A palavra é tão feliz que nunca a usamos no singular! Se alguém se atrever a desejar «parabém!», é capaz de encontrar uma careta de estranheza... Porquê este plural? E qual será a origem da palavra, que usamos nós e todos os que falam português (e galego, já agora)?
A palavra é uma junção de «para» e «bem», no plural, e já aparece nos nossos dicionários desde o início do século XVIII. Muito antes de aparecer nos nossos dicionários, era usada no castelhano, em expressões como «para bien sea» — a partir destas expressões, as palavrinhas «para» e «bien» juntaram-se as duas à esquina e criaram uma só palavra, que aparecia em expressões como «com muchas bendiciones y parabienes». Todo o século XVI e o início do século XVII foram tempos em que o castelhano era a língua da moda cá em Portugal, principalmente em Lisboa. Importámos tantas e tantas palavras que lhes perdemos a conta. Muitos dos grandes escritores não só escreviam também em castelhano, como usavam palavras de sabor castelhano nos textos em português (até Camões...). Hoje, nem notamos, porque muitas delas acabaram por fazer parte do nosso léxico e não as distinguimos das outras...
Assim, não é de admirar que os nossos «parabéns» tenham vindo dos «parabienes» castelhanos. O que é muito curioso é que esta palavra não tem o mesmo uso em castelhano. Fomos nós que nos lembrámos de usá-la como exclamação única para dar os parabéns. Os nossos vizinhos castelhanos usam com muito mais frequência outras expressões, como «feliz cumpleaños» para os parabéns de aniversário, «enhorabuena» para os parabéns depois da conclusão de algo importante, entre outras formas de dizer o que nós dizemos com um simples «parabéns!» (também usamos outras expressões, como «feliz aniversário», mas são muito mais raras). As línguas emprestam-se palavras sem parar, mas raramente algum idioma as recebe sem torcer um pouco a forma ou o significado — neste caso, criámos uma nova expressão muito nossa, apesar da origem.
Já de pedra e cal no português, a palavra não ficou quieta. Do outro lado do Atlântico, transformou-se no verbo «parabenizar». Por cá, garantem-me os dicionários que existe o verbo «parabentear», mas o coitado não tem saído muito à rua… O que fazemos é pedir ajuda a outras palavras, usando a expressão «dar os parabéns».
Para terminar, deixo um sinónimo para todos aqueles que se arrepiam de dar os parabéns usando uma palavra castelhana (aconselho a não ter esses pruridos; afinal, uma grande parte das palavras que usamos já andou a passear no mundo). O sinónimo é «prolfaça». Também pode ser usado no plural: «prolfaças». Parece ser mais usada em casamentos. A origem parece clara: vem de «bom prol lhe faça». Está nos dicionários, mas raramente se ouve. Acontece muito: há palavras que estão nos dicionários durante séculos e ninguém as usa — e outras que andam à solta pelo mundo por décadas e décadas antes de serem apanhadas pelos dicionários.
Confesso agora duas coisas. Em primeiro lugar, tive ajuda de Fernando Venâncio para descobrir a origem da palavra. Muito obrigado! — que é, diga-se, outra das nossas exclamações felizes. Em segundo lugar, lembrei-me da palavra «parabéns» para esta crónica porque a minha mulher, Zélia, está mesmo quase a fazer anos, num número bem redondo, que ela me proibiu de revelar. Como ainda faltam uns dias e dizem que os parabéns antecipados dão azar, desejo-lhe já as prolfaças!
Marco Neves | Professor e tradutor. Escreve sobre línguas e outras viagens na página Certas Palavras. É autor da Gramática para Todos.
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