. Escreve sobre línguas e outras viagens na página Certas PalavrasO seu livro mais recente é Português de A a Z.

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